sexta-feira, 6 de novembro de 2020

Reflexões provocadas por "A lógica da interdependência"

"Se você não se mexer para ajudar o outro, você fica mal, porque a gente, para ter paz, o outro precisa ter paz, senão a gente fica desassossegado"
(Fernanda Montenegro em entrevista a Domingos de Oliveira publicada na edição de 6 de setembro de 2015 do jornal O Globo)
Quando os fatos se sucedem de forma muito lenta, é mais difícil enxergar a ligação entre os elos das cadeias de causas e efeitos, pois eles ficam espaçados no tempo. Quando a concatenação de vários fatos se dá em tempo mais curto, podemos ver as ligações entre eles com mais clareza. A interdependência entre os diversos seres e coisas do planeta sempre existiu, mas agora está mais visível. No momento, o mundo inteiro padece por causa de um vírus que surgiu em determinado país, e que se propagou com muita rapidez.", afirma Cristiane Szynwelski no texto que provocou estas reflexões. Afirmação que faz-me lembrar algo que li há três décadas e reproduzo no próximo parágrafo.
As nuvens se acumulam, o céu escurece, as folhas viram para o alto, e sabemos que vai chover. Também sabemos que, depois da chuva, a enxurrada penetrará nos lençóis de água subterrâneos a quilômetros de distância, e no dia seguinte o céu estará limpo. Todos esses eventos são distantes no tempo e no espaço, no entanto estão todos interligados, em um mesmo esquema. Cada um deles influencia todos os outros, influência esta que geralmente não encontra-se ao alcance da vista. Só se pode entender o sistema de chuvas observando-se o conjunto, não apenas uma das partes. Os negócios e outros trabalhos realizados pelo homem também são sistemas, o que significa que são amarrados por fios invisíveis de ações inter-relacionadas, que levam anos para desenvolver plenamente os efeitos que uma exerce sobre as outras."
Extraído do livro de Peter M. Senge intitulado A Quinta Disciplina que inspirou algumas postagens neste blog, o parágrafo anterior consta da quinta postagem, publicada em 14 de fevereiro de 2011 sob o título O Raciocínio Sistêmico. Os grifos nos dois parágrafos anteriores são meus e foram feitos com a intenção de destacar a afinidade entre o que é dito por Cristiane Szynwelski e por Peter Senge. Afinidade que prossegue com outras comparações apresentadas a seguir.
"A interdependência entre os diversos seres e coisas do planeta sempre existiu, mas agora está mais visível", diz Cristiane Szynwelski.
"O raciocínio sistêmico é uma estrutura conceitual, um conjunto de conhecimentos e instrumentos desenvolvidos nos últimos cinquenta anos (o livro é de 1990), que tem por objetivo tornar mais claro o conjunto e nos mostrar as modificações a serem feitas a fim de melhorá-lo. (...) Embora os instrumentos sejam novos, a ideologia subjacente é extremamente intuitiva, experiências com crianças de pouca idade demonstram que elas aprendem o raciocínio sistêmico com muita rapidez.", diz Peter Senge.
Segundo Cristiane Szynwelski, "A interdependência entre os diversos seres e coisas do planeta sempre existiu, mas agora está mais visível." Segundo Peter Senge, "embora os instrumentos que possibilitem enxergar a interdependência sejam novos a ideologia é extremamente intuitiva", ou seja, é algo que sempre existiu Será que é válido dizer que o que é dito por Cristiane Szynwelski e por Peter Senge tem tudo a ver?
Mas se "a ideologia subjacente ao raciocínio sistêmico é extremamente intuitiva e experiências com crianças de pouca idade demonstram que elas aprendem o raciocínio sistêmico com muita rapidez", por que, só agora, "A interdependência entre os diversos seres e coisas do planeta que sempre existiu, está mais visível"? Para responder esta indagação, recorro a mais uma passagem do citado livro de Peter Senge.
"Desde a mais tenra idade, nos ensinam a dividir os problemas, a fragmentar o mundo, o que parece ter o dom de facilitar tarefas e questões complexas. Mas o preço que pagamos por isso é enorme, pois deixamos de ver as consequências de nossos atos e perdemos a noção de integração com o todo maior. Quando queremos 'enxergar o quadro inteiro', tentamos remontar os fragmentos em nossa mente, relacionar e organizar todas as peças. Contudo, sendo esse um trabalho inútil – o mesmo que tentar juntar os fragmentos de um espelho quebrado para ver o reflexo verdadeiro -, depois de algum tempo desistimos de ver o conjunto global."
"As técnicas e ideias apresentadas neste livro destroem a ilusão de que o mundo é composto por forças separadas, não relacionadas entre si.", diz Peter Senge.
As ideias espalhadas neste blog pretendem colaborar com a destruição da ilusão promovida pelas técnicas e ideias apresentadas no livro de Peter Senge. O Raciocínio Sistêmico (14.02.2011) / Consequências do desconhecimento do raciocínio sistêmico (16.02.2011) / Considerações finais sobre o raciocínio sistêmico (19.02.2011) / O Milho Bom (13.03.2013) / 'A independência é uma ilusão' (27.10.2015) / 'Unity', de Shaun Monson, mostra a interdependência das formas de vida (03.11.2015) / Ubuntu (17.11.2015 / "Nossa sociedade da 'era industrial' é o problema" (17.06.2016) / Como curar o planeta (04.07.2016), são algumas postagens que têm muito a ver com o que é dito nesta.  
"A felicidade de cada indivíduo depende do bem-estar da população em geral. Isso não é novidade; Aristóteles já ensinava este fato antes do ano 300 a.C. (...) Para ser feliz, você precisa ser sábio e precisa que os outros também sejam. (...) Pois, se você tem sabedoria para si e as demais pessoas no mundo não têm, sua sabedoria não será suficiente, pois as pessoas podem criar perturbações, doenças e calamidades. Por exemplo, você pode ter sabedoria e também dinheiro, e mesmo assim ficar confinado por causa de uma pandemia, adoecer ou até morrer de infecção.", diz Cristiane Szynwelski fazendo-me lembrar da parábola do Milho Bom, espalhada pela postagem de 13 de março de 2013.
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"Existia um fazendeiro que por diversas vezes venceu o concurso do 'melhor milho'.
Todo ano ele entrava com seu milho na feira e ganhava o maior prêmio. Uma vez um repórter de jornal o entrevistou e aprendeu algo interessante sobre como ele cultivava o milho. Descobriu que o fazendeiro compartilhava a sua semente de milho com os vizinhos.
'Como pode você se dispor a compartilhar sua melhor semente de milho com seus vizinhos, quando eles estão competindo com o seu a cada ano?', perguntou o repórter.
'Por quê?', replicou o fazendeiro, 'Você não sabe? O vento apanha pólen do milho maduro e o leva de campo para campo. Se meus vizinhos cultivam milho inferior, a polinização degradará continuamente a qualidade de meu milho. Se eu for cultivar milho bom, eu tenho que ajudar meus vizinhos a cultivarem milho bom'.
Ele era atento as conexões da vida. O milho dele não pode melhorar, a menos que o milho do vizinho também melhore. Assim também acontece em outras dimensões. Aqueles que escolhem estar em paz devem fazer com que seus vizinhos estejam em paz. Aqueles que querem viver bem, têm que ajudar os outros para que vivam bem. E aqueles que querem ser felizes, têm que ajudar os outros a acharem a felicidade. O bem-estar de cada um está ligado ao bem-estar de todos. A lição, para cada um de nós, é que, se quisermos cultivar algo de bom, temos que ajudar o próximo também a fazê-lo."
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"Ele (o fazendeiro vencedor) era atento as conexões da vida. (...) O bem-estar de cada um está ligado ao bem-estar de todos. A lição, para cada um de nós, é que, se quisermos cultivar algo de bom, temos que ajudar o próximo também a fazê-lo.", diz a parábola do Milho Bom.
"A razão é a outra face do coração amoroso, porque a realidade é uma só. Você pode não ser do tipo sentimental, mas, se tiver um bom raciocínio, entenderá que até mesmo um egoísta, quando é inteligente, torna-se altruísta.", diz Cristiane Szynwelski.
Assim, chegamos ao final desta postagem com uma indagação feita na primeira frase do quarto parágrafo do excelente texto de Cristiane Szynwelski: "Assim, chegamos à grande pergunta: você ainda se considera uma pessoa independente?"

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