"Não sois máquinas! Homens é que sois!."
(Charles Chaplin)
Após duas postagens focalizando a perda de algo essencial ao ser humano, segue uma que focaliza mais duas perdas de coisas essenciais. Enquanto
as duas anteriores focalizam a perda do silêncio, esta focaliza a perda do
descanso e da recreação.
O texto reproduzido a seguir foi extraído de um livro
intitulado Entre a escuridão e a luz do dia – Abraçando as
contradições da vida, de autoria de Joan Chittister. Publicado
originalmente em 2015, ele foi publicado no Brasil em 2019 pela Editora Vozes. Do que é dito sobre a
autora, na orelha da contracapa, selecionei as seguintes informações: "Joan Chittister, OSB, é monja beneditina, nascida na
Pensilvânia (EUA) em 1936. É conferencista respeitada e autora de 50 livros e
aproximadamente 700 artigos sobre temáticas ligadas à espiritualidade, paz,
vida religiosa, justiça e igualdade para os mais frágeis e os mais pobres, e
sobre o lugar e a função das mulheres, tanto na sociedade quanto na Igreja".
A produtividade do descanso e
da recreação
Uma das boas coisas sobre o
corpo humano é que ele se desgasta. Ele se cansa. Pode, como a Regra de São
Bento diz no capítulo 64, ser "esmagado". Para ser mais preciso, a
Regra está falando sobre o abade ou abadessa no capítulo quando diz: "equilibre
tudo de tal modo que haja o que os fortes desejam e que os fracos não fujam".
O ponto é claro: a boa
liderança não pede mais do trabalhador do que o trabalhador é capaz de realizar. O
que aconteceu com esse tipo de sabedoria? E quanto mais conseguiremos avançar
sem redescobrirmos o valor desse insight?
O aspecto realmente
interessante de uma diretriz tão antiga é que ela foi escrita no século VI,
antes do surgimento das lâmpadas, antes que a humanidade pudesse fazer pouco ou
nada para estender o dia à noite e realmente eliminar a diferença entre os
dois. Naquela época, quando o sol se punha, as pessoas iam para a cama. "Produza
feno enquanto o sol brilha", diziam os fazendeiros – e por boas razões –
já que certamente não havia como fazer de outra forma. Os dias eram medidos do
nascer ao pôr do sol. Não eram divididos em turnos. A escuridão cobria a terra e, com
ela, vinha o silêncio, o descanso e o tempo de recuperação como preparação para
o dia seguinte.
Era absolutamente diferente de
um mundo em que a Internet conecta os confins da Terra 24 horas por dia. Antes
da Revolução Industrial, os motores não continuavam a tampar garrafas por muito
tempo depois de a maioria dos trabalhadores ter ido para casa jantar. Os
caminhões não faziam corridas malucas para ligar as cidades do mundo para que
os pacotes de ferramentas fossem entregues em vinte e quatro horas e para a
modernidade poder triunfar. Não se escrevia até tarde da noite. Os escritórios
não ficavam abertos. A resolução de problemas não seguia. O trabalho escolar
não começava depois que as festinhas terminavam. O trabalho do dia anterior não
era feito no meio da noite para que o trabalho de amanhã pudesse recomeçar dentro
de cinco horas.
E os seres humanos não tomavam
sedativos para lidar com o estresse e nem drogas para se acalmarem. A
comunidade médica não alertava as pessoas sobre os efeitos da privação do sono.
E os cirurgiões não iniciavam outra cirurgia no final de um dia de dezoito
horas.
Nós nos levamos
implacavelmente de uma exaustão a outra. Nossas sociedades caminham no ritmo
dos computadores. Conduzimos os relacionamentos mais importantes de nossas
vidas – tanto profissionais quanto pessoais – de acordo com a velocidade da
nossa comunicação. Medimos a nós mesmos pela nossa produtividade e, a cada dia,
ficamos mais exaustos, menos descansados – corpo, espírito e mente – e,
portanto, menos capazes de produzir coisas, que dirá de cuidar dos
relacionamentos. Isso não é uma ironia, é uma tragédia. E embora saibamos
disso, não sabemos o que fazer a respeito.
Agora a questão é simples: os insights antigos são apenas isso,
antigos? Ou são sábios porque atravessaram todas as gerações sendo considerados
verdadeiros?
Bem, ninguém menos do que Tomás
de Aquino, sem dúvida considerado o homem mais brilhante do século XIII e um
bom candidato para cada um dos séculos que se seguiram, disse o seguinte sobre
descanso e recreação: "É necessário para o relaxamento da mente que, de
tempos em tempos, façamos uso de atividades lúdicas e brincadeiras".
E, no século XVI, Leonardo da
Vinci, um dos gênios mais prolíficos de todos os tempos, escreveu: "De vez
em quando, vá embora, relaxe um pouco, pois quando retomar o trabalho, seu
julgamento será mais acertado. Afaste-se um pouco porque, assim, o trabalho
parecerá mais leve e você poderá produzir mais em um piscar de olhos, e a falta
de harmonia e de proporção será mais prontamente vista".
Ponto: A trituração é
destrutiva tanto para a pessoa quanto para o trabalho. A menos que a alma possa
se revigorar o suficiente para pensar, criar, recuperar sua energia e seu interesse
no trabalho em questão, não há esperança nem de se recordar nem de criar.
Anualmente, as pesquisas
relatam o declínio da excelência dos Estados Unidos em uma área após a outra. Até
mesmo nossos filhos – os trabalhadores árduos, os ambiciosos, os brilhantes e os
belos – acabam pisando em falso em competições internacionais. Independentemente
de quão duro eles trabalhem, do quanto memorizem, de por quanto tempo eles
estudem, de quanto desejem ir bem.
Talvez o que todos nós mais
precisemos seja tempo para processar o que já sabemos, para que possamos organizar
de maneira diferente, de forma ainda mais eficiente do que antes. Talvez precisemos
pensar um pouco, sentindo uma brisa de verão na varanda, descer pelo riacho
quando as trutas estão subindo, voltar ao jardim quando for hora de plantar as
beterrabas e os feijões outra vez.
Desligue a televisão e leia um
bom livro. Abandone as mensagens de texto e ande de bicicleta. Desligue o
computador e vá ao cinema. Não responda a nenhum e-mail. Não tente "seguir
em frente". Não retorne chamadas. E, durante o jantar em família, desligue
o telefone. E quando a televisão estiver ligada, assista em vez de falar o tempo
todo. Recupere a sua vida, os seus pensamentos, a sua personalidade, os seus
amigos, a sua família.
Não, o mundo não vai acabar. E
não, o resto da equipe não vai chegar na sua frente. Eles estarão cansados
demais para sequer pensar em alcançar você.
É hora de dormir como você
fazia nos bons e velhos tempos. Tome um bom café da manhã mais tarde. Leia os
jornais o dia todo. Chame alguns amigos para um jogo de cartas. E então, na
segunda-feira, volte ao trabalho – depois de ter realmente fugido de tudo –
sentindo que o que você tem a fazer realmente vale a pena. Como Ashleigh
Brilliant diz: "Às vezes, a coisa mais urgente e vital que você pode fazer
é descansar completamente".
Como o provérbio ensina, "Um
bom descanso é metade do trabalho". Isto é, se você realmente quiser ser
produtivo.
*************
Como a prática ensina, uma boa
reflexão sobre o que se lê é uma fração significativa
da tarefa de assimilar alguma coisa daquilo que se lê, e, tendo assimilado
alguma coisa, decidir fazer algo a respeito. Isto é, se você realmente quiser ser
produtivo em termos de mudar as coisas para melhor. Há, no canal GNT, uma propaganda de um programa
intitulado do GNT.DOC que diz o
seguinte: "Com conversa
a gente reflete; com reflexão a gente muda." E mudando a gente pode
tornar-se capaz de cooperar para mudar o mundo, pois, como diz uma afirmação
atribuída a Caio Graco, "quem muda o mundo são as pessoas". Mudá-lo para
melhor, pois para pior já existe muita gente cooperando. Compreendido?
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