"Para Standage, sua obra reflete que o ser humano, independentemente da época em que vive, nutre o desejo profundo de se conectar e compartilhar ideias e impressões com outras pessoas. 'Este desejo é construído nos nossos cérebros. A tecnologia vai e vem, mas a natureza humana continua a mesma'."
Inacabamento,
incompletude que talvez expliquem o modo como a imensa maioria comporta-se nas
redes sociais. Adotadas por uma espécie cujo desenvolvimento emocional é incompatível
com o desenvolvimento tecnológico por elas atingido, o que se vê é algo paradoxal:
o uso das redes sociais para a disseminação de algo extremamente
antissocial: o ódio.
"Na obra Writing on the Wall – Social Media, The first 2.000 Years, Tom Standage afirma que redes sociais como o Facebook, Twitter e Tumblr podem ser as últimas encarnações de uma prática que começou por volta do ano 51 a.C, na Roma Antiga. Segundo ele, Marco Túlio Cícero, filósofo e político romano, teria sido, junto com outros membros da elite romana, precursor do uso de redes sociais. O autor relata como Cícero usava um escravo, que posteriormente tornou-se seu escriba, para redigir mensagens em rolos de papiro que eram enviados a uma espécie de rede de contatos. Estas pessoas, por sua vez, copiavam seu texto, acrescentavam seus próprios comentários e repassavam adiante. 'Hoje temos computadores e banda larga, mas os romanos tinham escravos e escribas que transmitiam suas mensagens', disse Standage à BBC Brasil."
As referências a Roma
Antiga e a tecnologia, e a afirmação de que, apesar da evolução tecnológica,
a natureza humana continua a mesma, feitas por Tom Standage, fazem-me lembrar uma
passagem do livro O Ato da Vontade, de Roberto Assagioli, publicado há 47 anos, na
qual o autor cita a incapacidade de lidar com as próprias emoções, impulsos e
desejos como outra coisa que continua a mesma desde a Roma Antiga. Segue o
referido trecho.
"Se um homem de uma civilização anterior à nossa – um grego da Antiguidade, digamos, ou um romano – aparecesse de súbito entre os seres humanos do presente, suas primeiras impressões o levariam a considerá-los uma raça de mágicos, de semideuses. Mas fosse um Platão ou um Marco Aurélio e se recusasse a ficar deslumbrado ante as maravilhas materiais criadas pela tecnologia avançada e examinasse a condição humana com mais cuidado, suas primeiras impressões dariam lugar a uma grande consternação."
"Notaria logo que o homem, não obstante o imponente grau de domínio sobre a natureza, possui um controle muito limitado sobre o seu interior. (...) Verificaria que esse pretenso semideus que controla grandes forças elétricas com o mover de um dedo e inunda o ar de sons e imagens para divertimento de milhões de pessoas – é incapaz de lidar com as próprias emoções, impulsos e desejos."
"Para Standage, o advento e a popularização da comunicação de massa no século 19 — com jornais e livros — e no século 20 — cinema, rádio e TV — ofuscaram os modelos sociais de distribuição de informação que haviam prevalecido durante séculos. 'As pessoas passaram a obter informações das mídias de massa e não mais de seus amigos, em um processo de mão única, sem interação', diz o autor. Na última década, a internet abriu caminho para o renascimento das plataformas sociais de comunicação que, para o autor, se tornaram tão eficientes que passaram a competir com as mídias de massa. 'Agora o grande desafio das grandes organizações de mídia é gerar conteúdo de mão dupla, porque já sabem que o de mão única foi uma anomalia histórica que não funciona mais'.".
Agora o grande
desafio da grande maioria dos integrantes da autodenominada espécie inteligente
do universo é gerar fala e escuta de mão dupla, porque já deveriam saber que a
de mão única nunca funcionou, ouso eu dizer. O que é fala e escuta de mão
dupla? Vocês já ouviram falar em algo denominado conversa? Pois é. O grande
desafio da espécie inteligente do universo é algum dia enxergar "A necessidade de conversar."
Entre falar, alucinadamente, para muitos ou ser, realmente, ouvido por poucos, qual das duas coisas caracteriza uma real necessidade dos integrantes da espécie humana? Para responder esta indagação, recorro a um exemplo extremo. Lembrando que estamos em pleno mês dedicado à prevenção do suicídio e considerando que, segundo a Organização Mundial de Saúde, "A cada 40 s, 1 pessoa tira a própria vida no mundo, diz OMS", minha resposta é "ser, realmente, ouvido por poucos". Encontrar alguém adepto da salutar prática de conversar, e não da nociva prática de apenas falar, é extremamente importante na vida de qualquer pessoa e uma verdadeira tábua de salvação para quem esteja pensando (sic) em realizar o ato extremo de cometer suicídio.
"Romanos usavam redes sociais há dois mil anos, diz livro." Redes sociais serão usadas per omnia saecula saeculorum, digo eu. E algum dia a espécie humana enxergará as redes sociais como uma opção para satisfazer "A necessidade de conversar." em vez de enxergá-las como uma opção para satisfazer o desumano desejo de odiar. E ao falar em humano e desumano, para encerrar estas reflexões, segue um parágrafo cuja intenção é fazer uma exortação ao desejo de manter-se humano.
"Coisas terríveis estão acontecendo no mundo hoje. As pessoas não vão mudar. E a única coisa que podemos fazer por nós mesmos é estar atento, ler e compreender como se manter humano em tempos de horror e desespero. O livro ajuda nisso. É uma história terrível, mas nos ajuda a entender", finaliza Melcher de Wind."
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