"Nenhuma
sociedade que esquece a arte de questionar pode esperar respostas para os
problemas que a afligem".
(Zygmunt Bauman [1925 – 2017], sociólogo
e filósofo polonês)
Obtido na edição de 09 de
novembro de 2019 do jornal O Globo, o
texto apresentado a seguir é a íntegra de uma resenha do livro "Heimat: Ponderações de uma alemã sobre sua terra
e história" de Nora Krug. Elaborada por Alessandro Giannini a resenha
é intitulada "HQ traça busca pela herança familiar no
horror nazista"? O que despertou minha vontade de lê-la? Uma provocante
ilustração nela apresentada. Qual é a ilustração? A imagem de uma pintura do
pintor e escultor alemão Caspar David Friedrich intitulada Caminhante (ou Viajante) sobre o mar de névoa. Imagem que Nora apresenta
em seu livro sobrepondo-lhe a instigante questão que intitula esta postagem:
"Como saber quem você é, [...] se você não entende de onde veio?".
Será que entender de onde se veio
tem a ver com olhar para trás, o tema da postagem
anterior? Postagem em que foram antecipadas algumas coisas que são ditas
nesta. Será que entender de onde se veio tem a ver com a afirmação que epigrafa
esta postagem? Feito este preâmbulo, passemos a interessante resenha. A provocante ilustração pode ser vista no final da postagem.
HQ
traça busca pela herança familiar no horror nazista
Na premiada autobiografia gráfica 'Heimat', a
alemã Nora Krug mergulha na história de seus parentes durante a ascensão do
nazismo: 'As narrativas de família são ensinadas, mas ninguém as questiona'
"Heimat",
título da graphic novel da alemã Nora
Krug, recém-lançada pela Companhia das Letras, poderia ser traduzido para o
português simplesmente como "pátria". Mas a palavra é muito mais do
que isto, de acordo com a enciclopédia "Brockhaus", citada pela
autora no livro: "Termo que define o conceito de uma paisagem ou localidade
real, imaginária ou construída, à qual uma pessoa [...] associa uma sensação
imediata de familiaridade. Essa experiência é [...] passada de geração em
geração, através da família e de outras instituições, ou por meio de ideologias
políticas".
Nos Estados
Unidos, onde entrou na lista dos melhores do ano do "New York Times"
e levou o prêmio de melhor autobiografia do National Book Critics Circle, o
volume de 288 páginas ganhou outro título, "Belonging", que numa
tradução livre para o português seria "pertencimento". A palavra
explica um pouco melhor o que moveu a artista de 42 anos a garimpar os baús de
sua família e os arquivos públicos de sua cidade natal, Karlsruhe, em busca de
respostas sobre o envolvimento de seus parentes no regime nazista e na política
racista que levou aos horrores do Holocausto.
Nascida
mais de 30 anos após o fim da Segunda Guerra, Nora faz parte de uma geração que
aprendeu nos bancos da escola a terrível herança deixada por seus antepassados
e incorporou a culpa coletiva que se abateu sobre o país como uma maldição. Ela
cita Hannah Arendt (1906 – 1975) - "Onde todos são culpados, ninguém
é" – para explicar como essa sensação causou uma espécie de paralisia em
relação à história de sua própria família, que cuidadosamente não debatia o
assunto em casa.
- Muitos
alemães da minha geração se sentem sobrecarregados com tudo que aprendemos
sobre a guerra. Mas você não percebe que falta uma peça, que é a sua própria
história familiar – diz ela, que hoje mora em Nova York, destino de muitos
sobreviventes do Holocausto, e tem um marido judeu. – As narrativas de família
são ensinadas, mas ninguém as questiona. Quando, aos 17 anos, saí de minha
cidade e fui morar fora, me vi como uma alemã no exterior e sozinha com minha
responsabilidade. Não tinha mais desculpas para evitar o meu passado.
Além de
visitar arquivos, Nora entrevistou familiares na Alemanha. Nessa pesquisa, se
aprofundou nas histórias de dois parentes centrais para a narrativa de
"Heimat": o avô materno, Willi, mecânico e motorista durante a
guerra, e o tio paterno, Franz-Karl, que morreu jovem, soldado da SS
(abreviatura em alemão para Schutzstaffel, a tropa paramilitar nazista).
De posse
de histórias, documentos, fotos e objetos coletados durante esse mergulho no
passado, Nora criou uma espécie de dossiê sobre a família Krug. Embora
"Heimat" seja classificado como um romance gráfico, a artista se
afasta do formato tradicional das HQs, com seus quadros e balões. O livro pode
ser lido como um diário juvenil, com narrativas entrecortadas, rabiscos e
intervenções nas imagens.
- Eu
queria que minha voz pessoal estivesse presente na escrita, sem replicar o que
foi dito na imagem – explica. – Por exemplo, teria sido muito banal escrever
sobre a ida ao arquivo e me mostrar sentada à mesa, com uma cara perplexa.
Para Nora,
fazer "Heimat" foi um aprendizado. Ela espera que sua história
pessoal possa ensinar sobre o presente e evitar que antigos erros se repitam. Esse
desejo tem origem na ascensão de partidos de extrema-direita na Alemanha, especialmente
o Alternativefür Deutschland, que se posiciona contra o sentimento de culpa que
está na origem do livro.
- Espero
que as pessoas entendam que meu livro não é apenas sobre minha família ou a
Alemanha, mas sobre qualquer pessoa em qualquer país – defende. - Muita gente
parece não reconhecer que somos como somos hoje por causa do que aconteceu
antes. Criações que envolvem emoção, como filmes, livros ilustrados, arte e
música, são importantes para que o público compreenda isso. Temos que defender
ativamente nossa democracia, sempre. Não podemos acreditar que ela está
garantida.
*************
Pedindo-lhes desculpas por não
conseguir maior nitidez nas palavras (Como
saber quem você é, [...] se você não entende de onde veio?) que aparecem na
imagem da pintura intitulada Caminhante (ou
Viajante) sobre o mar de névoa (Será que a névoa que aparece na legenda colocada na imagem acima tem alguma
coisa a ver com isso? Ou será que eu viajei?),
desejo que as ideias de Nora Krug possam ser percebidas por vocês com o máximo
de nitidez para que delas possam tirar enorme proveito através das reflexões
que, no meu entender, elas são capazes de provocar.
Na postagem anterior foram
antecipadas algumas coisas ditas nesta. Vocês conseguem enxergar alguma relação
entre esta e a anterior?
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