"Você pode saber o que disse, mas nunca o que
o outro escutou."
(Jacques Lacan)
Eu posso saber o que espalhei, mas nunca o que o outro
captou. Aplicando essa paráfrase às idéias espalhadas pela postagem anterior e
desejando muito que a mensagem de Roberto Crema seja captada, reapresento nesta
alguns trechos que considero os mais significativos para sua captação. Trechos
que, no meu entender, merecem reflexões bastante apuradas. "Afinal, a pretensão do texto é provocar uma mutação de
consciência", eis a última frase do preâmbulo da postagem anterior.
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A subjetividade e a dimensão do coração, consideradas não-científicas, foram proscritas, destinadas aos artistas e poetas delirantes. (...) A Razão estendeu o seu império por todas as plagas, com a bandeira do determinismo - biológico, econômico, geográfico, psíquico... - desfraldada. Laboriosamente, os antigos traumatizados ergueram e retocaram sua obra-prima: o racionalismo científico, com elegante base disciplinar, que gerou o especialista, exótico sujeito que de quase-nada sabe quase-tudo.
E cá estamos nós, os novos traumatizados. Num mundo esfacelado, com o conhecimento fracionado em compartimentos estanques, cindidos em esferas aprisionantes, torturados por máscaras e papéis desconectados, esvaziados de um sentido maior, desvinculados da sagrada inteireza.
O movimento holístico definitivamente não é uma moda, como muitos pretendem. É uma resposta biológica e vital de perpetuação da espécie perante a ameaça de uma autodestruição global; é um catalisador de transmutação no seio do qual está sendo gerado o ser humano do agora.
Na nova idade, todos somos convocados para a inteireza. O ser mutilado, fragmentado na mente, no coração e no existir, será removido para o museu do ontem. Apenas os inteiros estarão preparados para os novos desafios. Por essa razão, o termo-chave é o holístico, proveniente do grego holos, que significa inteiro, total. A palavra "holística", pelo desgaste do mau uso e do abuso, poderá ser substituída. O seu significado, entretanto, permanecerá.
Ser contemporâneo é o imenso desafio do nosso momento histórico. Viajamos da idade moderna para a transmoderna, da idade da razão para a idade da consciência no mais amplo sentido. Nossa tarefa é a de inventar uma nova linguagem, um novo código para o tempo-espaço do EU SOU.
Ousaremos enfrentar o desafio da inteireza? Ousaremos conspirar por um ente humano integral, vinculado na dimensão interconectada do saber e do amor? Ousaremos saltar para o desconhecido, afirmando o viver evolutivo? Ousaremos não deixar por menos, reinvindicando, atrevidamente, nossa condição de seres eretos, destinados a interligar terra e céu? É promissor constatar que um número progressivo de indivíduos, das mais diversas origens, culturas e ocupações, está abrindo os olhos, despertando e conspirando pela renovação consciente de nossos horizontes. Não será um bom tempo para os insensíveis, sonolentos e pretensiosos proprietários das velhas certezas!
Vivemos um período ao mesmo tempo aterrador e maravilhoso. É um momento especial de passagem, o parto de um ciclo onde morte e vida se abraçam num espasmo de dor e plenitude. Brahma, supremo deus da criação e Shiva, supremo deus da destruição, dançam juntos, neste instante, ao som da melodia universal que chamamos mutação.
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Razão, inteireza e consciência, eis as palavras por mim consideradas
chaves no texto de Roberto Crema.
A Razão
que ao "estender o seu império por todas as plagas, com a bandeira do
determinismo - biológico, econômico, geográfico, psíquico... - desfraldada.
(...) ergueu o racionalismo científico, (...), que gerou o especialista,
exótico sujeito que de quase-nada sabe quase-tudo."
"A sagrada inteireza da qual fomos desvinculados" exatamente pela geração
do especialista que implicou na nossa colocação "Num mundo esfacelado, com
o conhecimento fracionado em compartimentos estanques, cindidos em esferas
aprisionantes, torturados por máscaras e papéis desconectados, esvaziados de um
sentido maior."
"A idade
da consciência, no mais amplo sentido", para a qual teremos que viajar deixando
a "idade da razão."
Em termos
de razão, o próximo parágrafo traz para estas reflexões as seguintes palavras
de Eduardo Marinho:
"A minha razão eu subalternizei ao sentimento. É o sentimento que decide. A razão arruma um jeito de fazer o que o sentimento decidiu. A razão não tem poder de decisão. Ela sozinha fica psicopática. A razão construiu esse mundo em que a gente vive. A razão explica que a pobreza é necessária. A razão dos grandes cria a miséria para pressionar os trabalhadores a aceitarem qualquer condição de trabalho, com medo de ir para a miséria. O sentimento jamais permitiria existirem pessoas abandonadas num mundo que tem plenas condições de atender a todo mundo. De produção, de distribuição, de tecnologia, de conhecimento. O mundo tem todas as condições de não ter um miserável, mas a razão implantada convence as pessoas de que isso é assim mesmo, que não tem jeito."
Palavras que podem ser ouvidas nos três minutos finais do vídeo
que encontrei no seguinte endereço https://www.youtube.com/watch?v=I7arqW5luKc&feature=youtu.be&t=46m41s.
"A sociedade é comandada pela razão, e não pelo sentimento. A razão foi imposta como a melhor coisa que o ser humano tem, quando na verdade é o sentimento, não é a razão.", diz Eduardo Marinho em um vídeo que encontrei no seguinte endereço: https://www.youtube.com/watch?v=LtrFgT5gH0A.
O resultado de tal imposição? A
falsa sociedade na qual sobrevivemos. Como assim? Consideremos o seguinte
significado para a palavra sociedade: conjunto de pessoas que vivem em certa
faixa de tempo e de espaço, seguindo normas comuns, e que são unidas pelo
sentimento de consciência do grupo. Faz sentido denominar sociedade essa coisa desprovida
do sentimento de consciência do grupo na qual sobrevivemos?
Em termos
de inteireza, o próximo parágrafo traz para estas reflexões as seguintes
palavras do grande Fernando Pessoa:
"Para ser grande, sê inteiro; nada teu exagera ou exclui. Sê todas as coisas. Põe quanto és no mínimo que fazes. Assim em cada lago a lua toda brilha. Porque alta vive."
"Para ser grande, sê
inteiro.", disse Fernando Pessoa. Será que tal afirmação pode ser
considerada uma contraposição à "proscrição da subjetividade e da dimensão
do coração" pelo racionalismo científico, por considerá-las não
científicas? No meu entender, sim.
Em termos
de consciência, o próximo parágrafo traz para estas reflexões as seguintes
palavras de Albert Einstein:
"Não podemos resolver nossos problemas usando o mesmo tipo de pensamento que os criou. Portanto, é imprescindível uma nova maneira de pensar. É preciso entender que uma nova maneira de pensar não é pensar coisas novas: é pensar de outra maneira."
Sim, "É preciso pensar de
outra maneira.". E o que será preciso para pensar de outra maneira? No meu
entender, "uma mutação de
consciência".
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