terça-feira, 13 de agosto de 2019

E um comerciante disse: "Fala-nos das compras e vendas"

E atendendo ao pedido do comerciante, em mais uma passagem de seu extraordinário livro O Profeta, Gibran Khalil Gibran oferece não apenas ao comerciante, mas a todos nós uma magnífica aula sobre como nos comportarmos em qualquer espécie de transação em que estivermos envolvidos.
Conta Barbara Young, na sua biografia de Gibran "This Man From Lebanon", que certa senhora, tendo começado a folhear "O Profeta" numa livraria, ficou tão entusiasmada que gritou: "Este é o livro que sempre procurei!... Só que não é um livro. É um alimento; é pão e vinho para pessoas desanimadas como eu".
Feito este preâmbulo, considerando o desânimo que atinge esta civilização (sic) submissa a um deus denominado Mercado, segue uma "receita" de Gibran que considero capaz de ensinar-nos a lidar adequadamente com as compras e vendas.
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E um comerciante disse: "Fala-nos das compras e vendas."
E ele respondeu:
"A vós, a terra oferece seus frutos, e nada vos faltará se somente souberdes como encher as mãos.
"É trocando as dádivas da terra que encontrareis a abundância e sereis satisfeitos.
E, contudo, a menos que a troca se faça no amor e na justiça, ela conduzirá uns à avidez e outros à fome.
Quando vós, trabalhadores do campo e dos vinhedos, encontrardes no mercado os tecelões, os oleiros e os colhedores de especiarias,
Invocai o espírito mestre da terra para que desça sobre vós e santifique as balanças e os cálculos que comparam valor com valor.
E não permitais que aqueles que têm as mãos vazias tomem parte nas vossas transações, eles que vos venderiam suas palavras em troca de vosso labor.
A tais homens devereis dizer:
'Vinde conosco aos nossos campos ou ide com nossos irmãos para o mar e jogai vossa rede:
Pois a terra e o mar serão tão generosos para convosco quanto o serão para conosco.'
Mas quando vierem os cantores e os bailarinos e os flautistas, comprai de suas ofertas.
Pois eles também colhem frutos e incensos e, embora feitos de sonhos, seus produtos são vestimenta e alimento para vossas almas.
E antes de deixardes o mercado, vede que ninguém se retire de mãos vazias.
Pois o espírito mestre da terra não descansará em paz sobre o vento enquanto as necessidades do mais humilde dentre vós não tiverem sido satisfeitas."
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"Cada dia a natureza produz o suficiente para nossa carência. Se cada um tomasse o que lhe fosse necessário, não haveria pobreza no mundo e ninguém morreria de fome.", disse Mahatma Gandhi (1869 – 1948).
"A vós, a terra oferece seus frutos, e nada vos faltará se somente souberdes como encher as mãos. É trocando as dádivas da terra que encontrareis a abundância e sereis satisfeitos.", disse Gibran Khalil Gibran (1883 – 1931).
Então, por que há pobreza no mundo, milhões de pessoas morrem de fome, e a abundância e a satisfação ainda não foram encontradas? Porque o grau de inteligência atingido pela tal da espécie inteligente do universo ainda não é suficiente para entender as seguintes palavras de Gibran: "a menos que a troca se faça no amor e na justiça, ela conduzirá uns à avidez e outros à fome.". Vocês concordam que essa seja uma resposta razoável para tal indagação?
Avidez e fome, eis duas coisas cuja existência é inadmissível em algo que pretenda fazer jus ao termo civilização, pois como disse (Alexis Carrel (1873 - 1944), "A civilização não tem como finalidade o progresso das máquinas; mas, sim o do homem."
Avidez e fome, eis duas coisas impeditivas da implantação da paz, pois, como disse Gibran (na última frase de seu extraordinário texto), "o espírito mestre da terra não descansará em paz sobre o vento enquanto as necessidades do mais humilde dentre vós não tiverem sido satisfeitas."
Avidez e fome, eis duas coisas impeditivas da implantação da tão apregoada democracia, pois, como disse Jean-Jacques Rousseau (1712 – 1778), "Uma sociedade só é democrática quando ninguém for tão rico que possa comprar alguém e ninguém seja tão pobre que tenha que se vender a alguém."
Considerando que, em uma civilização, sociedade, ou sei lá o que em que tudo é comercializado e quase todos se vendem, referir-se a seus integrantes como comerciantes não deve ser visto como algo absurdo, vocês concordam que os ensinamentos contidos em uma resposta dada a um comerciante que solicitara ao Profeta falar das compras e das vendas são aplicáveis a quase totalidade do que quase todos fazem cotidianamente?

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