"A grande lição é que a
superfície de civilização sobre a qual nos equilibramos é sempre muito fina." (...) "A palavra
civilização, num de seus sentidos iniciais, se referia ao processo de animais
humanos sendo civilizados – com o que queremos dizer, suponho, atingir um
reconhecimento mútuo de dignidade humana, ou pelo menos aceitar em princípio o
desejo desse reconhecimento. (...) Lendo
Jack London outro dia, passei por uma palavra incomum: 'descivilização'.
O processo oposto, ou seja, aquele pelo qual as pessoas param de ser
civilizadas e se tornam bárbaras." As
palavras acima compõem uma compilação de algumas afirmações de Timothy Garton
Ash em seu artigo A tênue divisão entre anjo e macaco.
Lendo a referência a Jack London, lembrei de uma antiga frase que já vi
atribuída a vários autores: "O poder não muda as pessoas, apenas revela
quem elas são verdadeiramente.". Frase que leva-me a redigir a seguinte:
"Situações extremas não descivilizam as pessoas, apenas revelam que elas
ainda não são civilizadas.", pois, conforme afirmei cinco postagens atrás,
"Nessa
ideia de algo ainda não consumado eu incluo coisas como civilização, sociedade,
democracia e cidadania.". Coisas que jamais serão consumadas em sua
plenitude, pois são construções permanentes que precisam ser aperfeiçoadas per omnia saecula saeculorum.
Afinal, sendo produtos das ações do homem, civilização,
sociedade, democracia e cidadania são coisas cuja qualidade será sempre diretamente
proporcional a qualidade dos homens que as produzem. No Quem sou eu
(onde é apresentado o perfil do autor do blog) coloquei o seguinte conteúdo:
"Alguém que acredita que a qualidade de uma sociedade é resultado das
ações de todos os seus componentes". Substitua-se sociedade por civilização,
democracia ou cidadania, e eu continuo acreditando. Ou seja, a qualidade de toda
e qualquer coisa que se produz será sempre diretamente proporcional a qualidade
de quem a produz e dos materiais (em alguns casos, dos ingredientes) usados em
sua produção.
Sendo assim, per omnia saecula saeculorum, o homem prosseguirá mudando a qualidade das coisas que produz, dentre elas
a da civilização. "A única coisa permanente é o estado de contínua
mutação" é uma afirmação atribuída a um filósofo pré-socrático de nome Heráclito que, segundo historiadores, viveu na Grécia, no
período compreendido entre os anos 535 a.C e 475 a.C. (aproximadamente). Estado de contínua
mutação através do qual algum dia, por mais remoto que seja ele, e por mais
incrível que possa nos parecer hoje, a população deste planeta terá, em sua
maioria, indivíduos que conseguiram atingir um louvável grau de
civilização. Um dia que, para os que acreditam no Sermão da Montanha, poderá ser considerado como o da chegada do tempo em
que "os mansos herdarão a Terra". Em outras palavras, o dia em
que os civilizados herdarão a Terra.
Sobre o Sermão
da Montanha, creio que vale a pena citar aqui o que dele pensava Mahatma
Gandhi. E para ajudá-los a dimensionar o valor da opinião de Gandhi, lembro
aqui a opinião de Albert Einstein sobre ele, expressa na seguinte frase: "as
gerações por vir terão dificuldades em acreditar que um homem como Gandhi realmente
existiu e caminhou sobre a Terra". Segundo Gandhi, "se todos os demais
livros sagrados da humanidade tivessem sidos perdidos, e restasse apenas o
Sermão da Montanha, nada teria sido perdido". Gandhi é um dos homens que
conseguiram atingir um elevadíssimo grau de civilização; é um autêntico
civilizado.
"A palavra civilização,
num de seus sentidos iniciais, se referia ao processo de animais humanos sendo
civilizados – com o que queremos dizer, suponho, atingir um reconhecimento
mútuo de dignidade humana, ou pelo menos aceitar em princípio o desejo desse
reconhecimento.", diz Timothy
Garton Ash. E ao dizê-lo me faz lembrar uma célebre afirmação de Alexis Carrel, cirurgião,
fisiologista, biólogo e sociólogo, que, em 1912, recebeu o Prêmio Nobel de
Medicina e Fisiologia e, em 1935, publicou um livro intitulado O Homem, Esse
Desconhecido, que foi traduzido e reeditado transformando-se num grande
êxito mundial até a década de 1950. Qual é a afirmação? "A civilização não tem
como finalidade o progresso das máquinas; mas, sim o do homem".
Frase que selecionei para ilustrar os blogs em
um espaço intitulado "E, para o resto da vida..." porque vejo a ideia de que a
civilização tem como finalidade o progresso do homem como algo que devemos ter
em mente para o resto da vida, pois só assim conseguiremos fazer a nossa parte
na obtenção do referido progresso. Afinal, a qualidade de uma civilização é
resultado das ações de todos os seus componentes.
A tênue divisão entre
anjo e macaco, eis o título do artigo que provocou
esta postagem. Postagem que provocou um comentário recebido por email que
começa assim: "Prezado Guedes, O ser humano sempre foi e será um animal.". E-mail que comecei respondendo com
os dois seguintes parágrafos.
"Sempre foi e
sempre será", "nunca foi e nunca será", são afirmações que vão
de encontro às minhas crenças, embora sejam afirmações que vão ao encontro das
crenças da maioria.
Entre o complexo ou
síndrome de Gabriela - "Eu nasci assim, eu cresci assim, e sou mesmo
assim, vou ser sempre assim." e a afirmação "Somos o que somos e ao mesmo tempo o que fazemos para mudar o que somos.",
de Eduardo Galeano, fico com Galeano, embora a maioria fique com Gabriela. E o
"mudar o que somos", de Eduardo Galeano, eu entendo que seja mudar
para melhor, pois, infelizmente, mudar também pode ser para pior.
Resposta na qual deixei
de dizer que entre as minhas crenças está incluída a seguinte afirmação de
Teilhard de Chardin, também colocada no espaço dos blogs já citado nesta
postagem: "Não somos seres humanos vivendo uma experiência espiritual;
somos seres espirituais vivendo uma experiência humana.". Crença que leva-me
a acreditar na possibilidade do espessamento da "sempre muito fina
superfície de civilização sobre a qual nos equilibramos", conforme as
palavras de Timothy Garton. Espessamento que nos propicia a possibilidade de
passar a agir cada vez menos como macacos e, consequentemente, cada vez mais
como anjos.
Durante a elaboração das postagens, não são poucas as vezes que me
vem à cabeça algo mais ou menos assim: onde é que eu estou com a cabeça para,
em plena era da superficialidade e da distração inconsequente, meter-me a sair
por aí tentando espalhar ideias cuja finalidade é provocar as pessoas a
refletirem sobre as questões primordiais da vida? Que questões são essas? O que
é o homem? De onde ele veio? Para onde ele vai? O que ele veio fazer neste
mundo? Mas aí eu penso também: será que, depois que se adquire determinado grau
de consciência, faz algum sentido deixar de dedicar-se a fazer tais
provocações? E já que falei em provocações, termino esta postagem com uma feita
por Abraham Maslow, um dos pais da psicologia humanística.
Os três próximos parágrafos foram extraídos do livro Pedagogia
Iniciática – Uma escola de liderança, de Roberto Crema, um autêntico ser humano com quem tive a
felicidade de conviver durante seminários que fiz na UNIPAZ – Universidade Internacional
da Paz, da qual ele é hoje o Reitor. Os grifos
são meus.
"Gosto muito desta provocação,
que sempre evoco, do cientista e humanista Abraham Maslow, um dos pais da
psicologia humanística: 'Num certo sentido, apenas os
santos são a humanidade'. Ou seja, os demais não
lograram o desabrochar deste embrião de plenitude encarnado em nós. Se você quiser saber
quem são os verdadeiros seres humanos, recomendo que estude as existências de seres
humanos plenos, popularmente conhecidos como santos. É preciso estudar seres
humanos que deram certo.
O que é um ser humano? Você
conhece algum ser humano pleno, inteiro, verdadeiro? Receio dizer que o ser
humano pleno, nesse momento, é uma grande utopia. Utopia não no sentido do
irrealizável, mas no sentido do irrealizado, do ainda não realizado, daquilo
para o qual ainda não há espaço.
O ser humano pleno é uma
promessa. Os antigos afirmavam que o ser humano ainda não nasceu; estamos sendo
uma possibilidade, um potencial de florescimento. Se nós investirmos, com persistência e disciplina,
na dimensão do corpo, da alma e do coração, em algum momento justo do caminho
poderemos nos tornar seres humanos plenos."
Seres humanos plenos! Seres
humanos civilizados? Creio que sim. Os três parágrafos acima já haviam sido
apresentados na postagem A Humana Idade, em 12 de setembro de
2011. Postagem que, segundo minha insuspeita
opinião, vale a pena ler ou reler.
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