Continuação de terça-feira
Após 10 mil anos de temperaturas estáveis no planeta,
período em que toda a vida prosperou, alguns cientistas acreditam que agora
entramos em uma nova época geológica chamada Antropoceno, na qual as
características físicas do nosso planeta estão sofrendo mudanças significativas
e degenerativas devido ao nosso modo de vida.
A ironia por trás da abdicação do amor como estratégia de
sobrevivência é que os humanos são, na verdade, biologicamente programados para
sentir, se regular e se relacionar. Nossos corpos são os sistemas mais
sofisticados, organicamente movidos e enigmáticos que se pode imaginar. Tão
complexos e, ainda assim, tão intuitivos. Tão ricos em suas partes individuais
e, ainda assim, tão perfeitamente integrados. E após uma exploração mais
profunda de alguns aspectos de nossa anatomia que raramente são discutidos na
medicina ocidental, percebemos que, de fato, evoluímos para amar e "nos
conectar a um outro - seja o mundo, a pele, a comida ou o ar - para nos tornarmos
nós mesmos", como afirma o biólogo e filósofo alemão Andreas Weber.
Por exemplo, uma parte curiosa e raramente mencionada da
nossa biologia é o Nervo Vago, conectando o cérebro a quase todos os órgãos,
incluindo o coração, ligado ao sistema nervoso parassimpático e ao plexo solar
(considerado o segundo cérebro do corpo), de onde surgem nossos sentimentos
intuitivos (aquela sensação visceral, aquela tensão abdominal do medo, aquela
fome insaciável, aquele arrepio), que por sua vez guiam as mensagens do nervo para
o cérebro, nessa ordem. Este circuito integrado, chamado Complexo Vagal
Ventral, impulsiona nossas vantagens evolutivas em comunicação e conexão social
contribuindo para nosso florescimento. Ele forma a base de nossos Sistemas de
Engajamento Social, permitindo o apego crucial e saudável, o vínculo, a
confiança e a resiliência, e ao mesmo tempo aumentando as chances de conexão
recíproca.
Como Weber precisamente afirma, "o funcionamento do
círculo da vida na Terra depende unicamente do fato de que todos nós
compartilhamos o grande corpo de matéria e passamos uns pelos outros
reciprocamente". Por que temos um nervo que permeia quase todo o nosso
corpo, conectado ao cérebro e ao coração, sem mencionar outros órgãos, agindo
como um comunicador instintivo do nosso equilíbrio, regulando nossa resposta ao
nosso entorno? A falta de conhecimento anatômico pode explicar a falta de ação
comportamental? Será porque não estamos em contato com o funcionamento interno
de nossos corpos que nossas atitudes se desviam de nossa essência biológica?
Isso pode ajudar a explicar por que a sociedade moderna adoeceu na solidão, com
depressão, ansiedade, vício e trauma?
Somos seres biológicos e somos também seres conscientes
com a liberdade de tomar decisões que contradizem nossa natureza biológica. A
capacidade da consciência humana de formar imagens mentais abstratas nos
permite formular valores, crenças e objetivos; e nossos objetivos abstratos
muitas vezes tendem a nos desvincular da natureza e de nossos colegas seres
humanos.
Ideias abstratas são a base das grandes conquistas da
humanidade - de nossas magníficas obras de arte, ciência e filosofia -, mas
também podem levar à separação e fragmentação. Assim, o ambiente natural é
tratado como se consistisse em partes separadas, a serem exploradas por
diferentes grupos de interesse, e a sociedade é dividida em diferentes nações,
raças, grupos religiosos e políticos. A crença de que esses fragmentos são
realmente apartados e conflitantes pode ser vista como subjacente à nossa série
de crises ecológicas, sociais e culturais. Em particular, pode ser a falha
fundamental por trás da supremacia branca e de outras ideias racistas.
A vida floresce em comunidades, em redes de
relacionamentos. O ato de amar, que também pode ser entendido como viver com e
para a vida, é o que mantém a roda evolutiva girando. Descrevendo o amor como
"um processo ecológico", Weber explica que "o impulso, o desejo
e o anseio por pertencimento e autonomia são fundamentais: essenciais para
perceber, continuar e se desdobrar ". O amor é, portanto, o canal pelo
qual a vida persiste. Ele está no cerne de nossa resiliência e adaptabilidade:
o mundo está cada vez mais lotado de pessoas, prédios, lixo e gases de efeito
estufa. Somente o amor nos ajudará a reconciliar e compartilhar o fardo de
termos nos tornado grandes demais, rápido demais. Logo, devemos inocular noções
de amor nos ambientes de negócios.
Devemos definir o que uma empresa ama e concordar em
defender isso a qualquer custo. Devemos reconhecer que as empresas são lideradas
por pessoas com uma capacidade inata de amar e que, quando essa capacidade é
protegida e garantida, todos ganham, mas quando é reprimida, todos degeneramos
coletivamente. Dessa forma, o amor é uma estratégia de negócios tão pragmática
e eficiente quanto qualquer outra.
O amor também envolve a diluição das fronteiras do ego,
onde alguém busca grandes coisas para si mesmo, mas sem nunca comprometer a
capacidade dos outros de fazerem o mesmo. Significa reconhecer que muitos
outros seres não humanos também estão em seu caminho, tentando sobreviver por
mais um dia, e que apoiá-los nesse esforço é bom para eles, mas também para
nós. Weber esclarece que "o mundo não é uma agregação de coisas, mas sim
uma sinfonia de relacionamentos entre muitos participantes".
Todos nós desempenhamos um papel contribuindo para a
busca do planeta pela homeostase. Os humanos não podem atingir esse equilíbrio
sozinhos, mas certamente podem prejudicar o jogo da vida para todos os outros,
como temos feito. O ativista pela paz Satish Kumar suplica "primeiro amor,
depois negócios", sugerindo que o amor é o que torna o poder gerador, algo
que o mediador de conflitos canadense Adam Kahane também pontuou anos atrás em
seu livro seminal "Poder & amor".
Muitas
vezes ouvimos que o amor é uma noção muito branda para a corrida selvagem de
soma zero que são os negócios. Na realidade, os negócios estão demasiado
doentes, entorpecidos e perdidos em si mesmos para perceber que o amor é, de
fato, o ato mais sábio de coragem, compaixão e responsabilidade moral,
essencial para nossa sobrevivência e nossa capacidade de prosperar.
Diego Badaró, um pioneiro no cultivo sustentável de cacau
no Brasil, insiste que "nós somos os jardineiros de nossas vidas".
Nada poderia estar mais perto da verdade, e ao concordar com isso, alguém pode
perguntar: o que exatamente estamos plantando? De onde vem e para onde vai?
Para o bem ou para o mal, lenta, porém seguramente,
estamos todos nos tornando responsáveis pelas respostas a essas perguntas. Que
o amor vença nesse processo.
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Um artigo impressionante atribuído a uma dupla igualmente
impressionante. Um renomado físico teórico de sistemas, autor de vários livros
impressionantes, que aos 85 anos persiste atuando em prol da construção de um
mundo melhor e um "jovem" de 44 anos que, segundo a qualificação apresentada no
referido artigo, desde 2006 trabalha em prol do propósito nos negócios. Um
artigo que provocou em mim uma considerável quantidade de reflexões.
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