"Na era das mil e uma experiências, há quem volte para casa mais cansado do que saiu. Talvez, por essa razão, as viagens slow, ligadas ao bem-estar e ao autoconhecimento, têm se revelado uma tendência global."
Lidas as palavras acima no texto de Rosane Queiroz intitulado A viagem é para dentro, ficou em mim o
desejo de que tal tendência seja verídica e torne-se uma prática adotada por um
número suficiente de pessoas. Sim, um número suficiente de pessoas, pois como
mostra o fenômeno do centésimo macaco, "quando um número
suficiente de pessoas se torna consciente de algo, essa consciência se estende
a todos". O Fenômeno do Centésimo Macaco, eis o título da segunda postagem publicada neste blog, no longínquo ano 2011. Uma postagem simplesmente imperdível, segundo minha
insuspeita opinião.
"Viajar sem a ânsia de ir ticando listas é também uma forma de 'viajar para dentro'. Uma oportunidade de andar sem pressa e usar o tempo para buscar, na troca com esse lugar e com as experiências que ele nos traz, um pouco de reflexão e até mesmo de cura.", diz Rosane Queiroz."Se você conseguir prestar atenção ao que está ao seu redor, perceberá a abundância de vida que existe. Esse é um instante poderoso para refletir sobre a complexidade da existência, questionar suas escolhas e seu modo de viver", filosofa Alex Da Riva, proprietário e gestor do hotel Cristalino Lodge, em Alta Floresta (MT).
Buscar, na troca com o lugar onde estiver e com as experiências
que ele lhe trouxer, um pouco de reflexão e até mesmo de cura. Prestar atenção ao
que está ao seu redor, para perceber a abundância de vida que existe.
Aproveitar esses instantes poderosos para refletir sobre a complexidade da
existência e questionar suas escolhas e seu modo de viver.
Sim, como diz João Correia em seu livro Lisboa em Pessoa, "Viagens
precisam ser momentos de descanso, mas também de reflexão, de emoção e de
aprendizado. Viajar é uma forma divertida de, ao olhar outra cidade, outro
país, outra cultura, compreendermos um pouco mais de nós mesmos."
"Estamos todos viajando nesse corpo e nessa terra. Qual o nosso envolvimento? Estamos aqui só para tirar fotos e gravar vídeos ou nos conectar de verdade com o que cada lugar nos imprime?", questiona Fernanda, a professora de yoga dance citada por Rosane Queiroz em seu texto.
Questionamento que considero bastante pertinente, até porque
leva-me a um que já me fiz. Na época em que viajava, ao hospedar-se em
hotéis neste país, havia a necessidade de preencher uma FNRH: Ficha Nacional de Registro de Hóspedes. Ficha na qual uma das
informações a serem fornecidas era o motivo
da viagem. Motivo que era assinalado em uma relação que, geralmente,
continha as seguintes opções: Lazer /
Congresso / Estudos / Saúde / Negócios / Parentes & Amigos / Religião
/ Compras / Outro.
O tempo passou, um ininterrupto e estupendo desenvolvimento
tecnológico foi instaurado neste planeta e parecendo ter estupidificado uma
imensa quantidade dos seus integrantes neles passou a estimular uma vontade incontrolável
de sair por aí viajando para todo e qualquer lugar em função de um insano
motivo: Postar fotos. Sim, nesta
insana sociedade do exibicionismo, o que mais se vê são pessoas cujo principal
motivo para viajar parece ser postar fotos dos lugares onde estão, das comidas que
estão comendo, das atrações imperdíveis que estão "curtindo". E
fazendo tudo isso, de preferência, em tempo real. Não, não me perdi na
elaboração da postagem e esqueci de citar o questionamento a que me referi
na primeira frase do parágrafo anterior. Feito este esclarecimento, segue o meu
questionamento: será que já passou da hora de incluir – Postar fotos – entre os motivos para se viajar?
Por outro
lado, uma minoria que apresenta algum grau de conscientização da encrenca em que
está metida a autodenominada espécie inteligente do universo, atua tentando inspirar
pessoas a engajarem-se em práticas que contribuam para diminuir os estragos
causados pela referida espécie em sua devastadora passagem pelo planeta que ela mesma habita. A edição de 22 de setembro de 2019 do jornal O
Estado de S. Paulo traz uma reportagem intitulada Por clima, Europa cria 'vergonha de voar'.
"O principal é procurar entender como as pessoas locais pensam e vivem. 'Me pergunto o que elas têm para me ensinar sobre mim que ainda não sei. Como podem me mostrar uma forma de viver que não a minha?' [...] Em Alto Paraíso, no vilarejo de Cavalcante, o aprendizado veio da conversa com moradores, nas refeições simples. 'Ali, conhecemos a simplicidade, pessoas para quem 'menos é mais'", lembra Fernanda.
"Perguntar-se o que as pessoas locais têm para lhe ensinar sobre você que ainda não sabe. Como elas podem lhe mostrar uma forma de viver que não a sua", eis o principal, segundo Fernanda. "Viagens
precisam ser momentos de reflexão e de
aprendizado. Viajar é uma forma divertida de, ao olhar outra cultura, compreendermos um pouco mais de nós mesmos.", diz João Correia em seu livro Lisboa em Pessoa. Reflexão, aprendizado e compreensão de nós mesmos, eis três coisas que, no meu entender, deveriam ser incluídas como motivo para viajarmos.
"Viajar assim é um lembrete de que a vida não é uma corrida. Se vamos depressa demais, a paisagem vira só mais um borrão. [...] nesses momentos de pausa, sem o relógio ditando o ritmo, é quando a viagem se transforma em uma jornada de autodescoberta. É claro que viagens para retiros e yoga, silêncio e afins têm um poder realmente maior de proporcionar essa reflexão. Mas acredito que qualquer viagem, mesmo pertinho de casa, pode ser uma chance e se conhecer.", diz Rosane Queiroz.
E ao dizer que "Se vamos depressa
demais, a paisagem vira só mais um borrão.", Rosane Queiroz faz-me lembrar
uma conhecida frase de Guimarães Rosa: "O real não está na saída nem na
chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia.". Ou seja, se
vamos depressa demais, o que acontece é que o real se dispõe para a gente como um borrão!
Assim como Rosane Queiroz, também "acredito
que qualquer viagem, mesmo pertinho de casa, pode ser
uma chance e se conhecer." E considero impressionante a inclinação que a
maioria das pessoas tem para achar que tudo o que lhe convém esteja longe
delas. Sim, como diz Alex Da Riva, proprietário e gestor do hotel
Cristalino Lodge, em uma afirmação já citada nesta postagem, "Se você
conseguir prestar atenção ao que está ao seu redor, perceberá a abundância de
vida que existe." E ao perceber tal coisa, ainda segundo ele, você estará diante
de "um instante poderoso para refletir sobre a complexidade da existência,
questionar suas escolhas e seu modo de viver". Ou seja, você estará diante da
possibilidade de viajar para dentro.
Viajar para dentro, eis algo que acredito ser imprescindível a uma jornada de autodescoberta, de autoconhecimento. Autodescoberta
e autoconhecimento, eis duas coisas que enxergo como imprescindíveis ao
melhoramento de cada um dos integrantes de uma sociedade. Melhoramento de cada
um dos integrantes, eis uma coisa sem a qual não consigo imaginar a construção
de algo que algum dia venha a fazer jus ao termo civilização. E ao falar em construção,
me vem à mente uma afirmação que ouvi ou li recentemente, sem lembrar de onde: "Tudo o que presta é uma construção; nada é uma dádiva." Isso faz sentido para você?
Nenhum comentário:
Postar um comentário