Segue mais uma postagem surgida a partir de algo que li e
que provocou-me a seguinte exclamação: isso dá uma postagem! O que provocou
esta? Um anúncio publicado regularmente no jornal Valor Econômico reproduzido a seguir.
Devo mentir para os clientes a pedido do meu chefe?Acesse o blog Divã Executivo no site do Valor Econômico e conheça essas e outras questões de nossos leitores, respondidas por especialistas em gestão de carreira.
Leia em:
www.valor.com.br/carreira/diva-executivo
Acessei o
blog, mas não consegui conhecer as respostas dos especialistas, pois,
diferentemente deste, para visualizar alguma coisa naquele blog é necessário
ser assinante. Considerando que sair por aí fazendo assinatura de tudo o que
nos é oferecido é algo fora de propósito, a resposta à indagação que intitula o
anúncio oferecida gratuitamente neste blog será dada sem considerar o que dizem
os especialistas em gestão de carreira do referido blog, e levando em conta
apenas o que foi vivenciado por um generalista durante as 3,7 décadas de sua
longa e bem sucedida carreira. Resposta que será antecedida por algumas
explicações que considero indispensáveis.
Iniciando
as explicações, seguem algumas considerações sobre especialistas e
generalistas. Coincidentemente, no mesmo jornal em que encontrei o anúncio que provocou esta postagem, encontrei também uma página
dedicada à divulgação de livros. Página na qual entre os seis livros nela
apresentados está um de David Epstein intitulado "Por que os generalistas vencem em um mundo
de especialistas". Ao lado de uma foto da
capa há uma apresentação do livro composta pelas seguintes palavras: "Recomendado por Bill Gates como um dos melhores livros de 2020.
Indispensável para quem deseja transformar os seus interesses em múltiplas
áreas em carreiras de sucesso". Capa na qual
a palavra "ESPECIALISTAS" é assinalada com um "X"
que vai do "E" até o "S".
Ainda falando em especialistas, segue um trecho extraído
da descrição do meu perfil no blog. "Acredito que a especialização seja um dos grandes males da
civilização, pois a vida é sistêmica e jamais será entendida enquanto não a
olharmos como um conjunto de partes inter-relacionadas e nos interessarmos por
todas as suas partes."
Prosseguindo
com as explicações, seguem algumas considerações sobre dar (ou vender) soluções
para problemas que nos forem apresentados e responder indagações que nos forem feitas.
Na condição de consultor não diretivo, tenho a dizer o seguinte: nas
duas situações, se a intenção for oferecer algo que preste a (ao) solicitante, é
imprescindível conversar previamente com ela (e) para entender perfeitamente o
problema a ser solucionado ou a indagação a ser respondida. Oferecer soluções
para problemas e respostas para indagações que não tenhamos entendido
perfeitamente é algo que jamais deveríamos fazer.
Para quem
não sabe, e também para quem sabe, em linhas gerais, consultor não diretivo é
aquele que diferentemente do diretivo, em vez de oferecer soluções ou respostas
prontas, busca, juntamente com a (o) solicitante, encontrar a verdadeira
solução para o problema que lhe foi apresentado ou a resposta correta para a indagação
que lhe foi feita. A postagem publicada em 03 de abril de
2012 é intitulada "Os dois tipos de consultores". Postagem que, segundo
minha "insuspeita" opinião, vale a pena ler.
Embora
possa parecer algo inacreditável nos dias de hoje, já houve tempos em que os
sistemas de informação eram feitos sob medida para quem os fosse usar em vez de
comprados prontos (sic) e remendados para tentar adequá-los às necessidades de
quem os fosse usar.
Tempos em
que desenvolver sistemas de informações implicava no aprendizado por parte dos
analistas de sistemas das tarefas desempenhadas pelos usuários e das informações
nelas envolvidas, para que, de posse de tal aprendizado, pudessem desenvolver um
sistema de informações que trabalhasse para os usuários e não um para o qual os
usuários tivessem que trabalhar. Afinal, por mais incrível que possa parecer, a
finalidade de um sistema de informações é servir aos usuários em suas tarefas e
não fazer os usuários a ele servirem.
Como
consequência natural dessa forma de trabalhar, o analista tornava-se alguém
cujo conhecimento das tarefas dos usuários conseguia até superar o dos
usuários. Foi dessa forma que, atuando durante um enorme período desenvolvendo
sistemas para a Área Contábil da empresa em que trabalhei durante 3,5 décadas
adquiri um conhecimento que levou-me a receber inúmeros convites para
transferir-me da Área de TI e tornar-me um funcionário da Área Contábil. O que
o que acabo de relatar tem a ver com o tema desta postagem? O próximo parágrafo
responde esta indagação.
Em uma das
inúmeras vezes em que estive trabalhando nas instalações da Área Contábil ouvi
de um dos chefes de divisão, que estava entre os que haviam me convidado para
transferir-me, algo mais ou menos assim: "Vamos ter uma reunião agora para
tratar do assunto tal, então eu vou pedir a você para participar. Vou pedir
porque você ainda não é da Área Contábil, pois, se já fosse eu não pediria, eu
mandaria". Em uma demonstração da veracidade de um antigo ditado que diz
que "Quem fala o que quer pode ouvir o que não quer", aquele chefe
ouviu o seguinte: "É devido a declarações desse tipo que jamais aceitarei
um convite para transferir-me para cá".
Portanto, antes de responder a questão que intitula o
anúncio, há a necessidade de corrigi-la. Não, ao contrário do que é dito no
anúncio, chefes não pedem, chefes mandam. Quem pede são os subordinados. Pedem
e não são atendidos, pois uma das formas mais usadas por chefes para
demonstrarem autoridade é, exatamente, negar os pedidos dos subordinados.
Encerradas
as indispensáveis explicações e feita a devida correção, vamos à minha resposta
à indagação que intitula o anúncio:
Devo mentir para os clientes a mando do meu chefe?
"O
que se é obrigado a fazer ou a evitar. Obrigação moral. O que impõem a
consciência moral, as leis ou os costumes", eis alguns significados encontráveis
em dicionários para a palavra dever. Para interpretar a indagação que compõe o
titulo do anúncio será usado o primeiro: "o que se é obrigado a fazer".
Significado que, aplicado no título do anúncio, deixa-o assim:
Sou obrigado a mentir para os clientes a mando do meu chefe?
Ser
obrigado a fazer o que quer que seja, eis uma questão sobre a qual tenho uma
opinião formada há mais de meio século. Na época em que estudei na UFRJ (1971
-1974), pelo regulamento da Universidade havia para cada matéria três provas das
quais duas eram consideradas e uma era desprezada. Talvez devido a esse
regulamento, durante a realização das provas havia sempre algum aluno que fazia
a seguinte pergunta: "Professor, esta prova é obrigatória?" Pergunta
que, várias vezes, respondi pelo professor com uma resposta mais ou menos assim:
"Não, nenhuma prova é obrigatória. Não fazer e ficar com zero é sempre uma
opção." Estendendo a resposta: "Não, nada na vida é obrigatório fazer.
O que é obrigatório é aguentar as consequências, tanto por fazer quanto por não
fazer."
Dito isto,
creio que seja fácil deduzir que minha resposta à indagação que intitula o
anúncio é não. Não, você não é obrigado a mentir porque o seu chefe mandou, o
que você é obrigado é a aceitar uma punição por não ter sido obedecido. Afinal,
como diz uma máxima que rege o teatro, digo, o mundo corporativo, "Manda
quem pode e obedece quem tem juízo"? E o que é ter juízo? É não contrariar
quem manda, pois contrariar costuma resultar em algo indesejável. No caso em
questão, não obedecer pode custar o emprego. E neste mundo em que a escassez de
empregos é a cada dia maior, devido à substituição do ser humano por alguma
invenção tecnológica, também a cada dia maior, perder um emprego é algo que
pode tornar você inelegível para um novo emprego não por apenas oito anos, mas
até mesmo para o restante de sua vida.
Portanto,
decidir se deve ou não mentir porque o chefe mandou é algo que, no meu
entender, independentemente da resposta dada por alguém a quem se consulte,
caberá sempre ao consulente, levando em conta suas condições econômicas,
financeiras e empregatícias (possibilidade de conseguir um novo emprego).
Compreendido?
Um dos
efeitos colaterais da crescente e atemorizante escassez de empregos, neste insano
mundo regido por um deus denominado mercado, é um correspondente aumento da quantidade
de mentirosos.
O que é
dito acima constitui a resposta de um generalista fornecida gratuitamente,
neste blog. A quem quiser compará-la com as respostas de especialistas vendidas
no referido blog do site, faço o seguinte alerta: os especialistas têm chefe que
manda e o cliente é você.
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