De onde veio o longo título desta postagem? De uma frase
lida em um livro há um longo tempo! Qual é o livro? O
Pequeno Príncipe, uma obra prima de Antoine de Saint-Exupéry que li, pela
primeira vez, há mais de meio século. O que levou-me a usar essa frase para
elaborar uma postagem? A forma como as pessoas lidam com a data do aniversário
de pessoas que dizem serem suas amigas, nestes tempos em que tudo foi
terceirizado.
Entre as pessoas para quem telefono no dia de seu aniversário
algumas já me disseram que, nesse dia, ficam esperando pelo meu telefonema. Algumas
perguntam-me qual é o dia do meu aniversário. Este ano, após fazer tal pergunta,
uma delas disse-me que, por eu não participar das redes sociais, as pessoas
acabam não sabendo qual é o dia do meu aniversário. Ou seja, nestes tempos em
que tudo passou a ser terceirizado, a lembrança do aniversário de alguém que
dizemos considerar é algo que deixou de ser feito por nós mesmos. Atualmente,
parece-me que cabe ao Facebook fazê-lo.
Então, se o Facebook não nos lembrar,
a lembrança do aniversário da pessoa amiga, simplesmente, não ocorrerá.
Algo que incomoda-me bastante é a substituição de um
telefonema por uma mensagem. Aliás, até a palavra mensagem já foi substituída.
Em resposta à pergunta – Você telefonou para fulano (a) para parabenizá-lo (a)
pelo aniversário? – já ouvi respostas que, no meu entender, não combinam com o
sentimento que se diz ter em relação ao (à) aniversariante. Uma que ouvi muitas
vezes é a seguinte: "- Não, não telefonei; enviei um SMS." Resposta
que levava-me a dizer que, usada em tal situação, a sigla SMS deve significar -
Sem Muito Sentido. O tempo
passou, e hoje as pessoas respondem à referida pergunta assim: "- Não, não
telefonei; enviei um ZAP". Diferentemente de SMS, para esta sigla,
simplesmente, não tentei encontrar algum significado. Como diz o meu eterno
amigo Demílson, "Cansei!".
Saturados de possibilidades de comunicação, chegamos a estranhos
resultados como alguns que descrevo a seguir, com a intenção de evidenciar os
efeitos da combinação do fascínio pelo uso da tecnologia com a paranóia provocada
pelo medo de seu uso para o mal.
Ao telefonar para uma ex-colega de trabalho e eterna
amiga para parabenizá-la pelo aniversário, dela ouvi que eu era alguém com quem
jamais gostaria de perder o contato e, alegando que isso o facilitaria,
recomendou-me que passasse a usar o Whats
App, algo que eu não fazia. O tempo passou, a pandemia fez-me passar a usar
coisas das quais eu não gosto, entre elas o Whats
App. Com a intenção de fazer-lhe uma surpresa, enviei-lhe uma mensagem pelo
meio que ela recomendara-me. Considerando que a ideia era provocar-lhe uma
surpresa, enviei-lhe uma mensagem não "assinada". Afinal, nos dias de
hoje, existe uma coisa denominada agenda na qual registramos os números dos
telefones das pessoas de quem esperamos receber telefonemas e, principalmente,
mensagens, não é mesmo? E assim como eu tinha o número do telefone dela na
minha agenda, eu imaginava que ela também tivesse o número do meu na dela. Foi
um enorme erro de imaginação com um resultado desastroso.
A amiga viu a mensagem, não me respondeu e deve ter,
simplesmente, me bloqueado em relação a tentativas de contato de qualquer
natureza, tanto por mensagens quanto por telefonemas. Ou seja, nunca mais
consegui falar com aquela amiga que, inclusive, convidara-me para assistir ao
seu casamento e ao qual compareci. Tentando entender sua reação, cheguei à
seguinte conclusão. Diferentemente do que eu imaginava, ela não tinha o número
do meu telefone em sua agenda e, nestes tempos paranóicos em que sobrevivemos,
deve ter imaginado tratar-se de uma mensagem de algum criminoso. Como cheguei a
essa conclusão? Interpretando o texto da mensagem que lhe enviara. Mensagem
que, sem identificar as pessoas envolvidas, é reproduzida a seguir.
Boa tarde amiga! Como tem passado? Você conhece Fulana? Você pode me fornecer o número do telefone da Beltrana? Feitas essas perguntas aguardo suas respostas. Beijos.
Texto onde Fulana é a organizadora de um livro que eu
usara em uma das postagens do blog e cujo sobrenome é o mesmo da minha amiga,
acrescido de um nome que poderia ser do marido. E Beltrana é uma amiga em comum
com quem ela tem mais contato do que eu e cujo aniversário seria no dia
seguinte. Nestes tempos apavorantes em que sobrevivemos, será que faz sentido imaginar
que ela interpretou a mensagem como sendo de algum sequestrador? Ainda
envie-lhe mais duas mensagens, mas foi em vão. Resultado: nunca mais consegui
contatar alguém que dissera não querer jamais perder o contato comigo. Vivemos
tempos realmente estranhos, não?! No dia 20 de dezembro de 2021, enviei para Beltrana o
seguinte e-mail:
Querida amiga,Mais uma vez não consigo falar com você no dia do seu aniversário.Sendo assim, restou-me a opção de fazer uma tentativa de parabenizá-la por e-mail. Agora, resta-me apenas a parte religiosa: rezar para que este e-mail tenha êxito.Ao parabenizar a Sicrana no mês de junho, fiquei sabendo que você estava trabalhando no Rio de Janeiro. Sendo assim, na véspera de seu aniversário tentei contatá-la para que ela me fornecesse o seu número de telefone. Tentativas, infelizmente, sem êxito. Tentei pelo Whats App, primeiramente por mensagens e posteriormente por telefonema, e por último pelo antigo (e relegado a sei lá que plano!) e-mail. Não recebi resposta alguma da Sicrana. Se você falar com ela, por favor, conte-lhe essa história.Espero que você tenha tido um ótimo dia de aniversário.Guedes
Nove dias depois, respondendo a um e-mail enviado para a
minha lista no dia anterior, Beltrana enviou-me um e-mail no qual desejava-me
um Feliz Ano Novo e perguntava como estávamos eu e a família, sem fazer
qualquer menção ao e-mail que eu lhe enviara alusivo ao seu aniversário. E-mail
que respondi aproveitando a oportunidade para perguntar-lhe se lera os que lhe
enviara nove dias antes. Até hoje, não recebi resposta alguma da Beltrana!
Estamos ou não, sobrevivendo em tempos tremendamente sinistros?!
A princípio optei por deixar que o tempo se encarregasse
de resolver o problema da incomunicabilidade com aquela amiga, porém, quando eu
já lidava com a elaboração desta postagem, mudei de ideia e no dia 24 de abril enviei
uma mensagem para uma amiga em comum solicitando-lhe que telefonasse para aquela
que me bloqueara e pedisse-lhe que ligasse para mim. A amiga enviou-me o número
do telefone, respondi-lhe que eu tinha-o e contei-lhe o que acontecera. Dois
dias depois, a amiga "incomunicável" ligou, confirmou que a minha
interpretação do que ocorrera estava correta e acrescentou algumas coisas que,
segundo ela, explicavam o bloqueio.
Segundo ela, tudo começou quando ao passar de um smartphone
andróide para um iphone ocorreram problemas na transferência da agenda e o número do
meu telefone foi perdido. Não reconhecendo o número que lhe enviara aquela
mensagem suspeita, ela o bloqueou. É por essas e outras que tenho uma cópia da
agenda. Obviamente, fora do smartphone. Terceirizar a preservação da minha
agenda é algo que não passa pela minha cabeça. É impressionante a crescente dependência
de um smartphone para se fazer qualquer coisa nesta insana vida que se leva! Será
que colocar toda a nossa vida em uma "coisa inteligente" é algo
realmente inteligente?
Alusivo a coisas inteligentes, há um comentário, para mim
inesquecível, feito por uma ex-colega e eterna amiga em um episódio ocorrido em
02 de setembro de 2010, um mês antes de aposentar-me (episódios que deixem-me perplexo,
costumam levar-me a registrar a data). Intitulada A necessidade de conversar, a postagem publicada em 31 de maio de
2011 foi provocada por um episódio que deixou-me perplexo. Postagem que a minha
insuspeita (!) opinião considera imperdível. Dito isto, segue o relato do episódio
alusivo a coisas inteligentes.
Ao ver a porta de um elevador inteligente abrir-se e
dentro dele ver uma pessoa conhecida, alguém disse algo mais ou menos assim:
Oi, fulana! Eu preciso falar com você, mas com essa separação feita por esses elevadores
inteligentes nós não nos encontramos mais. Ouvindo isso, a Bianca Rocha
Rodrigues, fez o seguinte comentário: "A inteligência separa as pessoas." Esta
postagem já está muito longa e, sendo assim, vou terminá-la acrescentando apenas dois parágrafos.
"Aqueles que passam por nós não vão sós, não nos
deixam sós. Deixam um pouco de si, levam um pouco de nós.", diz Antoine de
Saint-Exupéry, em mais uma notável frase do Pequeno
Príncipe. Parafraseando o título da postagem, "É o
tempo que dedicamos aos amigos que os fazem tão importantes". E
quando chega-se ao ponto de, nem no dia de seus aniversários conseguirmos
dedicar algum tempo para telefonar para aqueles que passam por nós, creio que já
tenhamos atingido um estágio que deveria nos dar o que pensar.
Em relação ao deslumbramento da
autodenominada espécie inteligente do universo diante do assustador crescimento
da quantidade de coisas inteligentes ao seu dispor (usáveis para o bem ou para
o mal), creio que elaborar alguma postagem focalizando-o será algo inevitável.
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