segunda-feira, 4 de outubro de 2021

Lição oferecida pela estada em um leito de UTI

 "O aprendizado nunca termina. Não existe parte da vida que não contenha lições. Se você está vivo, há lições para aprender."

(Autor não identificado)
Uma postagem com um tema sobre o qual eu jamais imaginara escrever: a estada em um leito de UTI. Ou seja, uma surpresa. E ao falar em surpresa vem-me à mente uma espécie de refrão usado em um esquete da peça teatral Notícias Populares apresentada pela Companhia de Comédia os Melhores do Mundo em 2006. "Mas a vida é uma caixinha de surpresas, e numa bela manhã de sol ...", onde "..." é a descrição de algo sinistro ocorrido com o personagem Joseph Climber.
Refrão que uso para parafrasear algo ocorrido comigo na manhã do dia 28 de agosto de 2021. "Mas a vida é uma caixinha de surpresas, e numa bela manhã de sol, ao constatar que a saturação de oxigênio (que passara a medir após saber que fora pego pela COVID-19) descera a 89,??%, minha nora, que é médica, e meu filho levaram-me para o Hospital Bangu, onde ela trabalha". Hospital em que fiquei internado por 16 dias. Internação que levou-me a uma estada de 14 dias em um leito de UTI, seguida de 02 dias em um quarto.
Uma estada que proporcionou-me uma lição inesquecível. Repetindo aqui algo dito no último parágrafo da postagem anterior, a estada em um leito de UTI, coincidentemente, possibilitou-me comprovar uma afirmação feita em um parágrafo apresentado em duas das mais recentes postagens deste blog e repetido a seguir.
"Viemos a este mundo, desde o momento do nascimento, incapazes de agir sem a ajuda de outros. Crescemos, então, nesse nosso propósito: cuidar daqueles que estão ao nosso redor, de forma que, cuidando uns dos outros, possamos todos viver seguros no conhecimento de que somos protegidos e queridos, necessários e amados.", diz Joan Chittister, no livro Bem-vindo à sabedoria do mundo – O que as grandes religiões nos ensinam para viver melhor.
"Viemos a este mundo, desde o momento do nascimento, incapazes de agir sem a ajuda de outros.", eis a afirmação que pude comprovar quando, aos 71 anos, vi-me em um leito de UTI, pois, assim como um recém nascido, também eu estava na condição de incapaz de agir sem a ajuda de outros. Alguém que, sem a ajuda de outros, simplesmente, seria incapaz de evitar a interrupção de sua atual passagem por esta dimensão. Recorrendo a uma paráfrase para descrever a estada em um leito de UTI, digo o seguinte: Ficamos neste mundo, desde o momento em que somos colocados em um leito de UTI, incapazes de agir sem a ajuda de outros.
Comprovar a incapacidade de agir sem a ajuda de outros, eis a lição que a vida oferece de forma contundente a todos que estejam em um leito de UTI, seja o Manuel Pinheiro Guedes ou o Jeff Bezos. Estar em um leito de UTI é a dependência total, pois a única coisa que se consegue fazer sozinho (se estiver lúcido) é alimentar-se, pois qualquer outra coisa, por mais trivial que seja como tomar banho, fazer as necessidades fisiológicas e, posteriormente, limpar-se dependem da ajuda de outros. Isto é, por mais rico ou mais metido a besta que seja o indivíduo, haverá sempre o risco de em algum momento a vida o colocar na situação extrema de depender de outros para manter a própria vida.
"Crescemos, então, nesse nosso propósito: cuidar daqueles que estão ao nosso redor, de forma que, cuidando uns dos outros, possamos todos viver seguros no conhecimento de que somos protegidos e queridos, necessários e amados.", diz Joan Chittister, no livro Bem-vindo à sabedoria do mundo – O que as grandes religiões nos ensinam para viver melhor.
"Cada um, ao nascer, traz sua dose de amor. Mas os empregos, o dinheiro, tudo isso, nos resseca o solo do coração", eis uma afirmação de Vladimir Maiakovski.
A estada em um leito de UTI ofereceu-me não apenas uma lição inesquecível, mas também uma oportunidade para refletir sobre as afirmações de Joan Chittister e de Vladimir Maiakovski reproduzidas acima. As palavras de Joan Chittister foram negligenciadas, a imensa maioria dos integrantes deste planeta esqueceu nosso propósito. As palavras de Maiakovski, infelizmente, tornaram-se inquestionáveis e o resultado é esse que está aí: uma imensa quantidade de pessoas que enveredou pelo individualismo.
Porém, nem tudo está perdido, pois apesar de enxergá-las como sendo minoria, ainda existem pessoas que não esqueceram as palavras de Joan Chittister. Onde encontrá-las? Entre profissionais da área de saúde, principalmente, entre aqueles (as) que atuam em UTIs. Profissionais que dedicam grande parte de sua vida a cuidar com extremo zelo, amor e compaixão de pessoas cujo prosseguimento da vida nesta dimensão está, literalmente, em suas mãos. Profissionais que, felizmente, encontrei em grande quantidade entre os que cuidaram de mim no Hospital Bangu. Muitos com impressionantes qualidades humanas cujos nomes devidamente associados às pessoas não consegui guardar, mas dos quais jamais esquecerei. Mais do que profissionais, seres que me possibilitam crer que o tal do ser humano ainda tem jeito e, consequentemente, crer também que algum dia, por mais distante que esteja tal dia, a vida neste planeta será algo melhor.
Quando nos vemos diante de pessoas cuja existência nos causa espanto e admiração, a expressão geralmente usada é: Fulano, você não existe! Expressão que eu jamais usaria diante dos profissionais que cuidaram de mim no Hospital Bangu. Por quê? Porque a expressão correta é a seguinte: Profissionais da Área de Saúde do Hospital Bangu que cuidaram de mim, graças a Deus, vocês existem, pois é a existência de vocês que evitou a interrupção da minha, pela COVID-19. Minha gratidão a vocês é algo eterno.
Sim, considerando o que acontece com o personagem Joseph Climber, realmente "a vida é uma caixinha de surpresas". Porém, considerando a coincidência de minha ida para um leito de UTI ter ocorrido justamente no momento em que eu iria publicar uma postagem que destaca a afirmação de que "Viemos a este mundo, desde o momento do nascimento, incapazes de agir sem a ajuda de outros", e de outras coincidências que já tive a oportunidade de citar ao longo das mais de 600 postagens deste blog, a vida também é uma caixinha de coincidências. E também uma caixinha de lições, pois como é dito na epígrafe desta postagem, "Não existe parte da vida que não contenha lições". Compreendido?

4 comentários:

Juliana Soares Psi disse...

Que privilégio poder ter acesso a esse belo texto e estar entre os profissionais que puderam oferecer humanidade, cuidado e afeto. Saúde Sr Manoel 🤗

Guedes disse...

Oi, Juliana!

No meu entender, privilégio maior do que ter acesso a esse texto foi, no momento mais crítico de minha atual passagem por esta dimensão, ter encontrado os profissionais que ofereceram-me humanidade, cuidado e afeto. Até porque foi a atuação desses profissionais, entre os quais você está incluída, que possibilitou a minha permanência nesta dimensão e consequentemente a elaboração do texto.

Foi com enorme satisfação que li o seu comentário. Que você continue com o seu belo trabalho e que seja feliz.

Abraços, Manuel.

Unknown disse...

Prezado Manuel,


Muito bom saber que você conseguiu , com a ajuda desses profissionais tão valorosos, manter-se firme entre nós.

Muita saúde para você e continue produzindo esses ótimos textos que publica em seu blog.

Abraço,
Marcio

Guedes disse...

Prezado Marcio,

Muito bom receber um comentário do antigo e grande amigo.

Muita saúde para você e sua maravilhosa família, e obrigado pelo elogio aos textos do blog.

Abraços,
Manuel