segunda-feira, 15 de junho de 2020

O terceiro "ware" (I)

"Pela habilidade para lidar com pessoas pagarei mais do que por qualquer outra habilidade imaginável."
(John D. Rockefeller, fundador da primeira grande empresa de petróleo da história)
Sim, como diz Joseph Climber, "a vida é uma caixinha de surpresas". Surpreendido pelo recebimento de um e-mail de uma ex-colega de trabalho integrante da minha lista de envio de e-mails, mas de quem não recebia mensagens há muito tempo, optei por mudar a "programação" das postagens e trocar a que seria publicada hoje por esta provocada por seu comentário. Considerando que a quantidade de coisas que considero relevantes dizer sobre o tema terceiro "ware" não coube em uma única postagem com tamanho adequado a leitores de pequeno fôlego, mais uma vez recorro ao método Jack – vamos por partes. Sendo assim, serão duas postagens. Segue a reprodução do comentário.
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Guedes,
Em épocas de inteligência artificial, esta frase "O sistema está com problemas" vai ser cada vez mais usada ... no ano passado foi feita a primeira cirurgia cardíaca por robôs mas a longa distância ... isso se tornando habitual, quando o paciente morrer aceitaremos esta desculpa "erro do sistema"? Será que vamos continuar a esconder nossos problemas atrás dos sistemas?
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E ao perguntar - Será que vamos continuar a esconder nossos problemas atrás dos sistemas? – a alguém que atuando como analista de sistemas durante 3,5 décadas sempre questionou a maneira equivocada de desenvolver sistemas, o que a minha saudosa ex-colega fez foi provocar-me para que escrevesse alguma coisa. Alguma coisa que começa com uma resposta afirmativa a sua pergunta e continua com uma argumentação embasada em trechos de um livro cujo título será revelado no segundo parágrafo abaixo.
Como é do conhecimento da imensa maioria, a área de tecnologia da informação apóia-se em dois "ware"s: hardware e software. O problema é que para apoiar-se com firmeza é necessário um terceiro "ware". Um "ware" que a imensa maioria demonstra ignorar. Não, o terceiro "ware" não é aquele produto inventado por Earl Tupper no início da década de 1940 ao qual ele deu o nome "tupperware".
O terceiro "ware" é algo explicado em um livro de autoria de Tom DeMarco e Timothy Lister publicado em 1987. Percebendo que apesar de todo o avanço tecnológico "os projetos insistiam" em não dar certo, eles descobriram que o problema estava no fato de considerarmos como sendo de natureza tecnológica algo cuja natureza é sociológica. O título do livro? Peopleware - Como gerenciar equipes e projetos tornando-os mais produtivos. Ou seja, o terceiro "ware" é o "peopleware"!
Dito isto, vejamos alguns trechos desse livro de leitura imprescindível e algumas considerações sobre eles. Os trechos compostos de palavras textuais do livro são aqui reproduzidos em itálico.
Existe um padrão industrial inviolável que proíbe o exame de nossas falhas.
Será que essa afirmação já é suficiente para responder afirmativamente à pergunta - Será que vamos continuar a esconder nossos problemas atrás dos sistemas - feita pela minha ex-colega de trabalho? O que vocês acham? Mas os argumentos para a resposta afirmativa não param por aqui, existem mais.
Os principais problemas de nosso trabalho não são de natureza tecnológica, mas sim sociológica. Nós utilizamos os computadores para desenvolver nossos produtos ou para organizar nossos negócios. Como trabalhamos em equipes, projetos e outros grupos coesos, o nosso negócio é mais a comunicação humana. Os nossos sucessos vêm de interações humanas boas entre todos os participantes do esforço, e os nossos fracassos surgem das interações humanas pobres.
Na empresa em que eu trabalhava ocorria o seguinte paradoxo: eram realizados encontros denominados DE – Desenvolvimento de Equipes e eram premiados destaques individuais. "Existem apenas duas coisas infinitas – o universo e a estupidez humana. E não tenho tanta certeza quanto ao universo." Será que faz sentido duvidar dessa afirmação de Albert Einstein?
Embora tenha sido publicado há 33 anos, enxergo como bastante atual a maioria das coisas ditas em Peopleware - Como gerenciar equipes e projetos tornando-os mais produtivos. Atualidade que, no meu entender, pode ser explicada por algo que, naquela época, não era enxergado pela maioria e que continua não sendo enxergado até hoje: que "Os principais problemas de nosso trabalho não são de natureza tecnológica, mas sim sociológica." "Numa empresa todos os problemas são humanos; e todos os humanos são problemas.", diz uma inesquecível frase que li há mais de três décadas em um daqueles cadernos sobre administração que eram publicados na edição dominical dos jornais, e que associo à afirmação anterior. Fascinada por tecnologia, a autodenominada espécie inteligente do universo deixa de enxergar tais coisas e acaba sendo vítima de dois "estup"s: um estupendo desenvolvimento tecnológico e uma estúpida estagnação sociológica.
Se você descobre que está se concentrando mais na tecnologia do que na sociologia, você é como aquele personagem do vaudeville que perde as suas chaves em uma rua escura e as procura em uma rua próxima, porque, ele explica, "Lá é mais claro".
E tome Albert Einstein!
Gastávamos muito tempo tentando fazer as coisas e não perdíamos o tempo suficiente fazendo a pergunta chave, "Esta coisa deveria ser feita"?
Será que a frase acima faz mais sentido escrita com a inversão de verbos realizada na frase reescrita a seguir: Perdíamos muito tempo tentando fazer as coisas e não gastávamos o tempo suficiente fazendo a pergunta chave, "Esta coisa deveria ser feita?". Terá sido um erro de tradução?
Termina na próxima sexta-feira

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