sexta-feira, 16 de novembro de 2018

Não deixe a grana tirar seu sono (final)

Continuação de sexta-feira
LOLA: Filantropia é uma forma de mostrar desapego ao dinheiro? Ou é outra forma de apego?
Armstrong: No seu melhor, a filantropia mostra o bem que o dinheiro pode alcançar. Mostra desapego no sentido de que o indivíduo não está usando o dinheiro para seu próprio conforto. É claro que o filantropo retira daí grande satisfação, mas isso não reduz seu mérito.
LOLA: A versão de que quem herda muito dinheiro tende a não ter objetivos de vida faz sentido?
Armstrong: Sem dúvida. A herança de uma grande quantia é algo bem difícil de lidar, embora muitas pessoas fantasiem a respeito. Se você herda bastante dinheiro, poderá fazer o que bem entender. E a liberdade completa é terrível para algumas pessoas. Então, elas enlouquecem, porque satisfazem todos os desejos imediatamente. É receita para o desastre. Famílias que conseguiram administrar bem grandes heranças ao longo de gerações tiveram grande cuidado em educar seus filhos com responsabilidade social e ensinar a eles como lidar com suas vantagens. Limitaram a quantidade de dinheiro acessível, pensaram muito bem nos perigos da arrogância.
LOLA: Qual é o equilíbrio entre poupar e gastar?
Armstrong: A verdadeira questão relevante é sobre o equilíbrio entre as despesas e uma vida boa, tranquila. Gastar muito é um desperdício, porque isso não contribui para o bem-estar a longo prazo. Mas, se você apenas poupa e não gasta, qual é o propósito? O que devemos nos perguntar é: "Quais são minhas reais e imediatas necessidades? E quais serão as necessidades reais, outras, que eu terei no futuro?". A habilidade de perceber o que precisaremos a longo prazo é uma das mais importantes capacidades a serem desenvolvidas.
LOLA: As preocupações com dinheiro variam de acordo com a faixa etária?
Armstrong: Sim – e com razão. Quando somos jovens, não temos a noção do que irá acontecer em nossa vida. Não sabemos se seremos bem-sucedidos na carreira, não temos certeza de nossos pontos fracos e fortes. Um rapaz de 21 anos não sabe se terá uma casa grande ou se a economia vai crescer em 20 anos. Quanto mais velhas, as pessoas são tomadas por um sentimento de que desperdiçaram sua existência, de que têm cada vez menos a oferecer ao mundo e estão ficando para trás. Então, tendem a usar o dinheiro para tentar manter sua respeitabilidade: comprar um carro caro, ir a um restaurante de luxo, por exemplo, para se sentirem aceitas no mundo.
LOLA: Homens e mulheres lidam de maneiras diferentes com o dinheiro?
Armstrong: Sou um pouco cauteloso quanto à generalização de gêneros, porque sempre existem exceções notáveis. De um modo geral, acho que as mulheres tendem a ser mais realistas e sensatas. Tem a ver com a maternidade e com o fato de que elas, muitas vezes, não são as principais provedoras da casa. Então, preocupam-se mais com o dinheiro disponível e não ficam tão presas ao pensamento de "Um dia, vou ganhar uma fortuna". Muitos homens têm em mente que vão ganhá-la, e isso se torna não só uma esperança, mas uma previsão, embora muitas vezes falsa. Isso, porém, não é uma regra universal.
LOLA: Por que as mulheres, quando não estão preocupadas com os filhos, estão preocupadas com o cartão de crédito?
Armstrong: Cartão de crédito é uma invenção infeliz. Ele combina duas coisas que deveriam ser mantidas separadas: a facilidade de comprar e um empréstimo. Endividamento faz sentido para fins de investimento, para gerar riqueza, não para consumo. Para a classe média, o mundo está cheio de objetos desejáveis – sapatos que são realmente adoráveis, hotéis que são agradáveis, e viajar de classe executiva é uma alegria: é totalmente compreensível que queiramos essas coisas. Mas o cartão de crédito nos dá a opção de comprar coisas que não podemos realmente pagar – e, portanto, de sacrificar o futuro pelo presente. Em um mundo ideal, as pessoas não seriam autorizadas a contrair empréstimos para consumo.
"Cartão de crédito é uma invenção infeliz"
"Dívidas fazem sentido para investimento, para gerar riqueza. Não para consumo."
LOLA: Hoje, a maioria das transações é virtual. Isso muda a noção das pessoas em relação ao dinheiro e a maneira com que lidam com ele?
Armstrong: Sim. Quando temos de pagar em dinheiro – em notas reais -, ficamos muito mais conscientes do que estamos gastando. Transações virtuais diminuem a dor dos gastos, o que provavelmente é uma coisa ruim, embora seja totalmente compreensível que queiramos diminuir essa dor. A dor é, biologicamente falando, um sinal de alerta sobre o perigo. Então, se você elimina a dor, você elimina o sinal de alerta.
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Será que vale a pena refletir sobre o que é dito pelo filósofo John Armstrong? Ou será que você pertence ao diminuto grupo composto por aqueles (as) que sabem lidar com esse cultuado deus desta civilização (sic).

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