quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

E o e-mail, hein?

Lidar inadequadamente com o que é colocado ao seu dispor, eis um dos grandes equívocos cometidos frequentemente pela imensa maioria da pretensa espécie inteligente do universo. Achar que toda e qualquer novidade vem para substituir tudo o que já existe, e não para ser uma opção a ser usada conforme as circunstâncias. Acreditar, tolamente, que toda e qualquer novidade lhe trará apenas vantagens esquecendo que, assim como na contabilidade, nessa coisa denominada vida também há sempre uma contrapartida. Em outras palavras, nada tem apenas prós ou apenas contras.
Dito isto, após uma postagem provocada por um comentário recebido por e-mail, segue uma na qual são focalizados o uso, a utilidade e a sobrevivência do e-mail. Publicada na edição de 27 de janeiro de 2018 do jornal O Globo sob o título 'E o e-mail, hein?', a reportagem apresentada a seguir é assinada por Liv Brandão.
E o e-mail, hein?
Faça um teste. Abra seu e-mail pessoal e dê uma olhada na caixa de entrada. Quantas mensagens de fato pessoais você encontra? E qual a proporção delas em relação àquelas automáticas, aos recibos de transporte, às confirmações de compras on-line? Pois é. A forma como as pessoas lidam com o e-mail mudou significativamente nos últimos tempos, levando os teóricos do apocalipse a vaticinar o fim da ferramenta, que perdeu espaço para mensageiros instantâneos como WhatsApp e Messenger, do Facebook. Será?
- O e-mail foi uma das principais funções de consolidação da importância da internet. Quando ela se popularizou, a ferramenta representava uma forma de comunicação rápida, sem fronteiras, quase instantânea. Mas a percepção sobre sua finalidade mudou – analisa Carlos Affonso Souza, diretor do Instituto de Tecnologia & Sociedade do Rio de Janeiro, cuja mensagem de status no WhatsApp é "melhor que e-mail".
Souza, que até o momento da entrevista, anteontem, acumulava 160.481 mensagens não lidas em sua caixa, também acha que o e-mail é considerado démodé pelas novas gerações:
- Não tendo sido apresentados à carta e ao telegrama, os mais jovens acham o e-mail uma forma de contato muito formal, demorada e protocolar.
Com a palavra, os millennials.
- Nunca troquei mensagens pessoais pelo e-mail. Para mim, é apenas um meio de comunicação de massa das empresas com seus clientes, como uma loja, que usa a ferramenta para se comunicar – diz a estudante universitária Maria Clara Piragibe, de 19 anos.
Outro fator apontado por jovens é a falta de confirmação de recebimento e visualização (os famosos tiques azuis do "zap") e até mesmo o roubo de protagonismo das redes sociais ("até para reclamar com SAC de empresa, o Twitter e o Facebook, são mais efetivos que o e-mail", avalia a aprendiz de advogada Juliana Brito, de 21 anos).
- Houve um tempo em que eu raramente checava o e-mail, mas, a partir do começo da faculdade, ele foi ganhando espaço na minha vida – conta Victor Tulli, de 19 "quase 20" anos. – É por e-mail que recebo minhas notas e falo com os professores. Mas, dificilmente, troco mensagens pessoais. Quando acesso, geralmente é para resolver um problema ou ver como está o andamento de outro.
Nem tudo está perdido para o pobre do e-mail. Ferramenta muito popular na internet de raiz, a newsletter voltou com força total. Com base em curadoria de conteúdo feita por canais dos mais diversos, assinantes encontram um nicho efetivo de comunicação em tempos de cacofonia nas redes sociais.
- As pessoas querem valorizar seu tempo on-line, e a newsletter é um recurso que entrega conteúdo relevante e com fácil acesso. Na confusão das redes sociais, em que postagem do nascimento do filho do amigo, vídeo de gato e breaking news se confundem, a newsletter parece-me um quarto silencioso onde a pessoa pode se dedicar a ler e se aprofundar sobre determinado assunto – analisa Souza.
Pioneiro na internet no Brasil (e no mundo), o sérvio-brasileiro Aleksandar Mandic não concorda com as previsões apocalípticas.
- Com o advento dos instant messengers, a coisa apenas se modificou. O e-mail hoje está posicionado para negócios – explica Mandic, que se antecipou à tendência e abriu uma empresa para e-mails corporativos em 2002. – Ninguém manda um contrato por WhatsApp e nem negocia os termos dele por Facebook. A caixa de entrada permite a organização em pastas, divisão por temas.
Para ele, é fácil localizar um e-mail de dez anos atrás, diferentemente de uma conversa de WhatsApp.
- Este novo mundo de mensagens rápidas descarregou do e-mail uma função para a qual ele não foi feito, afinal, ele é uma forma de comunicação assíncrona. Por isso, afirmo: o e-mail não vai morrer, assim como o rádio, que ainda está em alta, mesmo com o Spotify.
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"O e-mail foi uma das principais funções de consolidação da importância da internet. Quando ela se popularizou, a ferramenta representava uma forma de comunicação rápida, sem fronteiras, quase instantânea. Mas a percepção sobre sua finalidade mudou." – analisa Carlos Affonso Souza, diretor do Instituto de Tecnologia & Sociedade do Rio de Janeiro, cuja mensagem de status no WhatsApp é "melhor que e-mail".
"Quando ela (a internet) se popularizou, a ferramenta (o e-mail) representava uma forma de comunicação" bastante usada inadequadamente. "Mas a percepção sobre sua finalidade mudou" e, felizmente, parece-me que a finalidade correta conseguiu ser percebida por algumas pessoas – analisa Manuel Pinheiro Guedes, analista de sistemas durante 3,5 décadas, testemunha do uso inadequado do e-mail em seu surgimento, cuja mensagem a lhes passar – por este blog - é a seguinte: "nem melhor nem pior do que qualquer outra forma de comunicação, e-mail é apenas uma excelente opção, quando usado adequadamente".
Lembro, como se fosse hoje, de telefonemas que recebia de colegas de trabalho perguntando se eu havia visto a mensagem por eles enviada. Respondendo que eu não entrava no correio eletrônico diariamente e solicitando-lhes que revelassem o conteúdo da mensagem, espantados com o meu comportamento, eles respondiam que eu deveria ler a mensagem para saber do que se tratava. Ou seja, fascinados pela novidade, a impressão que aqueles colegas me passavam era a de quererem tornar o e-mail sua única forma de comunicação, independentemente das circunstâncias em que a comunicação se fizesse necessária e do tipo de informação que se desejasse compartilhar. Seria esse o uso adequado da nova ferramenta? No meu entender, não.
"Não tendo sido apresentados à carta e ao telegrama, os mais jovens acham o e-mail uma forma de contato muito formal, demorada e protocolar.", eis mais uma afirmação de Carlos Affonso Souza.
Será que se tivessem sido, adequadamente, apresentados à carta e ao telegrama, os mais jovens entenderiam que o e-mail e o twitter são as versões eletrônicas da carta e do telegrama, respectivamente? Vocês sabiam que o tamanho máximo das mensagens postadas no twitter (140 caracteres) é o mesmo das mensagens que eram enviadas por telegrama? Que coincidência, hein! Será que se tivessem sido, adequadamente, apresentados à carta e ao telegrama, os mais jovens entenderiam que, assim como o advento do telegrama não matou o uso da carta, (afinal, suas finalidades eram diferentes) o advento dos instant messengers não deve matar o uso do e-mail? Vocês perceberam que na reportagem há o exemplo de um jovem que diz ter passado a usar o e-mail a partir do começo da faculdade, por ser uma forma de comunicação funcional para falar com os professores? Pois é!
"Este novo mundo de mensagens rápidas descarregou do e-mail uma função para a qual ele não foi feito, afinal, ele é uma forma de comunicação assíncrona. Por isso, afirmo: o e-mail não vai morrer, assim como o rádio, que ainda está em alta, mesmo com o Spotify.", eis a afirmação de Aleksandar Mandic (pioneiro na internet no Brasil [e no mundo]) escolhida por Liv Brandão para encerrar sua reportagem. Afirmação que também escolho para encerrar esta postagem.

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