Após uma postagem encerrada com uma frase de um
personagem do filme Harry Potter e o Cálice de Fogo, este blog traz uma contendo
trechos de uma reportagem de Elaine Guerini onde são apresentadas algumas afirmações
do diretor do filme Valerian e a Cidade
dos Mil Planetas que chamaram minha atenção. A referida reportagem foi publicada
no suplemento do jornal Valor na
edição de 11 de agosto de 2017.
Super-heróis contra o cinismo
Com estilo
hollywoodiano, francês Luc Besson adapta HQ de ficção científica "Valerian"
para criticar mundo descrente de utopias.
Ser
chamado de "o mais hollywoodiano dos diretores franceses" não
incomoda Luc Besson, desde que não confundam a sua motivação por trás das
câmaras. "Se eu fosse movido apenas por dinheiro, já teria feito pelo
menos duas continuações de 'O Profissional' [1994]", diz o cineasta de 58
anos. Em vez de ceder aos pedidos para revisitar a órfã Mathilda, com Natalie
Portman adulta, o parisiense resgatou uma história em quadrinhos criada no fim
dos anos 60 para assinar o filme mais caro da história da França. Foram
consumidos cerca de US$ 180 milhões na adaptação de "Valerian e a Cidade
dos Mil Planetas,", a HQ franco-belga que povoou a imaginação de Besson na
infância.
(...) "Posso
falar do que tenho medo", diz Besson. "O que uma pessoa pode fazer
não me assusta. Tenho muito mais medo do risco de a população não fazer nada,
achando que os problemas do mundo não são dela. O povo precisa tomar as rédeas
da situação e não deixar tudo para o governo resolver."
É por essa
linha que segue o casal de protagonistas de "Valerian", que estréia
no Brasil nesta semana. Interpretados por Dane DeHaan e Cra Delevingne, eles
são agentes especiais vivendo no século XXVIII, quando diversas espécies do
universo coexistem na cidade Alpha. Para salvar os habitantes que restaram do
planeta Mül, atacado 30 anos antes, a dupla precisa enfrentar regras do
governo, investigando o que ocorreu. Há suspeitas do envolvimento dos humanos
no episódio que praticamente exterminou os pacíficos moradores de Mül.
"Nós
somos o nosso pior inimigo. Nem mesmo depois de duas guerras mundiais, a
humanidade ainda não aprendeu isso", afirma Besson, "cansado" de
ver os extraterrestres como vilões na maioria das histórias de super-heróis
levadas ao cinema. A ideia de supremacia dos EUA, que costuma ser reforçada
nesse filão de filmes, também foi rejeitada aqui. "Nada de americano
salvando o resto do mundo.". São os mais de 2,7 mil efeitos especiais que
aproximam "Valerian das superproduções de Hollywood, além de o filme ter
sido rodado em inglês.
"Apontada
como uma das inspirações de George Lucas na criação da saga de "Star Wars"
(iniciada em 1977), a HQ de "Valerian" ilustra o que Besson chama de "maior
erro da humanidade". "A pior coisa que fizemos foi colocar o dinheiro
e o lucro em primeiro lugar, deixando as pessoas em segundo. É só recordarmos a
falsa alegação de que o Iraque tinha armas de destruição em massa, o que levou
à guerra. Ninguém estava preocupado em salvar pessoas, e sim dinheiro."
"A pior coisa que
fizemos foi colocar o dinheiro e o lucro em primeiro lugar, deixando as pessoas
em segundo", diz o cineasta Luc Besson
Na visão
do cineasta, cabe aos artistas a missão de combater a mentalidade vigente, já
que a classe política não se importa. "Hoje eu faço filmes na esperança de
despertar alguma consciência entre os espectadores. Prefiro ser chamado de
ingênuo a enveredar pelo cinismo, um sentimento que está destruindo o planeta",
diz Besson, alvo de críticas por "Valerian" incluir clichês no
roteiro, como "O destino está em nossas mãos" ou "O amor é mais
poderoso que qualquer coisa".
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"Cansado
de ver os extraterrestres como vilões na maioria das histórias de super-heróis
levadas ao cinema.", o cineasta afirma que "Nós somos o nosso pior
inimigo, e que nem mesmo depois de duas guerras mundiais, a humanidade ainda
não aprendeu isso". É impressionante! Mas há certas coisas que a dita
(bendita ou maldita) espécie inteligente do universo tem uma dificuldade imensa
para aprender! Dificuldade que me faz lembrar, mais uma vez, uma frase de uma
belíssima canção da Legião Urbana que
diz: "Nos perderemos entre monstros da nossa própria criação".
"Nada
de americano salvando o resto do mundo.", diz Besson, ainda referindo-se
as histórias de super-heróis levadas ao cinema. Até porque, fora dele o que se
vê é exatamente o contrário: é americano ferrando (para não usar um verbo mais
contundente) o resto do mundo. Sim, é assim que são vistos os demais: apenas um
resto cuja finalidade de existir resume-se a contribuir para possibilitar algo
que, em um livro intitulado Pnin, o
escritor russo Vladimir Nabokov enxerga como a coisa mais cretina e
incompreensível já inventada pelo homem - o AWOL
– American Way of Life. Literalmente, modo de vida americano.
Modo de vida
mantido pelo fomento de guerras pelo mundo afora, pois, como disse o escritor americano
Nicholson Baker em uma reportagem-entrevista publicada na edição de 19-20 de
setembro de 2004 do Jornal do Commercio,
"Os EUA já foram uma nação de consertadores, de inventores, de soldadores
de fundo de quintal. Todo mundo sonhava em construir uma bicicleta melhor.
Agora nossa única grande indústria é a guerra.". Os grifos são
meus.
"O
que uma pessoa pode fazer não me assusta. Tenho muito mais medo do risco de a
população não fazer nada, achando que os problemas do mundo não são dela. O
povo precisa tomar as rédeas da situação e não deixar tudo para o governo
resolver.", diz Besson em mais uma afirmação que considero extremamente
lúcida e relevante.
A HQ de "Valerian"
ilustra o que Besson chama de "maior erro da humanidade". "A
pior coisa que fizemos foi colocar o dinheiro e o lucro em primeiro lugar,
deixando as pessoas em segundo. É só recordarmos a falsa alegação de que o
Iraque tinha armas de destruição em massa, o que levou à guerra. Ninguém estava
preocupado em salvar pessoas, e sim dinheiro.", diz Besson fazendo-me
retornar ao segundo parágrafo acima. A "falsa alegação" foi apenas um
pretexto para "levar à guerra" e consequentemente a estrondosos
lucros para a única grande indústria
americana.
"Hoje
eu faço filmes na esperança de despertar alguma consciência entre os
espectadores. Prefiro ser chamado de ingênuo a enveredar pelo cinismo, um
sentimento que está destruindo o planeta," diz Besson, alvo de críticas
por "Valerian" incluir clichês no roteiro, como "O destino está
em nossas mãos" ou "O amor é mais poderoso que qualquer coisa".
Críticas
entre as quais incluo uma que li na internet e reproduzo aqui. "O roteiro
da aventura espacial parece fruto da mente de um menino de dez anos de idade.
Um garoto do século XXI que compreende a relevância de uma personagem feminina
forte e é crítico ao consumismo e à ganância, mas não domina construção
narrativa bem o suficiente para escrever um longa-metragem satisfatório e,
apesar da mente aberta, ainda não conseguiu se desprender de algumas ideias do
século passado."
Será que a
crítica negativa mostrada acima valida algo dito pelo cineasta? Vocês
concordam que "preferir ser chamado de ingênuo a enveredar pelo cinismo"
e "enxergar o mundo com a mente de um menino de dez anos de idade"
são duas coisas que ainda podem ser associadas? Será que existe uma idade até a
qual uma criança ainda não aprendeu a ser cínica? A quem desejar pensar sobre o
assunto, sugiro a leitura das duas próximas postagens deste blog.
"Hoje
eu faço filmes na esperança de despertar alguma consciência entre os
espectadores. Prefiro ser chamado de ingênuo a enveredar pelo cinismo, um
sentimento que está destruindo o planeta," diz Luc Besson. "Hoje eu
assisto filmes na esperança de ter despertada alguma consciência pelo cineasta.
Afinal, assim como Besson, prefiro ser chamado de ingênuo a enveredar pelo
cinismo, um sentimento que está destruindo o planeta.
E
encerrando esta já longa postagem, defendendo o criticado clichê "O amor é
mais poderoso que qualquer coisa", apresentado no filme de Besson, pela
segunda vez consecutiva eu recorro a uma frase de um dos filmes de Harry
Potter. "Não tenha pena dos mortos, Harry. Tenha pena dos vivos e, acima
de tudo, de todos que vivem sem amor.", diz o professor Dumbledore em Harry Potter e as Relíquias da Morte – Parte
2.
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