terça-feira, 25 de julho de 2017

Um encontro casual

"Livros não mudam o mundo, quem muda o mundo são as pessoas. Os livros só mudam as pessoas.".
(Caio Graco [154 a.C – 121 a.C])
Inspirado pelo último parágrafo do artigo de Betty Milan apresentado na postagem anterior e pela lembrança de mais uma data comemorativa, neste Dia Nacional do Escritor a ideia escolhida para ser espalhada por este blog vem de uma história publicada na edição de 11 de novembro de 2001 do jornal O Globo em uma coluna assinada por Paulo Coelho. Intitulada Um encontro casual ela é apresentada ao lado de outra e ambas sob o título Duas histórias que poderiam ser reais.
Um encontro casual
O escritor Christopher D’Antonio caminhava deprimido pela pista de corrida do East River, na cidade de Nova York. Na realidade, sua depressão tinha atingido tal intensidade, que planejava cometer suicídio naquela mesma tarde.
Sua impressão era de que a atividade de escritor – à qual vinha se dedicando há décadas – não tinha nenhum valor real, e não fazia muita diferença. O que ele havia realmente deixado de concreto para a humanidade? Seu trabalho não havia mudado o mundo como ele sonhava.
D’Antonio resolveu passar do pensamento à ação. Subiu na grade que separa a pista das águas do East River, e ali permaneceu, com os olhos fixos na água escura, procurando reunir coragem para seu último ato.
De repente, uma voz feminina – cheia de alegria e entusiasmo – o interrompeu.
- Com licença. O senhor é o escritor D’Antonio?
Ele, com indiferença, acenou a cabeça.
- Espero não incomodá-lo – disse a moça. – Talvez esteja interrompendo um momento importante de reflexão.
- Está. O que a senhora deseja?
- Não vou tomar o seu tempo, pois sei que tem muita coisa importante para fazer. Mas simplesmente precisava lhe dizer como seus livros foram importantes na minha vida! Eles me ajudaram de uma forma incrível, e eu só queria agradecer.
D’Antonio desceu da cerca, apertou a mão da moça, e, com os olhos fixos em seus olhos, respondeu:
- Tenho que voltar para casa agora; realmente ainda há muito o que fazer, e não posso ficar aqui por mais tempo. Mas, na verdade, sou eu quem lhe diz obrigado.
Seu trabalho tinha ajudado aquela mulher; era uma maneira de mudar o mundo.
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Que história fértil para indagações e reflexões! Indagações que podem começar pelo título. Será que o referido encontro foi casual? Aliás, indo mais além, será que existem encontros casuais? E para responder tais indagações, neste momento, eu recorro à seguinte afirmação de Joseph Climber: "A vida é uma caixinha de surpresas.". E explico.
Após ter decidido publicar neste uma postagem intitulada Um encontro casual, na última sexta-feira passada, recebi, de uma ex-colega de trabalho que há muito tempo não encontro, um e-mail alusivo ao Dia Internacional do Trabalho composto, simplesmente, pela seguinte mensagem: "Não encontramos ninguém por acaso! Atravessamos o caminho uns dos outros por um motivo." É ou não é uma coincidência? O que vocês acham? E sobre a referida mensagem? O que vocês têm a dizer? Dá o que pensar, não?
Após as reflexões provocadas pelo título da história, passemos a algumas provocadas pela atitude do escritor nela citado. Deprimido pelas impressões de que a atividade de escritor não tinha valor real e de que seu trabalho não havia mudado o mundo como ele sonhava, D’Antonio planejara cometer suicídio naquela mesma tarde.
A leitura das impressões de D’Antonio, imediatamente, fez-me lembrar um conselho dado por Thomas Merton, o famoso místico cristão, numa carta enviada para um amigo. Não fique na dependência de resultados, eis o conselho. Com a intenção de elucidá-lo, segue o trecho do livro intitulado Liderança para Tempos de Incerteza – A Descoberta de um Novo Caminho de autoria de Margaret J. Wheatley onde encontrei o conselho.
"Não fique na dependência de resultados... você pode ter que encarar o fato de que seu trabalho será aparentemente inútil e sem resultados, ou que os resultados serão contrários aos esperados. Acostumando-se a essa idéia, você começa a se concentrar não nos resultados, mas no valor, na retidão, na verdade do próprio trabalho..."
Considerando que elas têm tudo a ver com o conselho de "não ficar na dependência de resultados", seguem duas frases encontradas no mesmo livro e na mesma página. A primeira, atribuída a Vaclav Havel, diz que "Não é a convicção de que alguma coisa vai se desenrolar bem, mas a certeza de que essa coisa faz sentido, seja como for que se desenrole". A segunda, feita pela autora do livro, diz que "Escolhemos nossas ações porque parecem certas, mesmo que não consigam mudar as coisas." Não ficar na dependência de resultados é o título da postagem publicada em 9 de janeiro de 2012 neste blog.
Será que se o amigo a quem Thomas Merton enviou a carta com o conselho de "Não ficar na dependência de resultados" fosse D’Antonio, sua depressão teria atingido a intensidade citada na história? No meu entender, não. E no de vocês?
Que bela história! Uma bela história com um final indagativo e reflexivo, como mostram seus quatro últimos parágrafos reproduzidos abaixo.
- Não vou tomar o seu tempo, pois sei que tem muita coisa importante para fazer. Mas simplesmente precisava lhe dizer como seus livros foram importantes na minha vida! Eles me ajudaram de uma forma incrível, e eu só queria agradecer.
D’Antonio desceu da cerca, apertou a mão da moça, e, com os olhos fixos em seus olhos, respondeu:
- Tenho que voltar para casa agora; realmente ainda há muito o que fazer, e não posso ficar aqui por mais tempo. Mas, na verdade, sou eu quem lhe diz obrigado.
Seu trabalho tinha ajudado aquela mulher; era uma maneira de mudar o mundo.
"Mas, na verdade, sou eu quem lhe diz obrigado.", diz o escritor à leitora, com os olhos fixos em seus olhos, quase no fim da história. Uma história com um final instigante! Afinal, quem deve ser grato a quem? Quem ensinou algo a alguém? E para responder a estas indagações, recorro a uma frase de Margaret J. Wheatley encontrada em seu excelente livro. "A vida nos ensina uma lição básica: nenhum ser vivo vive sozinho. Ela só se organiza em sistemas de interdependência.". Em sistemas de interdependência que fazem com que passemos a vida aprendendo uns com os outros e ensinando uns aos outros.
Sendo assim, que tal procurarmos passar pela vida ensinando aos outros alguma coisa que preste? Tanto em encontros programados quanto em encontros casuais, se é que estes existem, não é mesmo? E agradecendo a todos aqueles com quem aprendermos alguma coisa. De preferência com os olhos fixos em seus olhos, como fez o escritor ao agradecer àquela leitora. Uma leitora que grata pela ajuda que dele julgava ter recebido por meio de seus livros, naquele momento o salvara de um trágico e triste fim.
"Amai-vos uns aos outros", eis a recomendação feita por uma frase de um antigo mestre que desta dimensão partiu há 1.984 anos. "Ajudai-vos uns aos outros", eis a recomendação feita por esta paráfrase inspirada por tudo o que é dito nesta postagem.

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