sexta-feira, 29 de julho de 2016

'Aprendemos a alimentar as emoções com comida'

Após duas postagens alusivas a dias comemorativos, este blog volta a focalizar o tema da postagem que as antecedeu. E volta também às coincidências, pois o texto apresentado abaixo, coincidentemente, foi obtido no mesmo lugar de onde fora extraído o da referida postagem, quatro dias antes. Publicado na edição de 21 de junho de 2016 do jornal O Globo, no espaço intitulado Conte algo que não sei, o texto apresenta uma reportagem-entrevista onde Rachel Handley, psicoterapeuta, é a entrevistada, Lucas Moretzsohn é o entrevistador e é intitulado 'Aprendemos a alimentar as emoções com comida'.
'Aprendemos a alimentar as emoções com comida'
Especialista em compulsão alimentar esteve no Rio a convite do centro de bem-estar Rituaali, em Penedo, para apresentar programa para controle da mente
"Sou de Curitiba e moro em Las Vegas há mais de 30 anos. Comecei o curso de Serviço Social aqui e terminei lá, pela Universidade de Nevada, onde fiz também mestrado em psicoterapia. Tenho pós-graduação em dependências químicas. Sou especializada em bariatria. Há 12 anos, trabalho com obesidade e emagrecimento."
(Rachel Handley, psicoterapeuta)
Conte algo que não sei.
A maioria das pessoas é compulsiva com a alimentação, mas nem sabe disso. Com a industrialização da comida, estamos viciados em guloseimas e só quando há um problema de saúde prestamos atenção. O problema de as pessoas engordarem e se tornarem obesas não está no estômago e na boca, mas na mente. É nossa caixa de comando.
O que está por trás de uma compulsão alimentar?
A compulsão alimentar virou um vício, uma dependência da qual a pessoa não está nem ciente. Geralmente, tem a ver com as emoções. Desde o berço, aprendemos a alimentar nossas emoções com comida, mas é inconsciente. Levou um tombo, brigou com alguém, vêm logo mãe, tio, avó ou pai e dão uma bala, um chocolate. Se a gente está triste, come; estressado, entediado, come. Já tivemos muitos pacientes que chegaram a perder 150 kg com cirurgia bariátrica e, depois de quatro anos, recuperaram tudo. A mente é que precisa da cirurgia.
É mais difícil do que fechar a boca?
É muito importante a gente se conscientizar da diferença entre fome física e fome emocional. Quando alimentamos o corpo com comida, sentindo a fome emocional, causamos dois problemas: não lidamos com o sentimento e ingerimos calorias de que não precisamos. A fome física acontece três vezes por dia, geralmente, que é o tempo que leva a digestão, de quatro a cinco horas. Se almocei e depois de duas horas estou com fome, eu penso que estou com fome. Não é fome física, é fome emocional. Durante anos, até entender isso, a gente se alimenta inconscientemente e, então, vira uma compulsão. Aí é difícil mudar isso.
Mas há médicos que indicam comer há cada três horas.
Há muitos estudos nos Estados Unidos e no Brasil comprovando que isso não é saudável. Até o Conselho Nacional de Nutrição já fala veementemente que não é saudável. O argumento é simples: quem precisa de exercício físico é o seu corpo. Basicamente, o que você faz quando come a cada três horas é colocar o sistema digestório na academia, o que vai fazer o metabolismo e queimar gordura. O sistema digestório vai trabalhar dobrado.
Recomenda alguma dieta para enfrentar a compulsão?
Não, o foco do trabalho é a mente. Para dieta, há muita informação, até na internet. É uma mudança de estilo de vida: aprender a comer para viver, e não viver para comer. Para isso, lançamos a meta 80 / 20: 80% do tempo comer o que o corpo precisa para ser saudável e 20% o que desejamos. Geralmente, as pessoas fazem o contrário.
É tudo uma questão de equilíbrio?
É o tal do equilíbrio. O corpo não precisa de comidas requintadas, cheias de molho. A saúde precisa de coisas simples. Mas daí vêm nossos desejo e paladar, que estão deturpados com a industrialização da comida. O desejo alimentar não é fome física, é emocional. Estudos comprovam que quatro bocados pequenos satisfazem um desejo.
O brasileiro come bem?
Hoje você não vê o brasileiro comendo tanto arroz e feijão. São lanchinhos, congelados, comidas processadas. É o fast-food, cheio de caloria, gordura. Ninguém tem tempo de ficar cozinhando. É o que está causando obesidade no mundo. Voltar às raízes é o mais saudável. Desde o início do mundo, até cem anos atrás, o que o povo comia? O que a terra dava. Hoje, não. Tem criança que nem sabe que fruta nasce em árvore.
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"Desde o berço, aprendemos a alimentar nossas emoções com comida, mas é inconsciente.", afirma a psicoterapeuta Rachel Handley. E quando o equívoco cometido é causado por inconsciência, parar de cometê-lo passa, inevitavelmente, por reflexões feitas a partir de algo que (por algum motivo que desconhecemos) nos seja oferecido para ler ou para ouvir.

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