Conforme prometido na postagem anterior, segue
o artigo intitulado 'Time is life' de
autoria de Luiz Roberto Londres, poeta, filósofo e acima de tudo médico. Médico
autor de alguns livros dentre eles Sintomas
de uma Época: Quando o Ser Humano Se Torna um Objeto. Sugestivo, não? E de
artigos publicados em jornais e revistas dentre eles o apresentado abaixo, publicado
na edição de 26 de maio de 2003 do Jornal
do Brasil.
'Time is life'
Benjamin Franklin foi um gênio, sem a menor
sombra de dúvida. Quase todos conhecem a sua face política e sua vertente de
inventor. Mas poucos sabem das incursões dele como cientista, filósofo, músico
e economista. Foi ainda a única pessoa a assinar os quatro principais
documentos que deram base à criação dos Estados Unidos, entre eles a Declaração
de Independência e a Constituição Americana. E acredito que pouquíssimos sabem
ter sido ele o inventor do aforismo "time
is money". O ano era 1748, Franklin tinha 42 anos.
Apesar da genialidade, a afirmação de Franklin
contém uma contradição básica que ainda não vi comentada. Iguala dois membros
desiguais de uma equação. Tempo é algo inerente à existência, é nele que ela se
realiza, é nele que ela se afirma. É, portanto, um conceito fundamental que com
ela se confunde, com ela se mistura. Já dinheiro é um meio, não tem valor em
si, é uma representação de valor, volátil de acordo com fatos objetivos e
sensações absolutamente subjetivas. É útil se houver vontades e
disponibilidades. Sem estas, perde completamente o valor.
Devemos ainda nos lembrar a época em que
Franklin fez tal afirmação e o tempo que dela nos separa: 254 anos. E não
consigo imaginar qual seria sua equivalência em dinheiro. Além do mais, não
posso imaginar que Franklin quisesse fazer de tal afirmação uma regra geral;
muito provavelmente estaria querendo alertar o jovem a quem dirigiu a frase a
respeito do valor que deveria dar à ocupação do seu tempo, de modo que
revertesse materialmente em seu favor. Isso é só uma especulação, eu sei, mas
acho que faz algum sentido.
E por que tanta importância ao "time is money"? Porque, muito
mais do que no tempo de Franklin – assim também acredito -, ele se transformou
não em verdade filosófica, mas em verdade de vida. A imagem do advogado
cobrando cada minuto marcado em sua inseparável "ampulheta"
sintetiza, de forma marcante, a monetarização da vida. Variáveis existem: ouvi
dizer que a linguagem rebuscada dos cartórios - "aos onze dias do ano da
graça de..." – tem origem no tempo em que seus serviços eram cobrados por
número de palavras. Nem as prostitutas cobravam assim. Na medicina, isto também
ocorreu com a avareza crescente relativa ao tempo de consulta, com a ética e a
missão financeira se antepondo à ética e à missão médica. Pessoas passaram a
ter preços.
"Time is money", essa imagem
frankliniana, retratava o momento que ora havia nascido e já crescia e também
servia, pelo seu poder de síntese, como um mote que justificava esse sentido.
Quantos benefícios materiais ajudou a construir? Quanta dedicação às horas de
trabalho? Quantas oportunidades descobertas em ações que até então não eram
encaradas como fonte de lucro? Mas também podemos imaginar quanto da vida de
experiências de cada um foi vendida por alguns trocados ou mesmo milhões. Tenho
a convicção de que, se perguntarmos a qualquer milionário, em seu último
suspiro, o que ele mais gostaria de ter feito, sua resposta não deverá ser
surpresa para nenhum de nós. Mas...
Na realidade, o dinheiro é um grande tóxico da
atualidade, vicia sem que as pessoas se apercebam, justifica-se pela criação de
riqueza material, solapa as riquezas intangíveis, sejam elas intelectuais ou
emocionais. Mas sabemos que ninguém, nenhum governo, nenhum país, se atreverá a
"criminalizá-lo". É um excelente meio de troca, apesar de,
ultimamente, ter deixado de ser um ótimo meio de determinar valores.
Historicamente, o dinheiro determinava os valores das coisas e, na atualidade o
dinheiro determina o valor do próprio dinheiro. E, como efeito colateral
inerente à sua existência, tende a estabelecer o valor de compra e venda das
pessoas que aceitam se depreciar, pois, qualquer que seja a quantia envolvida,
sempre será menor que o preço da dignidade.
Franklin morreu há mais de 200 anos (1790).
Não creio que alguém perca tempo em saber quanto tinha, com quanto viveu, com
quanto morreu. Mas sua vida é objeto de inúmeros estudos, livros, citações. Sua
vida nada mais foi que a extensão física, psicológica e sociológica de seu
tempo de existência. Para Franklin, autor da frase "time is money", a verdade vivida foi outra: "time is life". Esta sim é uma
equação logicamente correta. Quem a souber viver, poderá um dia morrer sem se
arrepender de ter perdido o seu tempo; ou mesmo o seu dinheiro.
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Mais um belo texto extremamente provocador de reflexões!
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