Continuação de terça-feira
A Megailusão
Há ilusões que duram não só uma vida, mas
vidas e mais vidas. Esse é o caso da errônea convicção de que somos tão-somente
o corpo. Ora, nosso corpo não passa de provisório equipamento emprestado,
sujeito a adoecer e fatigar-se, e programado para envelhecer e ser descartado.
Nós, em realidade, em essência, somos o Espírito, o Ser Eterno, livre de
doença, debilidade, fadiga, decadência e extinção. Só escapamos de tão medíocre
destino quando conseguimos remover o véu e, des-iludindo-nos,
alcançamos a Verdade sobre o que Real e essencialmente somos – a Vastidão, o
Eterno, o Imortal...
Enganamo-nos também quando nós supomos ser
apenas uma persona, isto é, um ego
psicológico, superficial, transitório. Essa é a condição em que normalmente
vivemos. Na condição de egos ilusórios, sentimos, percebemos, pensamos, falamos
e agimos sempre incitados por múltiplos e inquietantes desejos, apegos e medos,
muitas vezes conflitantes; nos desgastamos ansiando por prazeres e detestando e
temendo pesares.
Autoludibriados, chegamos a dizer convictos – eu sou Fulano, quando o verdadeiro e
correto seria dizer eu estou Fulano.
Aquilo que realmente somos, isto é, o
Espírito Supremo e Imortal, que não goza nem sofre, não envelhece, não morre, e
que, segundo a Bhagavad Gita, "a água não o molha, o vento não o seca, o
sabre não o corta, o fogo não o queima"; que não se desespera nem se
deprime na perda de um parente, na falência da firma, na dependência química de
um neto, no ocaso do caso amoroso que gostosamente parecia eterno. Só
parecia... Imagine-se caminhando pelo campo. Sua sombra passa sobre pedras,
espinheiros, lamaçais, chão duro, chão macio, chão seco... Somente ela, sua
sombra. Você não. Da mesma forma, perdas, doenças, dores, decepções, alegrias,
vitórias, finalmente, tudo que provoca estresse acontece somente com sua "sombra",
isto é, com seu ego pequeno e falso. Com Você, o verdadeiro Você, não. Não
mesmo. Ao acreditarmos ser apenas o corpo e o ego, só nos resta viver
estressados. Esse é o preço que pagamos pela ilusão básica, a megailusão.
A desilusão o libertará
Um drama a que você assiste (no palco ou em um
filme) lhe exibe uma sequência de cenas e episódios emocionantes – tragédias,
júbilos, mortes, festas, velórios, etc. Fosse você um imaturo, a ponto de
identificar-se com o que se passa na tela ou no palco, embora seja tudo
fictício, choraria, gargalharia, se exaltaria, se deprimiria... Que tremendo
estresse desnecessário! Pessoas psicologicamente maduras não se deixam afetar
emocionalmente com o drama quase incessante que costumamos erroneamente
denominar "a realidade em torno
de nós".
Se quiser se manter equânime e, portanto, mais
sadio, lúcido, criativo, providencial, eficaz... comece a progressivamente
libertar-se das ilusões tão normais
nas vidas das pessoas normais. A
primeira delas é seu ego, a persona
que você tem suposto ser e tanto ama.
Des-iluda-se. Você não é esse ego, que tem
pensado ser. Não é seu corpo, nem seus pensamentos, nem suas emoções... Você,
isto é, seu verdadeiro e imortal Você, transcende tudo isso.
Aguce seu discernimento e trate de ver também
o cotidiano como uma peça de ficção, cujo personagem central é seu ego falso.
Em realidade e essência, você é o Eterno espectador, sábio, isento e tranquilo,
que apenas assiste, sem se deixar iludir, sem se envolver. Não é Você que se
arrasta no chão, é somente sua sombra. E identificar-se com sua sombra é
tremendamente perturbador e doentio.
Negar-se a se identificar com sua sombra e, ao
mesmo tempo, aperceber-se de seu Eu Real é sua melhor terapia e verdadeira
redenção. Embora dificílimo, é o melhor a fazer. E comece logo. Não importa
quanto tempo seja necessário. Indo por aí, você vai alcançar a libertação
definitiva. Você nasceu para chegar a isso.
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Não importa quanto
tempo seja necessário. (...) Você nasceu para chegar a isso; para alcançar a
libertação definitiva. (...) A desilusão o libertará, diz o Professor Hermógenes. Conhecereis
a verdade e ela vos libertará, disse um antigo mestre. Portanto, des-iluda-se, conheça
a verdade e liberte-se. Será que vale a pena refletir sobre a ideia de festejar a
des-ilusão?
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