Se a inesperada e
simultânea descoberta de duas reportagens focalizando a competição no mundo
corporativo levou-me a elaborar três postagens sobre tal tema, a esperada
chegada do dia 8 de março seria a oportunidade de quebrar essa sequência. Seria,
mas não foi. Por quê? Porque quando alguém dispõe-se a focalizar determinado
assunto sempre poderá fazê-lo à luz de uma variedade de pontos de vista. Sendo
assim, no momento em que parei para pensar em qual usaria para elaborar uma
postagem sobre o Dia Internacional da
Mulher, o primeiro que me veio à
mente foi justamente aquele que coincide com o tema daquelas três postagens: a inconveniência
da competição e a imprescindibilidade da cooperação nos relacionamentos
humanos. Relacionamentos dentre os quais o mais importante é exatamente o que
ocorre entre homens e mulheres, pois, como disse D. H. Lawrence, "o futuro
da humanidade não será decidido pelas relações entre
nações, mas pelas relações entre homens e mulheres".
Ou seja, em prol do futuro
da humanidade, a tarefa que cabe a todos e a cada um de nós é convencer aos
demais dos malefícios da competição e da imprescindibilidade da cooperação. Foi
isso o que fez a atriz britânica Emma Watson (24 anos, famosa por interpretar
Hermione Granger nos filmes da série Harry Potter) através de um discurso
inspirador proferido em 21.09.2014, na sede da ONU. Na condição de embaixadora
da boa vontade para a ONU Mulheres, cargo para o qual fora nomeada em junho daquele
ano, com aquele discurso ela fazia o lançamento da campanha HeForShe – um
movimento de solidariedade pela igualdade de gêneros que acredita que essa
causa não é um problema apenas das mulheres. Discurso do qual, com a finalidade
de diminuir o tamanho desta postagem, selecionei os trechos apresentados a
seguir.
"Hoje estamos aqui lançando a campanha HeForShe. Eu estou falando
com vocês porque precisamos de ajuda. Queremos acabar com a desigualdade de
gêneros, e para fazer isso todo mundo precisa estar envolvido. Essa é a
primeira campanha desse tipo na ONU. Precisamos mobilizar tantos homens e
garotos quanto possível para a mudança. Não queremos só falar sobre isso.
Queremos tentar e ter certeza de que é tangível.
Eu fui apontada como embaixadora da boa vontade para a ONU Mulheres há
seis meses e quanto mais eu falava sobre feminismo, mais eu me dava conta que
lutar pelos direitos das mulheres muitas vezes virou sinônimo de odiar os
homens. Se há uma coisa que eu tenho certeza é que isso tem que parar. Para
registro, feminismo, por definição é a crença de que homens e mulheres devem
ter oportunidades e direitos iguais. É a teoria da igualdade política,
econômica e social entre os sexos. (...) Mas minhas pesquisas recentes
mostraram que feminismo virou uma palavra não muito popular. Aparentemente, eu
estou entre as mulheres que são vistas como muito fortes, muito agressivas,
anti-homens, não atraentes. Por que essa palavra se tornou tão impopular?
Eu sou da Inglaterra e eu acho que é direito que me paguem o mesmo tanto
que meus colegas de trabalho do sexo masculino. Eu acho que é direito tomar
decisões sobre meu próprio corpo. Eu acho que é direito que mulheres estejam
envolvidas e me representando em políticas e decisões tomadas no meu país. Eu
acho que é direito que socialmente, eu receba o mesmo respeito que homens. Mas
infelizmente, eu posso dizer que não existe nenhum país no mundo em que todas
as mulheres possam esperar ver esses direitos. Nenhum país do mundo pode dizer
ainda que alcançou igualdade de gêneros.
(...) Em 1997, Hillary Clinton fez um famoso discurso em Pequim sobre
direitos das mulheres. Infelizmente, muito do que ela queria mudar ainda é
verdade hoje. Mas o que me impressionou foi que menos de 30% da audiência era
masculina. Como nós podemos efetivar a mudança no mundo quando apenas metade
dele é convidada a participar da conversa?
Homens, eu gostaria de usar essa oportunidade para apresentar o convite
formal. Igualdade de gêneros é seu problema também. Até hoje eu vejo o papel do
meu pai como pai ser menos válido na sociedade. Eu vi jovens homens sofrendo de
doenças, incapazes de pedirem ajuda por medo de que isso os torne menos homens
- de fato, no Reino Unido, suicídio é a maior causa de morte entre homens de
20-49 anos, superando acidentes de carro, câncer e doenças de coração. Eu vi
homens frágeis e inseguros sobre o que constitui o sucesso masculino. Homens
também não têm o benefício da igualdade.
Nós não queremos falar sobre homens sendo aprisionados pelos estereótipos
de gênero, mas eles estão. Quando eles estiverem livres, as coisas vão mudar
para as mulheres como consequência natural. Se homens não têm que ser
agressivos, mulheres não serão obrigadas a serem submissas. Se homens não têm a
necessidade de controlar, mulheres não precisarão ser controladas. Tanto homens
quando mulheres deveriam ser livres para serem sensíveis. Tanto homens e
mulheres deveriam ser livres para serem fortes.
Você pode pensar: Quem é essa menina de Harry Potter? O que ela está
fazendo na ONU? É uma boa questão e acreditem em mim, eu tenho me perguntado a
mesma coisa. Não sei se sou qualificada para estar aqui. Tudo que eu sei é que
eu me importo com esse problema e eu quero melhorar isso. E tendo visto o que
eu vi e sendo apresentada com a oportunidade, eu acho que é minha responsabilidade
dizer algo. Edmund Burke disse: "Tudo que é preciso para que as forças do
mal triunfem é que bons homens e mulheres não façam nada."
Cheia de nervos para esse discurso e em um momento de dúvida eu disse pra
mim mesma: se não eu, quem? Se não agora, quando? Se você tem as mesmas dúvidas
quando apresentado uma oportunidade, eu espero que essas palavras possam
ajudar. Porque a realidade é que se a gente não fizer nada, vai demorar 75
anos, ou até eu ter quase 100 anos antes que mulheres possam esperar receber o
mesmo tanto que os homens no trabalho.
(...) Se você acredita em igualdade, você pode ser um desses feministas que não
sabem sobre os quais eu falei mais cedo. E por isso, eu te aplaudo. Estamos
lutando, mas a boa notícia é que temos a plataforma. É chamada HeForShe. Eu
convido você a ir em frente, ser visto e se perguntar: se não eu, quem? Se não
agora, quando? Obrigada."
*************
Será que é possível
enxergar no discurso da lúcida atriz e embaixadora da ONU Mulheres uma nítida
afinidade com a crítica aos malefícios da competição e a imprescindibilidade da
prática da cooperação? Será que foi uma boa ideia aproveitar este Dia Internacional da Mulher para
espalhar o inspirador discurso de Emma Watson? Será que refletir sobre o que
nele foi dito conseguirá provocar em homens e mulheres o despertamento para a imprescindibilidade de agir em conformidade
com a afirmação de D. H. Lawrence de que "o futuro da
humanidade não será decidido pelas relações entre nações, mas pelas relações
entre homens e mulheres". Será que você aceitará o convite de Emma Watson "para
ir em frente, ser visto e se perguntar: se não eu, quem? Se não agora, quando?"
Ou, como diz a bela canção da Legião Urbana, "Será que nada vai acontecer?
Será que é tudo isso em vão?". Será que a autodenominada espécie
inteligente do Universo prosseguirá sendo uma decepção? Será que essa sequência
de "será"s lhes despertará a
vontade de refletir sobre tais questões?
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