sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Reflexões provocadas por "Pessoas estão mais ricas, mas vida hoje é mais pobre"

"Pessoas estão mais ricas, mas vida hoje é mais pobre", diz Barry Stroud, na reportagem-entrevista publicada na postagem anterior. E diz também: "As pessoas gastam tempo nenhum em reflexão. Raramente se vê pessoas sozinhas andando sem estar com fones de ouvido, telefones." Então, questionando se a falta de tempo para a reflexão pode ser considerada uma das causas do empobrecimento da vida, terminei aquela postagem, passei vinte e três dias ausente do blog e agora retorno compartilhando algumas reflexões provocadas pela leitura da reportagem. Reflexões que começam com a apresentação da primeira frase da reportagem e da afirmação de Albert Einstein que escolhi como citação da semana para ladear a postagem anterior.
"A vida virou uma carreira. As pessoas estão focadas o tempo todo no sucesso profissional. É preciso ganhar o máximo de dinheiro, ter família, casa grande – tudo junto. Consumismo, individualismo, carreirismo. A vida contemporânea, apesar dos avanços materiais, é mais pobre.", diz Barry Stroud (maio de 1935, [79 anos]).
"Não basta ensinar ao homem uma especialidade. Porque se tornará assim uma máquina utilizável e não uma personalidade. É necessário que adquira um sentimento, um senso prático daquilo que vale a pena ser compreendido, daquilo que é belo, do que é moralmente correto.", diz (Albert Einstein, [1879-1955]).
"Não basta ensinar ao homem uma especialidade", diz Einstein. "A vida virou uma carreira", diz Stroud. "É necessário que adquira um sentimento, um senso prático daquilo que vale a pena ser compreendido, daquilo que é belo, do que é moralmente correto.", diz Einstein. "Carreirismo, individualismo, consumismo. A vida contemporânea, apesar dos avanços materiais, é mais pobre.", diz Stroud. Ou seja, a vida virou algo que não basta ao homem.
"A pressão para o avanço profissional e o sucesso é profunda, principalmente na cultura americana. Sou professor em uma das melhores universidades. Ensino filosofia, área que não significa ficar rico. Mesmo meus melhores alunos são forçados a pensar neles como iniciantes de uma carreira profissional, em detrimento do verdadeiro assunto de seu estudo.", diz Stroud. E em uma comparação entre a Grécia antiga e os EUA, ele diz:
"Na Grécia, havia os que pensavam que existia uma única maneira de viver – dentro de uma forma muito racional e organizada. Os céticos, porém, diziam que alcançavam uma vida diferente daquela forma racional e ordeira. Que isso lhes dava uma certa paz e satisfação que não era atingível em outra concepção de vida – que sempre estabelece que é preciso viver assim ou assado."
"Em certo sentido, o profissionalismo na atual vida norte-americana é o oposto do ceticismo. Hoje o que vigora é o princípio de que o que se deve fazer na vida é ganhar o máximo de dinheiro."
Ou seja, pensar que existe uma única maneira de viver é algo que vem de longe, e tentar viver de forma diferente da que nos é impingida é algo que hoje parece-me mais difícil do que era na Grécia antiga. Por que digo isso? Porque se resistir ao comportamento de manada é algo contra o qual a tal da espécie inteligente do Universo jamais conseguiu se sair bem, hoje tal resistência é ainda mais débil, pois, deslumbrada com um desenvolvimento tecnológico avassalador, tal espécie tornou-se uma imensa legião de vassalos desse senhor denominado tecnologia. Um senhor que padroniza cada vez mais a maneira de viver dos que a ele se submetem docilmente. E ao iniciar este parágrafo falando sobre se sair bem, o que imediatamente me veio à cabeça é o fato de que em termos de se sair bem, a única coisa que interessa a essa deslumbrada espécie é sair bem na foto. Nossa! Viajei! Esse é um assunto para outra postagem.
Quanto aos céticos, creio que sua luta em defesa da insubmissão a qualquer tipo de padronização da maneira de viver é algo que pode visto como uma tarefa cujo grau de dificuldade esteve sempre em alta, desde a Grécia antiga até os dias de hoje.
E da excelente entrevista com o Barry Stroud uma passagem que me dá o que pensar é quando a repórter indaga: "Existe também a ideia de que o indivíduo é o único responsável pelos seus fracassos, sem considerar a situação social, econômica e política, certo?". E o filósofo responde: "Exato. Essa é a mentalidade norte-americana. É o que falam para as pessoas pobres, com baixa escolaridade, muitas vezes negros e hispânicos. Que é responsabilidade delas.
É a tal da meritocracia. Meritocracia que vai de encontro à mensagem passada por um dos mais belos textos que já li: O Programa do Senhor. Programa que se me for solicitado explicar do que se trata em apenas uma frase eu uso a seguinte: é o entendimento de que, em uma civilização que faça jus a tal denominação, a função dos melhores é atuar em prol dos piores. Ou, em outras palavras: é não entender que os piores devem ser abandonados à própria sorte, digo, ao próprio azar, como é feito pelos adeptos da meritocracia. Quem entende O Programa do Senhor jamais entenderá a defesa dessa coisa denominada meritocracia. Em 11 de novembro de 2014 publiquei neste blog uma postagem intitulada Meritocracia.
Sim, as pessoas estão cada vez mais ricas, pois a riqueza das pessoas é medida pela quantidade de bens materiais que elas possuem (ou que por eles são possuídas), mas a riqueza da vida é medida de forma diferente. O enriquecimento da vida se dá não por quantidade de bens materiais, e sim por qualidade de bens imateriais. Não por quantidade de relacionamentos que requer uma interface tecnológica, e sim pela qualidade de relacionamentos humanos face a face, ou seja, sem a necessidade de qualquer interface.
A vida virou uma carreira. Carreirismo, individualismo, consumismo. As pessoas pensam em preencher suas vidas com coisas, (...), ficar em frente à TV, falar ao celular, entrar em redes sociais. A amizade mudou. Hoje é clicar no computador. Não é mais falar, olhar e fazer coisas junto. A vida contemporânea, apesar dos avanços materiais, é mais pobre.
O parágrafo acima é uma compilação de algumas afirmações feitas por Barry Stroud em sua entrevista. No parágrafo abaixo é feita uma associação com a afirmação de Albert Einstein citada no terceiro parágrafo desta postagem.
A transformação da vida em uma carreira, como diz Stroud, é resultado da transformação em realidade do risco alertado por Einstein: ensinar ao homem apenas uma especialidade. Ensinamento que - ainda segundo Einstein - tornou o homem uma máquina utilizável e não uma personalidade; uma máquina desprovida de sentimentos nobres em relação aos seres que julga inferiores a ele, do senso prático daquilo que vale a pena ser compreendido e do que é moralmente correto.
Após um longo período sem postar, encerro estas não muito curtas reflexões convidando-os a verificarem se elas fazem algum sentido para vocês e a fazerem suas próprias reflexões, pois por acreditar que uma das causas do empobrecimento da vida seja a falta de tempo para a reflexão, obviamente, eu acredito também que encontrar tempo para refletir pode ser uma forma de enriquecer a vida. O que vocês acham?

Nenhum comentário: