terça-feira, 19 de agosto de 2014

O 7 a 1 sob o ponto de vista do mundo corporativo (II)

Continuação de quinta-feira
Mas os erros cometidos pelos dirigentes da CBF não se restringem a volta de Carlos Alberto Parreira. Em mais um erro de estratégia, mais uma volta foi promovida: a de Felipão. O motivo para mais essa? O mesmo da outra. Ter alguém que possa lhes servir de escudo contra ataques provocados por eventuais fracassos pelos quais pudessem ser acusados. Em um linguajar popular o motivo seria descrito assim: "tirar o deles da reta". Dentro de seu modo de ver as coisas, em caso de fracasso poderiam alegar algo mais ou menos assim: "Fizemos o melhor possível. Contratamos os profissionais que nos deram os dois últimos títulos mundiais." E se as condições de saúde permitissem, provavelmente, teriam trazido também o velho lobo (Mário Jorge Lobo Zagallo).
Em mais um erro do nível estratégico, a função de técnico da seleção brasileira foi entregue a alguém que, se no passado contribuíra para torná-la campeã do mundo, no presente não estava apto a repetir o feito. Alguém que discordando de Cazuza (que dizia que o tempo não pára) teria, ele sim, parado no tempo e tornara-se um profissional inadequado para protagonizar o nível tático da CBF. Será que é possível uma seleção obter êxito em uma Copa do Mundo tendo como técnico alguém que desconhece a capacidade das outras seleções que dela participam?
Em entrevista concedida ainda na primeira fase, defendendo-se de críticas pelo fraco desempenho da seleção, mesmo tendo enfrentado apenas adversários que não estavam entre os mais fortes, vosso técnico (meu ele não é) disse algo mais ou menos assim: "o que vocês não vêem é que nós enfrentamos adversários qualificados, muito melhores do que imaginávamos".
Melhores do que imaginávamos! Como assim cara pálida? De onde vieram tais adversários? De outro planeta? Talvez, pois só vindo de outro planeta seria válido alegar que sua qualidade ultrapassara a imaginação de alguém deste. Afinal, para adversários oriundos deste próprio planeta não é necessário imaginar nada, basta observá-los. Será que entre as atribuições de um técnico não está incluída a necessidade de assistir os jogos das seleções que participariam da Copa para saber como elas atuam e não ser surpreendido por elas durante a competição? Será que sem conhecer a capacidade dos adversários é possível desenvolver a melhor tática para enfrentá-los? No meu entender, não, mas na minha longa trajetória no mundo corporativo, muitas vezes vi algo semelhante. Tentar dar uma solução sem antes identificar qual é o problema é análogo a tentar vencer um adversário sem estudar o modo como ele atua.
Mas os erros do nível tático não pararam por aí. E que o pior: erros de tática afetam diretamente o nível operacional. Um dos mais criticados pelo fracasso da seleção foi o jogador Fred. A que nível pertence ele? Ao operacional. Mas será que o fato de ter fracassado na Copa não resulta do fato de sua forma de jogar ser incompatível com a tática usada pelo técnico? No meu entender, sim. E sendo assim, surge a seguinte questão: como é que um técnico convoca um jogador, declara-o seu homem de confiança e desenvolve um esquema tático que nada tem a ver com a forma de jogar desse jogador? Para responder a esta pergunta só mesmo apelando para um comentário do próprio Felipão em um vídeo que vazou (?) e no qual ele fala sobre o trágico 7 a 1. "É coisa de louco para pensar. Não entendo, pô!". E é ainda em relação à questão "como é que um técnico convoca um jogador...?" que segue o parágrafo abaixo.
Três dias após o Brasil quase ter sido eliminado pelo Chile, durante um encontro com seis jornalistas na Granja Comary, Felipão confessou que, se pudesse, trocaria um jogador entre os convocados para a Copa do Mundo. Qual seria esse jogador, até hoje, não sei quem é, mas o fato de admitir ter errado na convocação é algo bastante chocante. Considerando a quantidade de jogadores que nascem neste país e devido a sua qualidade é exportada para as principais ligas futebolísticas do planeta, a probabilidade de o Brasil ter uma equipe capaz de conquistar qualquer título que disputar é muito grande. Afinal, mão de obra, ou melhor, pé de obra é o que não falta a um técnico da seleção brasileira.
Portanto, sendo uma seleção, o que tem faltado (e não é de hoje) é um técnico capaz de selecionar melhor os jogadores e, mais importante do que isso, saber transformar o grupo selecionado em uma equipe capaz de atuar segundo esquemas táticos desenvolvidos em função dessa equipe e dos adversários que vier a enfrentar. Foi isso o que se pôde ver por parte de alguns técnicos de seleções menos aquinhoadas com jogadores de qualidade superior, e que, há algum tempo, não se vê na seleção brasileira.
Em 1997, após um jogo amistoso em que a Noruega venceu o Brasil por 4 a 1, o técnico da seleção norueguesa disse algo mais ou menos assim: "Se eu dispusesse dos jogadores de que dispõe o técnico da seleção brasileira dificilmente eu perderia alguma coisa que disputasse.". O jogo fazia parte da preparação do Brasil para a Copa de 1998 e a declaração fora provocada por um comentário do técnico da seleção brasileira (Zagallo) que reclamara por ter que jogar com equipes inexpressivas como a Noruega.
No ano seguinte, na Copa do Mundo, o destino colocou Brasil e Noruega no mesmo grupo, o que levaria a um novo confronto entre eles. Em um jogo que, dessa vez, não seria por escolha de adversários inexpressivos para amistosos, e sim uma partida válida pela primeira fase da Copa. Antes de tal jogo, o velho lobo, que detestara a declaração feita pelo técnico norueguês no ano anterior, afirmou que após o novo confronto aquele falastrão teria que engolir a declaração que fizera. O resultado da nova partida? Para aqueles que não sabem (e também para os que sabem): 2 a 1 para a Noruega. Ou seja, mais uma derrota diante daquela equipe inexpressiva. Será que o falastrão era o técnico norueguês? Será que é correta a declaração do técnico norueguês de que embora tendo a sua disposição os melhores jogadores do mundo o técnico da seleção brasileira não conseguia montar a melhor equipe? Por que tal coisa acontece?
Porque de nada adiante ter o que há de melhor no nível operacional, se o nível tático não souber como dele tirar o melhor proveito. Não saber como tirar o melhor proveito do nível operacional ao seu dispor é mais uma das lamentáveis coisas que vivenciei durante a minha longa trajetória profissional no mundo corporativo.
Em cumprimento a promessa de apresentar considerações sobre o 7 a 1 diante da Alemanha e analogias entre futebol e mundo corporativo, feita no penúltimo parágrafo de "O que é a Copa do Mundo de Futebol?", até aqui, foram apresentadas analogias entre futebol e dois (estratégico e tático) dos três níveis segundo os quais são estruturadas as corporações. Sendo assim, o que falta é a analogia entre futebol e o terceiro desses níveis: o operacional. Analogia que será o assunto da próxima postagem. Postagem que ainda não redigi e que espero que seja a última sobre o tema "O 7 a 1 sob o ponto de vista do mundo corporativo". Se, será ou não, depende do tamanho que ela atingir.
Continua na próxima sexta-feira

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