Após ter participado de 35 anos e 9 meses dos,
até então, 57 anos da Petrobras, em outubro de 2010, aposentei-me das
atividades que desenvolvia naquela importantíssima companhia. Por entender que
aposentadoria significa afastar-se das atividades que se desempenhava, mas não de
ex-colegas de trabalho que, por serem especiais, tornam-se eternos amigos, desde
aquela época mantenho a saudável prática de participar de almoços de
confraternização com os amigos que deixei na empresa.
Sendo assim, no dia 3
de outubro deste ano, dirigi-me ao Edifício Sede da Petrobras (EDISE), local
marcado para o encontro com os amigos com quem almoçaria ainda como comemoração
do meu aniversário que ocorrera em setembro. Foi então que, à medida que me
aproximava do EDISE, passei a ver uma quantidade crescente de pessoas trajando
uma camisa alusiva aos 60 anos da Petrobras, e, imediatamente, me veio à cabeça
o seguinte pensamento: Será que eles não entendem que "vestir a camisa" é uma
expressão que simboliza o empenho por uma causa e não algo a se fazer
literalmente. Sim, o que aquelas pessoas estavam fazendo era, literalmente,
vestir uma camisa que lhes fora ofertada por indivíduos que, na condição de
dirigentes da empresa, por mais incrível que pareça, agem segundo comportamentos
que em nada demonstram que eles "vestem a camisa" da empresa que dirigem.
Pelo que eu disse no
primeiro parágrafo, creio que seja fácil perceber que participei dos 30, dos 40
e dos 50 anos da Petrobras, mas em nenhuma das três datas recebi uma camisa
para vestir, embora na época das duas primeiras (em 1983 e em 1993) ainda existisse,
por parte de funcionários e de dirigentes, um forte sentimento de que o destino
da Petrobras estava diretamente ligado à garra com que eles "vestissem a
camisa" da companhia e atuassem em prol do desenvolvimento daquela empresa
que fora criada com a intenção de prover a energia imprescindível ao
desenvolvimento do País e a preservação de sua soberania. Mas a partir de
meados dos anos 1990, as coisas começaram a mudar, e eu explico.
A partir do momento em
que leiloeiros passaram a governar (sic) este País, toda e qualquer riqueza com
a qual ele tenha sido aquinhoado pela natureza passou a ser vendida ao capital
estrangeiro sob a forma de leilão das empresas responsáveis pelo uso de tais riquezas
em prol do desenvolvimento deste País e do bem-estar de seu povo. E foi em
conformidade com esse lesivo processo que, por não ter conseguido leiloar a
Petrobras (devido a manifestações provocadas pelos mais conscientes), em 2000, quando
a empresa tinha 47 anos, durante o segundo mandato de um presidente
identificado por uma sigla, o governo tentou alterar o nome da empresa para
Petrobrax, sob o argumento de adequá-lo ao mercado internacional. Afinal, quem deseja
vender algo precisa adequá-lo ao mercado não é mesmo? Algumas manifestações
contrárias ocorreram e tal alteração não teve êxito, mas mesmo assim, ainda
naquele ano, aquele governo que comprara um segundo mandato começaria a vender
a Petrobras usando o método Jack (vamos por partes).
Com a bandeira do
Brasil e um banner da Petrobras, na fachada da Bolsa de Valores de Nova Iorque,
por ocasião da cerimônia de início da oferta das ações, em 24 de setembro de 2000, a Petrobras realizou
a maior oferta de ações já ocorrida no mundo. Oferta feita também na BM&F
Bovespa.
Ou seja, desde o ano
2000 (quando estava com 47 anos), a Petrobras não é mais uma empresa totalmente
nacional, mas uma empresa que pertence, em mais de 40%, a capitais privados
nacionais e estrangeiros, que irão lucrar, e muito, com o petróleo que embora
esteja localizado neste País, a ele pertence cada vez menos, pois a entrega do
petróleo brasileiro, que começara em 2000 por meio da maior oferta de ações já
ocorrida no mundo, hoje prossegue por meio de leilões de campos petrolíferos. Portanto,
de uma empresa cuja nobre finalidade era prover a energia imprescindível ao
desenvolvimento do País, a Petrobras tornou-se apenas mais uma empresa cuja
finalidade é proporcionar lucro cada vez maior aos seus acionistas. Acionistas
que em defesa de seus mesquinhos interesses propagam a criminosa ideia de que
algo que sendo energia significa soberania não passa de uma simples commodity.
E ao falar da maior
oferta de ações já ocorrida no mundo, eu volto a lembrar de uma afirmação de
Woodrow Wilson, um antigo presidente norte-americano:
"Ouve-se falar de concessões feitas pela América Latina ao capital estrangeiro, mas não de concessões feitas pelos Estados Unidos ao capital de outros países. É que nós não fazemos concessões. Um país é possuído e dominado pelo capital que nele se tenha investido."
Portanto, no meu
entender, desde os seus 47 anos, a camisa da Petrobras tornou-se algo
semelhante às camisas de clubes de futebol. Ou seja, uma camisa usada para
atrair empresas interessadas em explorar as vantagens de associar-se a ela
(Petrobras) e vestida por profissionais que (em sua maioria) diante de uma proposta financeira
que lhes seja vantajosa trocam-na por outra, sem a menor demonstração de amor à camisa, nem o menor pudor. Acredito que
ainda existem, e sempre existirão, indivíduos decentes que contrariam e
continuarão contrariando tudo o que foi dito até aqui, mas, infelizmente, o
grupo formado por esses decresce a cada dia.
Em 24 de setembro de
2000, conforme citado acima, quando estava com 47 anos, a Petrobras entregou mais de 40% das ações a capitais privados nacionais e estrangeiros. Em 3 de
outubro de 2013, a
Petrobras completou 60 anos, e 18
dias depois ela entregou ao capital estrangeiro 60% do maior campo petrolífero descoberto no planeta nos últimos 20
anos. Algum de vocês arrisca-se a dizer qual será o percentual entregue pela Petrobras
quando completar 100 anos? Aliás, será que a Petrobras chegará aos 100 anos?
Diante do que foi dito acima, creio que não e encerro esta postagem lhes
deixando algumas questões:
Será que faz sentido
comemorar os 60 anos da Petrobras? Será que, embora o nome não tenha sido
alterado, hoje, a empresa não está mais para Petrobrax do que Petrobras? Ou
seja, será que em vez de 60 anos da Petrobras, 03 de outubro de 2013 não representa
13 anos da Petrobrax? Será que em 2023 assistiremos à encenação de "vestir
camisas" alusivas aos 70 anos da Petrobras? A quantidade de "Será?"! me faz lembrar uma antiga
música da Legião Urbana da qual selecionei
três passagens:
Será só imaginação? Será que nada vai acontecer? Será que
vamos ter que responder pelos erros a mais, eu e você? Não, não creio que
seja só imaginação, nem que nada vá acontecer. Creio sim que sempre teremos que
responder pelos erros. E neste caso um dos erros é não acreditar em mais uma
das afirmações de Woodrow Wilson:
"A nação que possui petróleo em seu subsolo e o entrega a outro país para explorar, não zela pelo seu futuro."
Será que Woodrow
Wilson era um tolo? Ou será que os tolos somos nós?
Um comentário:
Poxa, foi bom você relembrar esses fatos que ocorreram em 2000, muita gente que não trabalha na Petrobras não se lembra e nem se dá conta disso.
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