quarta-feira, 27 de março de 2013

Para fazer mais, é preciso fazer menos

Acreditando que coincidências não devem ser desperdiçadas, segue um texto que encontrei logo após a publicação da postagem anterior. Assim como aquele, este também foi publicado no The New York Times e reproduzido na Folha de S.Paulo. Ele é de autoria de Peter Catapano e a publicação na Folha ocorreu em 18.03.2013.
Para fazer mais, é preciso fazer menos
O sábio chinês Lao-tse escreveu há 2.500 anos: "Aquele que se apega ao trabalho não cria nada que perdure. Se quiser viver segundo o Tao, faça seu trabalho e depois se afaste dele." Mas isso é mais fácil de dizer do que fazer. Os chineses da antiguidade não tinham a internet nem as atualizações instantâneas das bolsas de valores.
Considere a história de Erin Callan, que era executiva-financeira-chefe da Lehman Brothers na época em que a empresa desabou, em 2008. Callan escreveu no "New York Times" que sua dedicação incansável e as horas incontáveis que passava no trabalho a deixaram praticamente sem vida pessoal, com um casamento que não demoraria a ir por água abaixo. "Quando deixei meu emprego, isso me deixou arrasada", escreveu. "Eu não sabia valorizar quem eu era, em oposição ao que eu fazia."
Callan e muitas outras pessoas como ela talvez se sintam reconfortadas com descobertas que indicam que a maneira mais eficiente de realizar coisas talvez seja passar mais tempo fazendo menos. "A renovação estratégica - que inclui fazer exercícios físicos durante o dia, tirar sonecas curtas à tarde, passar mais horas dormindo, passar mais tempo longe do escritório e tirar férias mais longas e frequentes - resulta em melhorias na produtividade, na performance no trabalho e, é claro, na saúde", escreveu no "NYT" o consultor de administração do tempo Tony Schwartz.
Parece contraintuitivo. Impérios foram erguidos sobre a ideia de que "mais é mais", correto? O lema de que "menos é mais" não seria próprio de arquitetos minimalistas e pessoas preguiçosas? Schwartz e muitos outros discordam. O consultor observa que trabalhar demais, algo que frequentemente tem como consequência dormir de menos, prejudica não apenas os profissionais, mas também as empresas para as quais eles trabalham. Um estudo recente da Universidade Harvard concluiu que trabalhadores que não dormem o suficiente custam a empresas americanas US$ 63,2 bilhões por ano em produtividade perdida. Outro estudo concluiu que sonecas aumentam a produtividade no trabalho. Ainda outro estudo, este da Universidade Florida State, constatou que as pessoas de performance mais alta - atores, atletas e músicos de elite - tendem a trabalhar melhor em períodos de 90 minutos, raramente mais que três vezes por dia, separados por intervalos regulares. O dia de trabalho de 12 horas ininterruptas diárias não é uma opção sensata.
Os atletas de alto nível, cujos corpos precisam de longos períodos de descanso, sabem disso há muito tempo. Mas essa máxima não se aplica apenas a eles. Um estudo feito com três grupos de mulheres na faixa dos 60 aos 74 anos de idade que se exercitavam respectivamente duas, quatro e seis vezes por semana constatou que mulheres dos três grupos tiveram quase os mesmos benefícios físicos, mas aquelas que se exercitavam seis vezes por semana sofreram mais fadiga e eram menos ativas de maneira geral.
Tudo isso soa como lições da era moderna, mas não é de hoje que são lançados avisos contra o excesso de atividade.
Erin Callan parece ter enxergado a luz taoista: "Eu não precisava ficar atenta ao meu BlackBerry de manhã até a última hora da noite. Não precisava fazer a maioria de minhas refeições à mesa do trabalho. Não precisava varar a noite num avião para uma reunião na Europa no dia do meu aniversário. Hoje acredito que eu poderia ter chegado a uma posição semelhante tendo uma versão um pouco melhor de uma vida pessoal. Não sem sacrifícios, mas com um pouco mais de harmonia."
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"Aquele que se apega ao trabalho não cria nada que perdure. Se quiser viver segundo o Tao, faça seu trabalho e depois se afaste dele.", escreveu o sábio chinês Lao-Tse há 2.500 anos. "Mas isso é mais fácil de dizer do que fazer. Os chineses da antiguidade não tinham a internet nem as atualizações instantâneas das bolsas de valores.", escreveu Peter Catapano há alguns dias. E os dois escritos me fazem lembrar um terceiro. É a seguinte passagem do livro O Ato da Vontade, de Roberto Assagioli.
"Se um homem de uma civilização anterior à nossa – um grego da Antiguidade, digamos, ou um romano – aparecesse de súbito entre os seres humanos do presente, suas primeiras impressões o levariam a considerá-los uma raça de mágicos, de semideuses. Mas fosse um Platão ou um Marco Aurélio e se recusasse a ficar deslumbrado ante as maravilhas materiais criadas pela tecnologia avançada e examinasse a condição humana com mais cuidado, suas primeiras impressões dariam lugar a uma grande consternação.
Notaria logo que o homem, não obstante o imponente grau de domínio sobre a natureza, possui um controle muito limitado sobre o seu interior. (...) Verificaria que esse pretenso semideus que controla grandes forças elétricas com o mover de um dedo e inunda o ar de sons e imagens para divertimento de milhões de pessoas – é incapaz de lidar com as próprias emoções, impulsos e desejos."
Elaborando um parágrafo a partir das palavras de Roberto Assagioli e de Peter Catapano, digo o seguinte: Se um chinês da antiguidade aparecesse de súbito entre os seres humanos do presente, sua primeira reação seria tornar-se um aficionado pela internet e pelas redes sociais. Mas fosse um Lao-Tse e se recusasse a ficar deslumbrado ante a estupenda evolução tecnológica alcançada por esta civilização (sic) e examinasse a condição humana com mais cuidado, suas primeiras impressões dariam lugar a uma grande consternação. Notaria logo que diante da necessidade de evoluir em várias dimensões, o homem decidiu evoluir unicamente na dimensão tecnológica e deixar de lado a humana.
E ao agir assim o homem valida a seguinte afirmação de Albert Einstein: "Temo o dia em que a tecnologia se sobreponha à humanidade. Então o mundo terá uma geração de idiotas." Uma geração que não percebe que a parafernália tecnológica que a rodeia leva-a a trabalhar cada vez mais para produzir cada vez menos algo que preste. Uma geração incapaz de notar que para fazer mais (coisas que prestem), é preciso fazer menos.

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