Em conformidade com a ideia de sequenciar postagens que tenham alguma afinidade, segue mais uma que
focaliza a incapacidade de conviver demonstrada por uma imensa quantidade de integrantes dessa que se
autodenomina a espécie inteligente do Universo. A postagem apresenta um artigo da psicóloga e escritora Rosely Sayão publicado na edição de 5 de abril de 2011 do jornal Folha de S.Paulo, em um tablóide intitulado Equilíbrio. Leiam e verifiquem se ele tem alguma coisa a ver com a questão da formação ética e moral que norteia a entrevista de Yves de La Taille apresentada nas postagens mais recentes deste blog.
Condomínios bárbaros
Para muitas famílias, área de lazer é quesito essencial na hora de decidir onde vão morar
O estilo de vida urbano que adotamos produziu
uma geração de crianças que só consegue viver fechada em um local, seja ele
móvel ou imóvel. Essas crianças são chamadas de "geração indoor" e, certamente, pagam
algum preço por isso.
Por sua vez, esse fato produziu um boom de
construções de prédios e casas com áreas de lazer enormes e ricas em recursos.
A área de lazer, então, é considerada um
quesito da maior importância por muitas famílias, na hora de tomar a decisão e
escolher a casa ou o apartamento em que vão morar.
Aliás, hoje, um sonho de muitas famílias é
residir em um desses já chamados de condomínios-clube.
Recebi duas mensagens interessantes a esse
respeito e que se complementam. A primeira é de uma mulher que tem dois filhos,
de seis e nove anos. Para que eles pudessem desfrutar melhor a infância, ela se
mudou para uma cidade vizinha a São Paulo e passou a morar em uma casa de
condomínio.
Segundo essa mãe, essa decisão melhorou radicalmente
a vida das crianças. Há cerca de três anos, elas brincam no quintal ou na área
comum sem medo e com autonomia.
Já os pais, esses vivem em clima de maior
segurança e, por isso, não colocam muitas restrições na vida das crianças. A
vida familiar ficou melhor, na visão dessa nossa leitora, em consequência dessa
decisão que a família teve condição de tomar.
Já a segunda mensagem veio também de um
morador de condomínio de apartamentos. Ele ocupa o cargo de síndico e nos
escreveu para pedir socorro.
Imagine, caro leitor: o maior problema que
esse leitor enfrenta em sua gestão são as crianças.
Segundo ele, quando elas estão na área comum
de lazer para crianças, comportam-se como "pequenos bárbaros". Trocam chutes,
pontapés e socos por qualquer motivo, os maiores provocam os menores...
Quando interpeladas pelo zelador por causa do
mau uso que fazem do patrimônio comum, essas crianças respondem de modo
insolente, arrogante e grosseiro. Usam palavrões pesados quando se referem aos
idosos que chamam sua atenção etc.
Já os pais dessas crianças – ainda segundo o
nosso leitor, que tem um humor ácido – agem como os "grandes bárbaros" que de
fato são. Eles costumam tirar satisfação com pais de colegas que brigam com
seus filhos e, nestas conversas, ameaçam voltar para dar murros na cara dos
vizinhos caso o evento se repita; chamam a atenção de funcionários que
interpelaram seus filhos e sempre garantem que a história foi diferente da
relatada já que, para eles, seus filhos nunca mentem.
E é assim, pouco a pouco e sutilmente, que os
condomínios horizontais e verticais, criados para se tornarem pequenos oásis
urbanos, passam a se transformar em locais onde pequenas e grandes batalhas são
travadas diariamente.
Impossível não lembrar da obra de William
Golding intitulada “O Senhor das Moscas”, que inspirou um filme com o mesmo
título.
O livro conta a história de um grupo de
crianças e adolescentes sobreviventes de um acidente que, sem a presença de
pessoas adultas, experimenta construir uma comunidade.
O enredo mostra como aquilo que no início
parecia ser um paraíso logo se transforma em um pesadelo para todas as
crianças.
A semelhança com o que tem ocorrido nos
condomínios é exatamente a ausência dos adultos na supervisão do convívio entre
os mais novos, o que gera consequências parecidas com as apontadas na história
também.
Sem o acompanhamento de adultos que tenham
autoridade delegada pelos pais das crianças, não há regras que consigam
administrar essas questões nos condomínios, portanto.
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