quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Reflexões provocadas por "Condomínios bárbaros"

"E é assim, pouco a pouco e sutilmente, que os condomínios horizontais e verticais, criados para se tornarem pequenos oásis urbanos, passam a se transformar em locais onde pequenas e grandes batalhas são travadas diariamente."
O parágrafo acima (copiado de Condomínios bárbaros) mostra uma consequência de uma lamentável prática da maioria dos integrantes desta insana sociedade: o gosto pela aplicação de pseudo soluções. Sendo assim, diante das crescentes ondas de insegurança e de violência, quem possui melhores condições financeiras refugia-se em condomínios fechados onde imagina estar a salvo de tais males. E de tal imaginação resulta o relaxamento de sua atuação na educação dos filhos. Afinal, vivendo isolados da parte malvada da sociedade (aquela que ficou fora de seu paraíso fechado) eles podem crescer livres, leves e soltos. Soltos para que "quando estiverem na área comum de lazer para crianças, comportem-se como 'pequenos bárbaros'. Troquem chutes, pontapés e socos por qualquer motivo, os maiores provoquem os menores..."
"Pai, perdoai-os ... eles não sabem o que fazem". E muito menos o que fazem os seus bárbaros filhos. "Pequenos bárbaros" cujas barbaridades são apoiadas pelos "grandes bárbaros que costumam tirar satisfação com pais de colegas que brigam com seus filhos e, nestas conversas, ameaçam voltar para dar murros na cara dos vizinhos caso o evento se repita; chamam a atenção de funcionários que interpelaram seus filhos e sempre garantem que a história foi diferente da relatada já que, para eles, seus filhos nunca mentem". Quanta barbaridade! E pensar que o pretexto para morar em um condomínio fechado é, justamente, a ideia de que lá não existe violência.
Mas o pior é que a fuga da violência que ocorre fora do perímetro dos "pacíficos" condomínios fechados implica justamente no aumento de tal violência. Leiam o que diz José Armênio Brito Cruz, presidente do departamento paulista do IAB (Instituto de Arquitetos do Brasil), em uma entrevista publicada na edição de 4 de junho de 2012 do jornal Folha de S.Paulo, intitulada Integrar as pessoas da cidade coíbe a violência, e assinada por Evandro Spinelli.
"Houve um tempo em que condomínios fechados eram moda, e agora há uma discussão de que devem voltar a se integrar à sociedade.
O condomínio fechado é uma privatização do espaço. Isso, para a cidade, não é bom, porque, a partir do momento em que você diz que aqui só entra quem é dono, está dizendo que milhões de pessoas estão ficando fora. Talvez esse milhão de pessoas não fique muito contente.
Teses na USP já evidenciaram que, ao mesmo tempo em que cresceram os condomínios fechados, a violência também cresceu.
A segregação, tecnicamente, aumenta a violência. Seja a segregação do rico no condomínio, seja a reprodução disso nas camadas mais pobres. A integração é contra a violência."
Diante da quantidade de vezes em que é oportuna a sua citação, já pensei em usar como rodapé das minhas postagens aquela famosa afirmação de Albert Einstein: "Existem apenas duas coisas infinitas – o Universo e a estupidez humana. E não tenho tanta certeza quanto ao Universo". Creio que ela explique as duas atitudes usadas pela maioria quando se depara com algum problema: a aplicação de pseudo soluções ou a fuga. Problemas criados pela própria sociedade e dois quais seus integrantes teimam em fugir, em vez de enfrentá-los e solucioná-los. Gosto muito da seguinte afirmação do escritor e ativista americano James Baldwin: "Nem tudo que se enfrenta pode ser modificado, mas nada pode ser modificado até que seja enfrentado".
Ignorar a afirmação de Baldwin é mais uma demonstração de estupidez, pois os problemas dos quais mais fugimos na vida insistem em vir ao nosso encontro até que nós acabemos com eles (dando-lhes uma verdadeira solução) ou que eles acabem conosco.
Fala-se muito em inclusão social, mas, infelizmente, o que aqueles que dispõem de melhores condições financeiras desejam é a exclusão. Por arrogância ou indiferença em relação aos que eles julgam inferiores, em vez de integração o que eles desejam é segregação. O que eles querem é viver em seu "mundo particular" sem dar a mínina atenção para a construção de um mundo melhor para todos. Infelizmente, vivemos em uma sociedade onde o que a maioria dos financeiramente superiores deseja é distanciar-se daqueles que não estejam no "seu nível".
Então, o que faz tal maioria? Financia a compra de uma moradia em um condomínio fechado onde imagina poder viver a salvo do que há de ruim nesta sociedade, da qual ela, equivocadamente, julga-se a parte nobre. Ao confundir condições financeiras superiores com sentimentos superiores, ela acaba vítima de si mesma, pois é incapaz de reconhecer as qualidades negativas que possui, mas que sempre vêem à tona nas interações em que se envolve. Foi o que ocorreu no caso citado por Rosely Sayão em seu artigo Condomínios bárbaros.
Portanto, creio que pouco ou nada adiante morar em um lugar afastado daqueles que classificamos como bárbaros se a tendência para a barbárie ainda estiver dentro da pessoa, pois dela mesma ela jamais conseguirá se distanciar.
"Sem o acompanhamento de adultos que tenham autoridade delegada pelos pais das crianças, não há regras que consigam administrar essas questões nos condomínios", é a afirmação que encerra o artigo de Rosely Sayão. E com o parágrafo abaixo eu encerro esta postagem.
Sem os pais compreenderem que mais do que mudar para um condomínio fechado é preciso mudar sua mente para que ela esteja aberta para a percepção da importância da formação ética e moral de seus filhos, esses condomínios-clube que eles julgam ser o lugar ideal para que "os filhos desfrutem melhor a infância", nada mais são do que um ambiente onde (por receberem uma autonomia maior do que aquela com a qual são capazes de lidar) eles terão as condições ideais para desenvolver a barbárie que trazem dentro de si e que esta insana sociedade competitiva estimula a externar.

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