quarta-feira, 2 de maio de 2012

O que é vencer na vida?

Conforme prometido na postagem anterior, segue um texto que considero bastante propício para reflexões sobre o que seja vencer na vida e ser bem-sucedido. O texto é do livro Confissões de um homem sinceroA Glória e a Miséria dos Relacionamentos de Fabio Hernandez.
Velhos amigos
Éramos inseparáveis na escola de jornalismo. Ele, um obcecado por fazer tudo o melhor possível; eu, com a tranqüilidade preguiçosa de alunos sem grande ambição. Paulo e Fabio. Em comum algumas coisas, como a paixão pelo Corinthians, os romances de Graham Greene e os solos de guitarra suavemente minimalistas de George Harrison. O tempo se incumbiria de dar a nós dois o destino que cada um começou a construir lá para trás.
Paulo é o que comumente se define um jornalista de sucesso. Primeiro repórter, depois editor, depois diretor de revista. Minha carreira foi menos variada. Primeiro um escritor barato, depois um escritor barato. Sempre um escritor barato.
A vida nos afastou. (A vida sempre afasta os amigos da juventude. A vida é cruel como um cossaco russo nesse trabalho de afastamento dos amigos.) Ficamos anos sem nos ver. Deixei pelo telefone, duas ou três vezes, recado com sua secretária. Não recebi retorno. Entendi: pessoas em alta posição nunca têm tempo para nada, ao contrário de vagabundos como eu, para os quais os minutos fluem vagarosos como a água de um riacho. Até que um dia nos encontramos por acaso numa fila de cinema. Tínhamos ambos ido ver A Mulher do Lado, de Truffaut. (Não pus, por engano, esse filme perturbador na lista de nossas paixões comuns. Agora corrijo o erro). Como falávamos desse filme em nossos dias de jovens, como elucubrávamos, como discutíamos cada cena.
Ver meu amigo bem-sucedido na fila de A Mulher do Lado me levou imediatamente a uma constatação. Sim, ele vestia um blazer que me pareceu Armani, e imagino que fosse Rolex o relógio que tinha no pulso esquerdo. Mas, na alma, não mudara tanto assim. Estávamos ambos sozinhos. A Mulher do Lado era e é um filme sagrado para nós. E filmes sagrados, dizíamos ele e eu em nossos dias de jovens, exigem que você os veja sozinho. Para se concentrar inteiramente. No máximo, a companhia de um saco de pipocas. Nada mais.
Parecia piada
Combinamos tomar um lanche na saída. Nada muito demorado. No dia seguinte, meu amigo tinha uma reunião bem cedo. Fomos ao Hamburguinho, outra de nossas obsessões comuns que me esqueci de listar. Miramos em silêncio respeitoso o quadro Boulevard of Broken Dreams, sobre o qual tanto falávamos lá para trás. Na melancólica lanchonete retratada no quadro parecíamos reencontrar um pouco da juventude para sempre perdida. “Sempre invejei você”, Paulo me disse.
Pensei que fosse piada. “Invejou o quê? Minha desimportância? Desde quando escritores fracassados despertam inveja? Eu imaginava uma estante repleta de livros escritos por mim. Um novo Dostoievski. Um novo Fitzgerald. E acabei como um colunista de assuntos sentimentais. Com dinheiro contado para comer este sanduíche”. Ele suspirou. “Você não foi apanhado pela gaiola em que me meti. Você é dono de você. Há muito tempo eu deixei de ser dono de mim. É o preço que ambiciosos como eu pagam”.
Eu disse: “E quem não paga? Só não paga quem não pode”. Ele deu uma risada irônica. E olhou para algum lugar que era bem longe dali. “Meu pai. Meu pai não pagou”. O pai morto era uma dor constante para meu amigo. “Foi o maior homem que conheci. O maior jornalista. Fui bem mais longe na carreira que ele. Muitas vezes me perguntei por quê. Outro dia finalmente entendi. Fui adiante não porque fosse melhor que ele, mas porque sou pior. Eu paguei o preço que meu pai recusou pagar”.
Era hora de ir embora. Antes de nos despedirmos, para talvez nunca mais nos encontrarmos. Paulo me disse: “Leio você, sabe? Acho que me realizei em você. Um escritor barato. Era isso que eu queria ser. Barato e livre. Mas não tive a coragem de recusar o que as pessoas chamam de sucesso”. E então meu amigo foi em seu carro importado rumo a sua cobertura, a seu sucesso dolorido e a seu sentimento de orfandade e desamparo. Eu apanhei um táxi no ponto e no trajeto pensei que o sucesso é mesmo uma coisa muito engraçada.
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Fabio Hernandez acha que o sucesso é uma coisa muito engraçada. Eu o acho uma coisa muito intrigante. E vocês o que acham? Vejo muito sentido no texto de Fabio Hernandez e na próxima postagem publicarei as minhas reflexões provocadas por ele. Aguardo as de vocês que poderão ser publicadas usando o recurso do comentário, enviadas por e-mail para lendoeopinando@gmail.com, e até provocar postagens.

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