quinta-feira, 21 de julho de 2011

A essencial arte de parar

A essencial arte de parar é o título de um livro de David Kundtz que tem muito a ver com Todos os dias precisam de nadismo. Em conformidade com a intenção de não espantar leitores de pouco fôlego, montei um texto com trechos selecionados do capítulo Não fazer nada. Esta postagem reforça a ideia espalhada pela anterior.
Não fazer nada
Eu levo uma vida muito cheia e atarefada, e de vez em quando me perguntam:
- Scotty, como é que você consegue fazer tudo o que faz?
A melhor resposta que posso dar é:
- Passando pelo menos duas horas por dia sem fazer nada
(M. Scott Peck)
A primeira vez que tomei consciência do processo de Parar, eu estava me escondendo. Estava fugindo e me sentia perdido. Estava tentando descobrir o que fazer da minha vida e não sabia realmente o que estava acontecendo comigo, nem como tudo aquilo iria acabar.
Eu fora um padre católico bem-sucedido e feliz durante quinze anos, mas de repente entrei em crise. (...) O entusiasmo pela minha vocação me abandonara. (...) Evitava responsabilidades, negava o que estava acontecendo e tomava decisões erradas. Finalmente, não sabendo o que fazer, parei de fazer qualquer coisa. Fugi durante um mês para uma cabana pequena, isolada, pendurada no alto de uma colina com vista para o oceano Pacífico na costa da Califórnia, para pensar sobre tudo aquilo.
Eu simplesmente parei. E fazendo isso, descobri meu caminho de novo. Não parei de propósito, mas foi a melhor coisa que poderia ter feito por mim mesmo. Foi só muito mais tarde, depois de muitas ocasiões em que Parei – algumas vezes por apenas dez segundos e outras durante um mês -, que tomei consciência do valor daquilo e consegui encontrar uma definição:
Parar é ficar sem fazer nada o máximo possível, por um período definido de tempo (de um segundo a um mês ), com o propósito de se tornar mais totalmente desperto e saber quem você é.
(...) Não se deve confundir ficar sem fazer nada com uma falta total de atividade. Não fazer nada é de fato fazer algo muito importante. É permitir que a vida aconteça – a sua vida. Não fazer nada é algo muito profundo.
O principal objetivo de Parar é fazer com que, quando avançarmos, avancemos na direção que queremos e que, em vez de estarmos apenas sendo empurrados pelo ritmo de nossas vidas, estejamos escolhendo, a cada momento, o que é melhor para nós. A principal razão que deve nos levar a Parar é querer ir em frente. Ir em frente é aquilo que nós, do mundo ocidental industrializado, somos especialistas: tocar os negócios, fazer com que as coisas aconteçam, ter alto desempenho e assumir papéis de liderança e poder. Por isso, à primeira vista, pode parecer que Parar vá contra nossos valores fundamentais. Mas Parar, além de não ser contra esses valores, os preserva e os cultiva. Sem Parar, para recordar quem nós somos – nossos valores e nossa identidade -, vai ficar muito problemático ir em frente. Parar, mesmo por um segundo, faz com que você perceba os significados essenciais de sua vida e recorde constantemente o que é realmente importante para você, de modo a poder manter suas prioridades em ordem e em dia. Parar ajuda a saber o que você quer realizar e como você quer se comportar. (...) Dá a você tempo para ser, não apenas para fazer.
(...) Na maioria dos casos, nós só paramos quando nos sentimos sobrecarregados e não sabemos para onde nos virar.
Parar permite ficar mais atentos à nossa vida e tomar consciência de todos os aspectos do problema com o qual estamos lidando. Parar ajuda a ir em frente novamente, mas ir em frente de forma concentrada e determinada e não dispersiva e caótica.
Parar possibilita a calma e a tomada de consciência que beneficiam qualquer pessoa, mas visa especificamente atender às necessidades das que precisam viver suas vidas em velocidade cada vez maior, assoberbadas por um número avassalador de exigências. Como essa descrição se aplica a muitos de nós, há uma grande probabilidade de você estar se sentindo sobrecarregado e quase deprimido, sem saber qual a saída e procurando alguma coisa – qualquer coisa – capaz de aliviar a pressão. Se é assim, creio que refletir sobre este texto lhe será bastante útil.

David Kundtz descobriu a necessidade de momentos para fazer nada quando entrou em uma crise que evidenciou o abandono de seu entusiasmo por sua vocação. Marcelo Bohrer após uma grave crise hipertensiva. E nós? De qual crise precisaremos para enxergar a necessidade de tais momentos?

M. Scott Peck passa pelo menos duas horas por dia sem fazer nada. David Kundtz conseguiu passar um mês sem fazer nada. Marcelo Bohrer sugere a prática diária de dez ou quinze minutos de nadismo. Será que nós não somos capazes de conseguir alguns minutos para experimentar fazer nada? Creio que sim; e que custe nada tentar.

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