"Melhor vive quem melhor conhece; e melhor conhece quem melhor interpreta. Daí a necessidade de esforços cada vez maiores na iluminação do raciocínio"
(Ariston Santana Teles)
"Desde a mais tenra idade, nos ensinam a dividir os problemas, a fragmentar o mundo, o que parece ter o dom de facilitar tarefas e questões complexas. Mas o preço que pagamos por isso é enorme, pois deixamos de ver as consequências de nossos atos e perdemos a noção de integração com o todo maior."
Onde fui buscar o parágrafo inicial
desta postagem? Naquela publicada em 14 de fevereiro de 2011 sob o título "O Raciocínio Sistêmico". Por que fui buscá-lo? Porque enxergo
os grandes males que afligem esta civilização (sic) como consequências de
coisas equivocadas que nos são ensinadas desde a mais tenra idade. Males que
dificilmente existiriam se, desde a mais tenra idade, nos fossem ensinados o Raciocínio Sistêmico e o Interser, ensinamentos simplesmente
contrários à divisão dos problemas e à fragmentação do mundo.
Onde encontrei o texto sobre o Interser? Em um livro de Thich Nhat Hanh
intitulado "Paz é cada passo – O caminho da atenção plena", publicado, no Brasil, pela editora Vozes. Quem é Thich Nhat Hanh? É um poeta, mestre Zen e
ativista da paz que nasceu no Vietnã em 11 de outubro de 1926, mas vive no
exílio desde 1966, numa comunidade de meditação (Plum Village) que ele fundou
na França. Foi indicado para o Prêmio Nobel da Paz por Martin Luther King
(laureado em 1964). É autor de dezenas de livros com o intuito de aproximar os
leitores das práticas e ensinamentos budistas.
Feito este preâmbulo, segue o belo
texto desse espírito de elite. Elite aqui considerada em sua verdadeira acepção
– o que há de melhor numa sociedade -, e não com a equivocada acepção - a
minoria composta por indivíduos que por serem mais ricos julgam-se superiores, sabe-se
lá em que.
Interser
Se você é um poeta, verá claramente que nesta folha
de papel há uma nuvem flutuando. Sem nuvem, não haveria chuva; sem chuva, as
árvores não poderiam crescer; e sem árvores, o papel não poderia ser feito. A nuvem
é essencial para o papel existir. Se a nuvem não estivesse presente, a folha de
papel também não poderia estar presente. Então podemos dizer que a nuvem e o
papel inter-são. A palavra "interser"
ainda não está no dicionário, mas se combinarmos o prefixo "inter"
com o verbo "ser", temos um novo verbo, interser.
Se examinarmos essa folha de papel ainda mais
profundamente, podemos ver a luz solar nela. Sem luz solar, a floresta não
poderia crescer. Na verdade, nada pode crescer sem luz solar. Desse modo, nós
sabemos que o sol também está nesta folha de papel. A folha de papel e a luz do
sol interexistem. E se continuarmos a
observar, podemos ver o madeireiro que cortou a árvore e levou-a ao moinho para
ser transformada em papel. E vemos o trigo. Nós sabemos que o madeireiro não
existiria sem o seu pão de cada dia e, portanto, o trigo, que se transformou no
pão dele, também está nesta folha de papel. O pai e a mãe do madeireiro também
estão nela. Ao olharmos dessa maneira, vemos que esta folha de papel não poderia
existir se não fossem todas essas coisas.
Examinando com maior profundidade ainda, também
podemos nos ver nesta folha de papel. Isso não é difícil de ser compreendido,
pois quando olhamos para uma folha de papel, a folha de papel faz parte da
nossa percepção. Sua mente está aqui e a minha também está. Então podemos dizer
que tudo está aqui nesta folha de papel. Não podemos apontar uma única coisa
que não esteja nela – o tempo, o espaço, a terra, a chuva, os minerais do solo,
a luz do sol, a nuvem, o rio, o calor. Tudo coexiste com esta folha de papel.
Por isso, eu acho que a palavra interser deveria estar no dicionário. "Ser"
significa interser. Nós não podemos simplesmente existir só por conta própria. Temos que interexistir com todas as
demais coisas. Esta folha de papel existe, porque tudo o mais existe.
Suponhamos que nós tentássemos retornar um dos
elementos à sua origem. Suponhamos que devolvemos a luz solar ao sol. Você acha
que a existência desta folha de papel seria possível? Não, sem sol nada poderia
existir. E se devolvêssemos o madeireiro à mãe dele, então nós também não
disporíamos de uma folha de papel. O fato é que esta folha de papel é composta
somente de elementos que não-são-papel.
E se mandarmos de volta esse elementos que não-são-papel
para suas fontes, então não poderia existir papel de forma alguma. Sem os
elementos que não-são-papel, como a
mente, o madeireiro, a luz solar e assim por diante, não poderia existir papel.
Mesmo sendo tão fina, como esta folha de papel é, tudo no universo está contido
nela.
*************
"Melhor vive quem melhor
conhece; e melhor conhece quem melhor interpreta. Daí a necessidade de esforços
cada vez maiores na iluminação do raciocínio", diz Ariston Santana Teles.
"'Ser' significa interser. Nós não
podemos simplesmente existir só por
conta própria. Temos que interexistir com todas as demais coisas.", diz Thich Nhat
Hanh.
Será que o que diz Thich Nhat Hanh ajuda-nos
a interpretar melhor, pergunto eu. Por acreditar que sim, a próxima postagem deverá
espalhar mais um belo texto em que ele focaliza o interser.
Nenhum comentário:
Postar um comentário