Citado na postagem anterior, o vídeo que empresta o título a esta postagem (publicado em agosto deste ano em um
canal no You Tube denominado “O
Labirinto”) terá um terço dele transcrito nesta postagem. Por que a
transcrição? Porque, em termos de provocação de reflexões, considero que entre a leitura e a
audição de um texto, a leitura seja mais eficaz. Por quê? Porque enquanto a
leitura ocorre na velocidade estabelecida pelo leitor, a audição ocorre na
velocidade estabelecida pelo narrador. Sendo assim, quem lê pode deter-se em
trechos do texto, relê-los, sublinhá-los, acrescentar-lhes observações etc, o
que não é possível a quem ouve. Por que apenas um terço? Para tentar não
afugentar leitores de curto fôlego para leituras, nestes tempos em que qualquer
texto, que exceda uma indeterminada quantidade de linhas a cada dia menor, é
considerado um textão. Feito este preâmbulo, passemos ao texto.
Estratégia maligna do sistema para escravizar nossas crianças
A mente
de uma criança é como uma chama recém acesa: frágil, luminosa e cheia de
potencial para iluminar caminhos desconhecidos. No entanto, em vez de protegida
do vento da manipulação, essa chama é muitas vezes direcionada, controlada e
moldada segundo os interesses de uma sociedade que teme a liberdade plena de pensamento.
A
infância, que deveria ser o laboratório mais puro da curiosidade e da
imaginação, transforma-se no primeiro campo de batalha das ideologias. Antes
mesmo que uma criança descubra quem é, o mundo apressa-se em dizer quem ela
deve ser. O que poderia florescer como autenticidade, diversidade e
originalidade é forçado a caber em moldes estreitos que não foram feitos para
libertar, mas para aprisionar. Assim, em vez de se tornarem exploradores do
real, muitos pequenos se convertem em produtos de um sistema que não deseja
indivíduos livres, mas peças úteis para sustentar estruturas já existentes.
O
processo de doutrinação infantil é tão silencioso quanto eficiente. Ele não
precisa de correntes visíveis, pois atua no invisível, na linguagem que se
escolhe usar, nos modelos de comportamento apresentados como normais, nas
histórias que se contam, nas imagens que se repetem. A televisão, as redes
sociais, as escolas e até as famílias tornam-se instrumentos dessa engenharia
mental. Uma criança que cresce ouvindo que o sucesso é medido por riqueza,
dificilmente acreditará no valor da simplicidade. Um menino ou menina exposto
diariamente a narrativas de medo, ódio ou hostilidade tende a carregar essas
sementes até a vida adulta.
A
doutrinação funciona porque não dá tempo para o questionamento nascer. Implanta
certezas antes que a dúvida seja capaz de germinar. O perigo é profundo porque
atinge o alicerce da identidade humana. Quando uma criança é ensinada a repetir
sem questionar, a obedecer sem compreender, a aceitar sem refletir, sua
capacidade crítica é amputada. Em nome de educar, muitas vezes se treina. Em
nome de formar, frequentemente se deforma.
A criança
que deveria ser um ser em construção, acaba reduzida a um espelho dos desejos,
frustrações e interesses dos adultos que a rodeiam. Isso explica porque tantos
adultos carregam angústias, traumas e crenças limitantes. Não nasceram de suas
escolhas, mas das imposições que receberam ainda na inocência da infância. Mas
talvez o aspecto mais cruel dessa realidade seja que a doutrinação não é
apresentada como opressão, e sim como cuidado.
A
sociedade esconde o controle sob o disfarce da educação, da tradição, da
cultura e até do amor. Pais e mestres dizem estar preparando para a vida,
quando muitas vezes estão apenas ajustando os filhos a um padrão que os torna
úteis ao sistema e dóceis à autoridade. O verdadeiro perigo não está naquilo que
as crianças sabem, mas naquilo que nunca terão a chance de descobrir por si
mesmas. O preço da doutrinação é a perda da autonomia. E a perda da autonomia é
a morte da liberdade antes mesmo que ela seja vivida. E, no entanto, mesmo
diante dessa engrenagem poderosa há uma saída: resistir à tentação de controlar
mentes infantis e devolver às crianças aquilo que lhes pertence por direito. O
direito de pensar, de questionar, de sonhar, de imaginar, de se contrapor.
A
sociedade não precisa de clones, precisa de indivíduos. Não precisa de
repetidores, mas de criadores. Não precisa de seguidores cegos, mas de
espíritos livres. Preservar a infância como espaço de autenticidade não é
apenas uma questão de justiça com os pequenos, é uma questão de sobrevivência
para toda a humanidade. Afinal, se todas as gerações forem moldadas para
repetir, quem ousará inventar o novo?
A
infância livre é a última fronteira da esperança. Se quisermos uma sociedade
mais justa, mais sábia e mais humana, precisamos começar pelo óbvio: permitir
que nossas crianças sejam crianças, que descubram o mundo com seus próprios
olhos, que façam perguntas sem medo, que duvidem sem culpa e que ousem imaginar
sem limites. O futuro não será construído por aqueles que aprenderam a obedecer
cegamente, mas por aqueles que ousaram pensar livremente desde cedo.
A escola
que poderia ser o grande templo da liberdade intelectual, muitas vezes se
converte em um espaço de domesticação. Em vez de abrir portas para a
criatividade, e para a reflexão crítica, transforma-se em um ambiente rígido
onde o conhecimento deixa de ser descoberta e passa a ser imposição.
A
promessa de formar indivíduos autônomos e conscientes cede lugar a um modelo
que padroniza mentes e sufoca talentos únicos. Ao invés de cultivar a chama da
curiosidade natural que toda criança traz consigo, a escola tende a abafá-la
sob camadas de regras, repetições e verdades absolutas que não podem ser
questionadas. Essa repetição constante não gera sabedoria, mas condicionamento;
não gera liberdade, mas docilidade. É a educação transformada em treinamento, a
aprendizagem reduzida à memorização, a criatividade sacrificada em nome da
obediência. Essa estrutura não é neutra, ela serve a propósitos que ultrapassam
os muros da escola.
Continua
na próxima terça-feira
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