sábado, 23 de fevereiro de 2019

Reflexões provocadas por "A vida é curta"

"A vida é curta", eis o titulo do texto de Paul Graham do qual extraí alguns trechos para elaborar a postagem anterior. Um texto apresentado com o seguinte subtítulo: "Uma reflexão profunda sobre a importância de deixar as bobagens do dia a dia de lado e mergulhar nas coisas que realmente importam". Uma reflexão profunda capaz de provocar outras reflexões em quem a lê.
"Quando eu me pergunto para que a vida é curta demais, uma palavra que me vem à cabeça é 'bobagem'", diz Paul Graham. E ele acrescenta: "Esse tipo de coisa entra em sua vida de duas maneiras: ou ele lhe é imposto ou o engana".
Na primeira maneira ela entra "impelida pelas circunstâncias. Você precisa ganhar dinheiro, uma atividade que consiste basicamente de realizar tarefas", diz Paul Graham. Tarefas que lhe são ordenadas por indivíduos hierarquicamente superiores dentro de organizações sobre as quais Paul Graham diz o seguinte: "A maioria das grandes organizações – e muitas pequenas – está imersa em bobagens".
Por considerar que elas têm a ver com o que é dito no parágrafo anterior, cito aqui algumas experiências por mim vivenciadas no final da minha vida profissional em uma grande organização. Ao recusar tarefas que, no meu entender, não deveriam ser feitas, algumas vezes ouvi da minha superior hierárquica imediata algo mais ou menos assim: "Olha, eu vou ser muito franca: se você não quer fazer isto não terei mais como pagar o seu salário". Motivado pela vontade de deixar de fazer bobagens, comuniquei-lhe meu desejo de aposentar-me em um determinado tempo.
Então, em outra ocorrência de recusa de tarefas, sabedora do meu desejo de aposentar-me e acusando-me de estar de má vontade, ela disse-me que sendo assim seria melhor aposentar-me imediatamente. Diante desse sinistro cenário e considerando que, após 3,7 décadas de trabalho, aposentar-me era um direito que naquela época ainda existia, e que eu não deveria deixar de exercer, embora tendo conhecimento da perda financeira dela advinda, solicitei minha aposentadoria. Sim, a vida é feita de escolhas e ao escolher umas das opções sempre se fica sem a (s) outras (s).
O tempo passou, pois como dizia Cazuza o tempo não para e, entre seis e sete anos depois, vendo-me conversando com alguns ex-colegas de trabalho na entrada do prédio onde trabalhei por mais de três décadas, sem entrar na conversa, minha superior hierárquica imediata citada no parágrafo anterior, dirigiu-se a mim dizendo algo mais ou menos assim: "Guedes! Lembro de você todos os dias. Tudo aquilo que você dizia estava certo!". Naquele momento, a opção escolhida por mim foi simplesmente ouvir o que ela teria a dizer, pois eu não precisava dizer-lhe coisa alguma. E ela nada mais disse.
"Entretanto, pode ser que haja menos bobagens impostas do que você pensa. Sempre há um fluxo de pessoas que renegam a labuta diária e vão viver num lugar onde as oportunidades são escassas, no sentido convencional, mas a vida parece ser mais autêntica. Isso poderia se tornar comum. Você pode fazer isso em menor escala, sem se mudar. (...) Se você conscientemente priorizar evitá-las em vez de outros fatores como dinheiro e prestígio, provavelmente vai encontrar patrões que vão desperdiçar menos seu tempo.", diz Paul Graham.
Considerando que ela tem a ver com o que é dito na última frase do parágrafo anterior, cito aqui mais uma experiência vivenciada na minha vida profissional. Ao ser criado o cargo de consultor na companhia em que eu trabalhava, uma das coisas que mais pesava (talvez a que mais pesasse) na indicação para ocupar tal cargo era a quantidade de grupos de trabalhos nos quais o candidato tivesse participado. O que tem isso a ver com a minha experiência vivenciada? Devido ao fato de, sempre que fora incluído em grupos de trabalho nos quais minha participação era desnecessária eu ter solicitado minha exclusão, obviamente eu jamais seria indicado para uma função cuja indicação dependia da quantidade de participações em grupos de trabalho.
Será que participar de grupos de trabalho nos quais em nada se contribui pode ser considerado uma bobagem? Será que a atitude de retirar-se de tais grupos pode ser enquadrada nas seguintes palavras de Paul Graham: "conscientemente priorizar evitar bobagens em vez de outros fatores como dinheiro e prestígio, provavelmente vai levar a um menor desperdício de tempo? Será que retirar-se de grupos de trabalho nos quais se é desnecessário pode ser considerado não desperdício de tempo?
"Se a vida é curta, deveríamos esperar sua brevidade nos surpreender. E essa é a tendência. Você não dá valor às coisas e depois elas vão embora. Você acha que sempre vai poder fazer o que quer que seja e, então, percebe que a janela se fechou. As janelas mais tristes se fecham quando outras pessoas morrem. A vida delas também é curta. (...) O motivo pelo qual estou triste por causa da minha mãe não é somente porque sinto falta dela, mas porque penso em tudo aquilo que poderíamos ter feito e não fizemos. (...) Depois da morte da minha mãe, eu desejei ter passado mais tempo com ela. Vivi como se ela fosse estar sempre ali. E, com seu jeito típico e quieto, ela encorajou a ilusão. Mas ainda era uma ilusão. Acho que muitas pessoas cometem o mesmo erro.", diz Paul Graham.
Sim, "muitas pessoas cometem o mesmo erro", inclusive, filhos de princesa. A postagem publicada em 13 de setembro de 2017 no blog Lendo e opinando tem o seguinte título: Filhos da princesa Diana dizem se arrepender da última conversa. O próximo parágrafo foi extraído de tal postagem.
"Os príncipes britânicos William e Harry falaram sobre o arrependimento em relação à última conversa que tiveram com a mãe, a princesa Diana, antes que ela morresse, dizendo que foi 'desesperadoramente apressada'. (...) Harry e eu estávamos com uma pressa desesperada para dizer tchau, você sabe, 'te vejo mais tarde'. Se eu soubesse o que iria acontecer eu não teria sido tão blasé sobre isso e todo o resto.", disse o príncipe William.
Para quem quiser ler mais sobre o desejo de ter passado mais tempo com alguém com quem isso não é mais possível, a postagem A ilusão da imortalidade, publicada em 18 de junho de 2018, é uma sugestão.
"Se você se pergunta com que bobagens você perde seu tempo, provavelmente já sabe a resposta. Reuniões inúteis, disputas sem sentido, burocracias, afetações, lidar com os erros das outras pessoas, engarrafamentos e passatempos que são viciantes, mas não compensam.", diz Paul Graham.
E ao citar "engarrafamentos e passatempos que são viciantes, mas não compensam", Paul Graham toca na segunda maneira pela qual a bobagem entra em sua vida: o engano. "Como já escrevi, uma consequência do progresso tecnológico é que coisas das quais gostamos têm a tendência de se tornar mais viciantes. Isso significa que, cada vez mais, teremos de fazer um esforço consciente para evitar vícios – sair de dentro de nós mesmos e nos perguntar: 'É desse jeito que eu quero passar meu tempo?'", eis um alerta seguido de uma indagação de Paul Graham.
"Teremos de fazer um esforço consciente para evitar vícios", pois "Uma maneira comum de evitar ser pego de surpresa por algo é estar consciente desse algo.", afirma Paul Graham. E estar consciente desse algo inclui estar consciente de que "As coisas que importam não são necessariamente aquelas que as pessoas chamariam de 'importantes'."
"Assim como evitar bobagens, devemos seriamente procurar coisas que importam. Coisas diferentes importam para pessoas diferentes, e muitas delas têm de aprender o que é importante para elas. Poucos são sortudos e percebem, cedo, que amam matemática ou cuidar de animais ou escrever e, em seguida, descobrem uma maneira de passar grande parte do tempo fazendo isso. A maioria das pessoas começa com uma vida que é uma mistura de coisas importantes e coisas não importantes e somente após um tempo aprende a diferenciá-las.", diz Paul Graham.
Encerrando estas reflexões repito aqui a recomendação com que Paul Graham encerra o texto que as provocaram. "Reduza as bobagens sem piedade, aprenda a diferenciar coisas importantes e coisas não importantes, não espere para fazer aquilo que importa e aprecie o tempo que você tem. É isso o que você deve fazer quando a vida é curta."

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