A situação descrita a
seguir é bastante comum quando alguém fala para uma plateia. Várias pessoas discordam
de algo que foi dito, mas não se dispõem a interpelar quem fala. Então, surge
alguém que diz algo que algumas delas gostariam de ter dito. Com o surgimento
das atuais tecnologias, situação semelhante passou a ocorrer quando alguém posta
uma mensagem em um blog ou a envia para uma lista de destinatários de e-mails.
É o que eu imagino que tenha ocorrido com o
envio da última postagem (As lentilhas e o caminho de Diógenes) para a minha lista de e-mails. A diferença é que, pelo
fato de a resposta ao e-mail não ter sido enviada para toda a lista, só o "palestrante
ouviu" o que nela foi dito. Por considerar bastante interessante a opinião
nela externada e imaginar que ela tenha passado pela cabeça de outras pessoas,
resolvi publicar no blog a resposta recebida e o texto que enviei esclarecendo
algumas coisas ditas na postagem e apresentando alguns desdobramentos feitos a
partir dela e do e-mail recebido.
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Guedes,
Refletindo um pouco sobre sua mensagem me
peguei num caminho "desviante". Resolvi te provocar.
Auto-respeito, auto-estima,
defesa da própria dignidade. Não necessitar de aprovação, nem de
reconhecimento, dos outros, também pode nos levar a caminhos desviantes.
Desviantes do ser Humano, na perspectiva da socialização na qual nos
desenvolvemos e da qual necessitamos para viver.
Preciso do outro e da
sua aprovação. Sem isso não seria Humano.
Feliz 2013.
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.......,
É muito bom saber que
você encontra tempo para ler as minhas mensagens, refletir sobre elas e até
respondê-las. E responder com provocações. Provocações, quando bem
intencionadas, são algo muito bom, pois, além de mostrar percepções diferentes,
instigam a pensar para respondê-las o que possibilita enriquecer a discussão
sobre o tema em questão.
Refletindo sobre a sua
provocação e considerando o que foi dito sobre aprovação dos outros,
auto-respeito e defesa da dignidade, na história que usei na postagem, digo o
seguinte. No meu entender, a história não diz que a aprovação dos outros seja
desnecessária; o que diz é que ela não deve estar acima do auto-respeito e da
defesa da dignidade. Infelizmente, vivemos em uma sociedade onde se paga por
qualquer coisa que se deseje, e o que o caminho de Diógenes mostra é que se as
moedas usadas para pagar a aprovação dos outros forem o auto-respeito e a
defesa da dignidade o preço que estaremos pagando é demasiado caro.
Ao dizer que é na
socialização que nos desenvolvemos você me faz lembrar uma frase de Roberto
Crema da qual gosto muito: "Ninguém muda ninguém; ninguém muda sozinho;
nós mudamos nos encontros." Portanto, concordo com você quando diz que
precisamos do outro e da sua aprovação, mas, no meu entender, depende de quem
seja o outro. E para defender esta afirmação recorro a um episódio da vida de
Abraham Lincoln.
Ou seja, pela opinião que tinha sobre Stanton, para Lincoln era importante a sua aprovação. Por sua vez, pela consciência que tinha de suas ações, para Stanton nem sempre era necessária a aprovação de Lincoln, embora fosse ele o Presidente da Nação.
"Edward M. Stanton, Secretário da Guerra, disse, certa vez, que Lincoln era "um grande idiota". Stanton estava indignado porque Lincoln se intrometera nos seus assuntos. A fim de agradar a um político egoísta, Lincoln assinara uma ordem transferindo certos regimentos. Stanton não só se recusou a cumprir as ordens de Lincoln, como também jurou que Lincoln era um grande idiota, por ter assinado tal ordem. Que aconteceu? Quando contaram a Lincoln o que Stanton dissera contra ele, respondeu, calmamente: 'Se Stanton disse que eu sou um grande idiota, então é porque eu o devo ser, pois ele quase sempre tem razão. O que tenho a fazer é sair e verificar por mim mesmo.' Lincoln foi ver Stanton. Stanton convenceu-o de que a ordem estava errada – e Lincoln a anulou. Lincoln aceitava críticas quando sabia que eram honestas, baseadas em fatos e feitas com espírito construtivo."
É a crença de que para
tudo é necessária a aprovação dos outros que dá sentido às duas frases de uma antiga charge de Millôr Fernandes reproduzida a seguir.
Desculpando-me pela ilegibilidade decorrente da qualidade da imagem, segue a transcrição das duas frases nela situadas na parte central à direita.
- Às vezes, para sobreviver, a gente tem que fazer certas coisas.- Mas, depois de fazer certas coisas, pra que sobreviver?
Mas sobre aprovação
dos outros eu ainda tenho algo a dizer. Na vida, algumas vezes precisamos da
aprovação dos outros, mas em outras vezes são os outros que precisam da nossa,
e é aqui que mora o perigo. Para fazer o que fez Hitler precisou da aprovação
do povo alemão. Para fazer o que fez Gandhi precisou da aprovação dos indianos.
Para a sociedade ser como é ela precisa da aprovação (por ações ou pela omissão) da maioria
de seus integrantes. Ou seja, quando for a nossa vez de aprovar, precisamos ter
consciência de quais ações estaremos aprovando.
Sim, o ser humano
(entendido apenas como uma espécie superior aos animais irracionais) precisa do
outro e de sua aprovação, mas, se considerarmos o que Abraham Maslow entende
por ser humano, talvez a necessidade de aprovação não exista. Veja o que diz
Roberto Crema sobre Abraham Maslow.
"Gosto muito
desta provocação, que sempre evoco, do cientista e humanista Abraham Maslow, um
dos pais da psicologia humanística: 'Num certo sentido, apenas os santos são a
humanidade'. Ou seja, os demais não lograram o desabrochar deste embrião de
plenitude encarnado em nós. Se você quiser saber quem são os verdadeiros seres
humanos, recomendo que estude as existências de seres humanos plenos,
popularmente conhecidos como santos. É preciso estudar seres humanos que deram
certo."
Ou seja, os seres
humanos que deram certo agiam independentemente da aprovação dos outros.
Lincoln aceitava
críticas quando sabia que eram honestas, baseadas em fatos e feitas com
espírito construtivo. E eu aceito provocações quando sei que são honestas e
feitas com espírito construtivo. Você fez uma provocação e eu acabei este
e-mail citando outra. Citando uma provocação de Abraham Maslow que tanto agrada
a Roberto Crema, um autêntico ser humano com quem tive o privilégio de conviver
durante alguns seminários da UNIPAZ.
Fico feliz por ser
aprovado por você, pois assim como Lincoln respeitava Stanton eu também o
respeito bastante. E também o aprovo.
Abraços,
Guedes
*************
Parece-me óbvio que esta
postagem não esgota um tema tão polêmico. Ela é apenas o resultado de algumas
reflexões provocadas por uma interessante resposta a um e-mail, mas quem sabe
ela possa vir a ser uma provocadora de outras respostas e comentários
interessantes. Repetindo algo já dito acima, digo que comentários bem-intencionados
serão sempre bem-vindos, pois enriquecem a discussão sobre o tema proposto. Aliás,
no meu entender, o maior ganho que pode ser obtido com um blog é, exatamente, a
troca de opiniões - quando bem-intencionadas.
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