“Colunista não tem de ser bonzinho nem antipático nem julgador nem acusador nem nada: tem de observar e, quando acha conveniente, comentar. Eu me espanto com tantas coisas ultimamente que nem sei o que escolher."
As
palavras acima são do início do artigo de Lya Luft publicado na postagem anterior e foram elas que me levaram a redigir esta, pois me identifico, perfeitamente, com elas. Indo além do que diz Lya Luft, digo que observar e comentar são coisas que não devem ficar restritas a colunistas, e sim ser estendidas a qualquer pessoa que pretende viver de maneira consciente. Foi por pensar assim, e também por me espantar com tantas coisas ultimamente, que criei um blog intitulado Lendo e opinando com a intenção de estimular as pessoas a opinarem sobre notícias que deveriam mexer conosco. Lendo e opinando é o título do blog, pois ele se baseia em notícias, mas creio que Observando e comentando também seria um título válido para ele.
Observar e comentar são duas coisas que devem ser estimuladas em qualquer sociedade que pretende desenvolver seres conscientes, pois só estes podem torná-la melhor. Mas são também duas coisas que uma sociedade capitalista procura impedir, pois elas propiciam o despertar de consciências capazes de questionar as ações de uma sociedade que sempre privilegiou poucos em detrimento da grande maioria. Nesta sociedade, em vez do observar, o que é estimulado é, exatamente, o contrário: o distrair. Com o pretexto de oferecer distração - a velhíssima história do pão e circo - o que se produz é uma sociedade de distraídos onde a abundância de circo faz as pessoas até esquecerem a escassez de pão. Distrair para impedir de observar está entre as piores práticas desta sociedade insana e desumana.
Lya Luft não cita, mas entre observar e comentar existe outra coisa importante: interpretar. Sim, interpretar é o passo seguinte ao observar, pois de nada adianta observar se não soubermos interpretar. Sobre a incapacidade de interpretar cito uma passagem do "filósofo" Carlos Alberto Parreira. Em uma entrevista concedida ao jornal Folha de S. Paulo,
em 1994, após a conquista do tetracampeonato mundial de futebol, indagado sobre
como se sentia ao ser chamado de burro pelos torcedores, Parreira deu a brilhante resposta mostrada
abaixo:
Considero a resposta de Parreira, simplesmente, perfeita. Sim, vivemos em uma sociedade onde a maioria é incapaz de interpretar o que tem diante de si e precisa que alguém lhe diga o que está vendo. O problema é que saber interpretar talvez seja o que há de mais importante na vida. Não é à toa que a primeira frase ilustrativa do meu blog é a seguinte:“Era para eu ter ficado abatido, mas criei forças interiores. Continuo afirmando: a população é uma caixa de ressonância sem opinião própria, reflete o que ouve. O cara vai ao Maracanã, está vendo o jogo, mas fica com o radinho de pilha na orelha. É importante que alguém diga a ele o que ele está vendo. Ele não tem condições de analisar, acha que o Flamengo está jogando bem porque o rádio está dizendo."
“Melhor vive quem melhor conhece; e melhor conhece quem melhor interpreta. Daí a necessidade de esforços cada vez maiores na iluminação do raciocínio.”
Observar, interpretar e comentar: três coisas imprescindíveis a todo indivíduo consciente da necessidade de sua participação na mudança do mundo em que vive. Imprescindíveis, porém insuficientes, e aqui eu cito o trecho final de um comentário feito pelo Michel, um ex-colega de trabalho e eterno amigo, nas Considerações finais sobre o raciocínio sistêmico: "Vou terminar com uma frase de um livro que você me deu: Para mudar não basta querer é preciso agir". Agir, eis a quarta coisa imprescindível.
Observar, interpretar, comentar e agir. Observar para perceber as coisas que acontecem ao nosso redor e que devem mexer conosco. Interpretar para descobrir como elas nos afetarão e o que precisamos fazer para evitar possíveis inconvenientes. Comentar para despertar a imensa legião de distraídos que nada percebe e tentar fazê-la participar do último passo: agir. Agir no sentido de impedir a concretização do que for nocivo para a sociedade e de implementar o que contribuir para torná-la melhor. No meu entender, são estes os passos a serem seguidos por qualquer indivíduo consciente de que a qualidade de uma sociedade é resultado das ações de todos os seus componentes.
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