segunda-feira, 9 de abril de 2012

Você vive ou existe?

Esta postagem é inspirada em um excelente texto de Martha Medeiros publicado na edição de 25.03.2012 da Revista O Globo, em sua coluna semanal, e que é apresentado abaixo.
Posto, logo existo
Tão preocupadas em existir para os outros, as pessoas estão perdendo
um tempo valioso em que poderiam estar vivendo, ou seja,
namorando, indo à praia, trabalhando, viajando, lendo, estudando
“Começam a pipocar alguns debates sobre as consequências de se passar tanto tempo conectado à internet. Já se fala em 'saturação social', inspirado pelo recente depoimento de um jornalista do 'The New York Times' que afirmou que sua produtividade no trabalho estava caindo por causa do tempo consumido por Facebook, Twitter e agregados, e que se vê hoje diante da escolha entre cortar seus passeios de bicicleta ou 'alguns desses hábitos digitais que estão me comendo vivo'.
Antropofagia virtual. O Brasil, pra variar, está atrasado (aqui dois terços dos usuários ainda atualizam seus perfis semanalmente), pois no resto do mundo já começa a ser articulado um movimento de desaceleração dessa tara por conexão: hotéis europeus prometem quartos sem wi-fi como garantia de férias tranquilas, empresas americanas desenvolvem programas de softwares que restringem o acesso a web, e na Ásia crescem os centros de recuperação de viciados em internet. Tudo isso por uma simples razão: existir é uma coisa, viver é outra.
Penso, logo existo. Descartes teria que reavaliar esse seu cogito, ergo sum, pois as pessoas trocaram o verbo pensar por postar. Posto, logo existo.
Tão preocupadas em existir para os outros, as pessoas estão perdendo um tempo valioso em que poderiam estar vivendo, ou seja, namorando, indo à praia, trabalhando, viajando, lendo, estudando, cercados não por milhares de seguidores, mas por umas poucas dezenas de amigos. Isso não pode ter se tornado tão obsoleto.
Claro que muitos usam as redes sociais como uma forma de aproximação, de resgate e de compartilhamento - numa boa. Se a pessoa está no controle do seu tempo e não troca o virtual pelo real, está fazendo bom uso da ferramenta. Mas não tem sido a regra. Adolescentes deixam de ir a um parque para ficarem trancafiados em seus quartos, numa solidão disfarçada de socialização. Isso acontece dentro da minha casa também, com minhas filhas, e não adianta me descabelar, elas são frutos da sua época, os amigos se comunicam assim, e nem batendo com um gato morto na cabeça delas para fazê-las entender que a vida está lá fora. Lá fora! Não me interessa que elas existam pra Tati, pra Rô, pro Cauê. Quero que elas vivam.
O grau de envolvimento delas com a internet ainda é mediano e controlado, mas tem sido agudo entre muitos jovens sem noção, que se deixam fotografar portando armas, fazendo sexo, mostrando o resultado de suas pichações, num exibicionismo triste, pobre, desvirtuado. São garotos e garotas que não se sentem com a existência comprovada, e para isso se valem de bizarrices na esperança de deixarem de ser 'ninguém' para se tornarem 'alguém', mesmo que alguém medíocre.
Casos avulsos, extremos, mas estão aí, ao nosso redor. Gente que não percebe a diferença entre existir e viver. Não entendem que é preferível viver, mesmo que discretamente, do que existir de mentirinha para 17.870 que não estão nem aí."
No resto do mundo já começa a ser articulado um movimento de desaceleração dessa tara por conexão (...) na Ásia crescem os centros de recuperação de viciados em internet. Tudo isso por uma simples razão: existir é uma coisa, viver é outra. (...) Claro que muitos usam as redes sociais como uma forma de aproximação, de resgate e de compartilhamento - numa boa. Se a pessoa está no controle do seu tempo e não troca o virtual pelo real, está fazendo bom uso da ferramenta. Mas não tem sido a regra. Essas são palavras de Martha Medeiros.
Sim, é como ferramenta que devem ser vistas as coisas que servem para solucionar nossos problemas e as redes sociais são uma coisa que serve para resolver o problema da comunicação com pessoas queridas que estejam geograficamente distantes. Uma ferramenta que, igualmente a qualquer outra, quando usada para um fim diferente daquele a que se presta causará danos naquilo em que atuar. E é aí que mora o problema. Excelente como meio de comunicação entre pessoas impossibilitadas de se verem, ao vivo e a cores, as redes sociais estão sendo usadas como meio para as pessoas passarem a existir para os outros. Sim, pois, segundo aqueles que “estão em sintonia com a modernidade”, o que ou quem não estiver estampado na internet não existe. Ou seja, existir passou a significar estar "ativo" nas redes sociais.
Então, com a finalidade de comprovar sua existência, os habitantes dessas comunidades virtuais pedem uns aos outros que os adicionem como seus amigos. E não percebem que o número de adições feitas nessas comunidades virtuais é diretamente proporcional ao número de subtrações feitas na vida real. Subtrações de coisas que deixam de fazer por estarem conectados às redes sociais durante 24 horas por dia (e algumas à noite, rsrsrs). Não percebem que viver e existir não são a mesma coisa e que existir, virtualmente, para milhares de amigos das redes sociais - do mundo virtual - os impede de conviver, ao vivo e a cores, com as poucas dezenas de amigos do mundo real.
A edição de 09.10.2011 da Revista O Globo traz, no espaço do brilhante cartunista Bruno Drummond, a seguinte cena: Um jovem sentado, uma jovem com a cabeça encostada em uma de suas pernas e ambos tentando fazer conexões remotas. Então, a jovem diz “perdi a conexão”; o jovem responde “eu também” e faz a seguinte pergunta: “E agora? Com quem a gente vai conversar?”
Antigamente, para iniciar uma conversa era comum fazer a seguinte pergunta? "Você estuda ou trabalha?". Hoje, essa pergunta perdeu o sentido, pois o "ou" virou "e", e a maioria precisa fazer as duas coisas. Coisas que cada vez mais são prejudicadas pelo tempo consumido por Facebook, Twitter e agregados, conforme recente depoimento de um jornalista do "The New York Times" citado no primeiro parágarafo do texto de Martha Medeiros. Então, torna-se necessário fazer uma nova pergunta. Que tal a seguinte? "Você vive ou existe?" É óbvio que esta pergunta só deve ser feita a quem ainda consegue passar parte das 24 horas (que todos recebem diariamente) desconectado da internet, pois quem não consegue, segundo a opinião de Martha Medeiros - com a qual eu concordo - não percebe a diferença entre viver e existir.
Mas, como nem Martha Medeiros nem eu somos donos da verdade, opiniões diferentes podem ser analisadas, e para propiciar a troca de opiniões os blogs oferecem a possibilidade de comentar o que neles é lido. Sendo assim, o que vocês têm a dizer sobre esta postagem? Não esqueçam que a intenção deste blog é "Espalhar ideias que ajudem a interpretar a vida e provoquem ações para torná-la cada vez melhor". Ideias oriundas de várias fontes, dentre elas as contribuições enviadas por visitadores do blog e destinatários da minha lista de e-mails, pois existem amigos que em vez de acessar o blog pediram-me que eu lhes enviasse as postagens por e-mail. Algumas postagens já foram feitas a partir de contribuições de leitores.
Em tempo: Este blog já publicou algumas postagens que, no meu entender, têm muito a ver com esta. Homem-máquina (30.03.2011), Redes sociais (I) (02.06.2011), Redes sociais (final) (06.06.2011), A caminho do correio (02.08.2011) e Viver (05.08.2011). Creio que quem não as leu deveria fazê-lo.


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