quinta-feira, 12 de abril de 2012

A estranha era em que vivemos

No sábado passado, meu filho saiu para comemorar o aniversário de uma das primas. Lido isto, vocês poderão pensar algo mais ou menos assim: Normal ele nunca deve ter sido, mas agora parece que pirou de vez, pois já está confundindo as coisas e dizendo em um blog o que as pessoas costumam dizer no Facebook, Twitter e assemelhados. Então, para evitar que pensamentos como esse se consolidem, o melhor a fazer é começar a dar as devidas explicações.
A frase que inicia esta postagem é, para mim, a mais nova demonstração da era em que vivemos: a era pré. Milhares de anos após a era pré-histórica, chegamos a uma era com vários "prés": pré-datado, pré-pago, pré-comprado, pré-gasto, pré-ocupado, pré-etc. Uma era em que futuro do presente é confundido com futuro no presente e, equivocadamente, as pessoas imaginam ser possível trazer o futuro para o presente e viver hoje o dia de amanhã. É com essa imaginação equivocada que as pessoas pré-pagam o que ainda não receberam, pré-compram o que ainda demorarão a usar, pré-gastam o dinheiro que ainda não ganharam, pré-enchem os seus dias com um monte de atividades que poderiam ser feitas em outro dia e pré-ocupam os outros e a si mesmas com a sua crescente ansiedade.
E entre os mais pré-ocupados estão as crianças. Na sociedade insana na qual sobrevivemos, elas são "pré-maturamente" ocupadas com uma infinidade de atividades que pretendem prepará-las para a feroz competição que se tornou a sobrevivência neste planeta. E ao sobrecarregá-las com tantas atividades, delas se tira a oportunidade de viver uma fase importantíssima na vida dos seres que encarnam neste planeta, pois na era em que vivemos, a infância já era e as crianças já nascem na pré-adolescência. Em vez de álbuns para registrar episódios significativos de sua infância hoje elas têm agendas para registrar a infinidade de atividades que precisam desempenhar com a finalidade de se tornarem suficientemente competitivas para conseguir vencer em uma sociedade desinteressada em oferecer a todos os seus componentes a oportunidade de viver com dignidade. Pobres crianças; embora nem sempre sejam crianças pobres!
A esta altura da postagem vocês poderão estar pensando algo mais ou menos assim: por mais que tente disfarçar, ele realmente pirou. Disse que explicaria a estranha frase inicial e até agora nada. Afinal, o que é que tudo o que falou até aqui tem a ver com a frase com que iniciou a postagem? Então, antes que vocês desistam de prosseguir com a leitura e se convençam definitivamente de que pirei, aqui vai a relação entre as duas coisas. Lembram que eu disse que aquela frase era, para mim, a mais nova demonstração da era em que vivemos? Pois é, aquela frase evidencia mais um pré, pois o aniversário da minha sobrinha é no dia 10 de abril, mas foi comemorado no dia 7. Ou seja, o aniversário foi pré-comemorado. Que era estranha! Uma era em que acontecimentos são comemorados antes de acontecerem!
E para simbolizar uma estranha era nada melhor do que uma frase equivocada: “Não deixe para amanhã o que pode fazer hoje”. É esta a frase dos perfeitamente ajustados à era pré. Mas não é a dos praticantes da arte da preguiça (fazer menos e melhor). Para estes a frase correta é: “Não deixe para amanhã o que pode deixar para depois de amanhã”. É agindo assim que eles se livram de fazer muitas coisas desnecessárias que são feitas apenas pelos infelizes ajustados à era pré. A atitude correta é dar tempo ao tempo.
É ao dar tempo ao tempo que se permite que as circunstâncias mudem e que, consequentemente, coisas que "precisavam" ser feitas tornem-se desnecessárias. Aprendi essa ideia no livro Como evitar as preocupações e começar a viver (cuja leitura eu recomendo) e a incorporei ao meu modo de agir. Foi agindo assim que, nas 3,5 décadas em que atuei no teatro corporativo, deixei de fazer muitas coisas desnecessárias. Não, não foram poucas as tarefas que eu podia fazer imediatamente, mas não as fiz, pois ao deixá-las para depois, de tão disparatadas que eram, até o chefe conseguiria perceber que elas não precisavam ser feitas.
Vivemos realmente em uma era muito estranha! E alguns de vocês podem até ter pensado que o estranho seja eu! Será que já posso me considerar livre dessas possíveis suspeitas? Não, não pensem que eu esteja preocupado com as respostas que possa receber. Afinal, por ter lido e relido o livro Como evitar as preocupações e começar a viver, e dele ter incorporado várias ideias ao meu modo de viver, hoje eu consigo deixar de lado as preocupações.
E para terminar esta estranha postagem, optei pelo espalhamento da ideia contida na seguinte frase: "Se o seu problema tem solução, não há necessidade de se preocupar; se não tem, não adianta se preocupar". Ou seja, preocupar-se é algo que não faz o menor sentido, e que faz um enorme mal a saúde. Portanto, que tal começar a evitar as preocupações e começar a viver? Como começar? Deixando de ser um adepto dos "prés": pré-datado, pré-pago, pré-comprado, pré-gasto e pré-etc. Afinal, a cada um desses "prés", que aparentemente resolveriam algum problema, mais cedo do que se espera corresponderá um "pós" que chegará trazendo um novo problema a ser enfrentado ou fortalecendo os problemas já existentes. "O que não me mata me fortalece" ou "Os problemas de hoje provêm das 'soluções' de ontem".
Nossa! Quantas reflexões eu consegui fazer a partir de uma "simples" pré-comemoração de aniversário! Será que as possíveis suspeitas levantadas ao longo da postagem fazem algum sentido? Será que eu nunca fui normal? Se já fui, isso foi há muito tempo, pois hoje me considero em conformidade com as palavras daquele adesivo que ilustra a lateral direita do blog: "Não sou + nem sou -, sou apenas ≠ das pessoas =".

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito bom texto! Parabéns! Abraços, Leitora assídua.