terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Reflexões sobre “Desobediência: a virtude original do homem”

Exercitando a saudável prática de refletir sobre o que se lê e de compartilhar as reflexões, publico as Reflexões sobre “Desobediência: a virtude original do homem”. As opiniões de Oscar Wilde são contundentes e podem chocar muitos dos que lerem “Desobediência: a virtude original do homem“. Afinal, vivemos em uma sociedade egoísta e desumana cujo lema é manda quem pode e obedece quem tem juízo. Dito isto, passemos a reflexão sobre alguns trechos do texto de Wilde.
“Nenhum homem deveria estar sempre pronto a mostrar que consegue viver como um animal mal alimentado. Deveria recusar-se a viver assim, roubar ou fazer greve (...) é muito mais seguro mendigar do que roubar, mas é melhor roubar do que mendigar. Não! Um pobre que é ingrato, descontente, rebelde e que se recusa a poupar terá, provavelmente, uma verdadeira personalidade e uma grande riqueza interior. De qualquer forma, ele representará uma saudável forma de protesto. Quanto aos pobres virtuosos, devemos ter pena deles, mas jamais admirá-los. Eles entraram num acordo particular com o inimigo e venderam seus direitos por um preço muito baixo. Devem ser também extraordinariamente estúpidos.”
Sim, é muito mais seguro sujeitar-se a toda e qualquer situação do que rebelar-se, mas é também muito menos digno. E na medida em que a dignidade diminui o poder de subjugação aumenta tanto que chega a colocar o subjugado em uma condição que os mais antigos expressavam tão bem com a seguinte frase: “Quem muito se abaixa acaba mostrando a bunda.” E depois que ela estiver à mostra, resta apenas entrar em acordo particular com o inimigo e vender seus direitos por um preço muito baixo.
"A insatisfação é o primeiro passo para o progresso de um homem ou de uma nação.", é uma frase de Oscar Wilde não citada no texto que provocou esta postagem. O problema é que muitas vezes esse primeiro passo não é dado pelos prejudicados, e é aí que torna-se necessária a participação de um grupo detestado por patrões, mas fundamental para o avanço da civilização.
“O que os patrões dizem sobre os agitadores é totalmente verdadeiro. Os agitadores são um bando de pessoas intrometidas que se infiltram num determinado segmento da comunidade totalmente satisfeito com a situação em que vivem e semeiam o descontentamento nele. É por isso que os agitadores são necessários. Sem eles, em nosso estado imperfeito, a civilização não avançaria.”
No trecho acima eu faço uma troca, pois acredito que mais do que “totalmente satisfeito” um determinado segmento da comunidade esteja é “totalmente acomodado”. Foi esse o caso da abolição da escravatura na América.
“A abolição da escravatura na América não foi uma conseqüência da ação direta dos escravos nem uma expressão do seu desejo de liberdade. A escravidão foi abolida graças à conduta totalmente ilegal de agitadores vindos de Boston e de outros lugares, que não eram escravos, não tinham escravos nem qualquer relação direta com o problema. Foram eles, sem dúvida, que começaram tudo. É curioso lembrar que dos próprios escravos eles recebiam pouquíssima ajuda material e quase nenhuma solidariedade. E quando a guerra terminou e os escravos descobriram que estavam livres, tão livres que podiam até morrer de fome livremente, muitos lamentaram amargamente a nova situação.”
Sim, muitas vezes a conduta precisa ser totalmente ilegal, pois o que a lei pretende é, justamente, manter a situação que se deseja mudar. E aqui eu lembro algo dito por Martin Luther King, em uma carta de uma cadeia de Birmingham, em 1963.
“Qualquer lei que eleve a personalidade humana é justa. Qualquer lei que degrade a personalidade humana é injusta... Permito-me afirmar que o indivíduo que infringe a lei que a consciência lhe diz ser injusta... está, na verdade, expressando o mais alto respeito pela lei.”
“Qualquer pessoa que tenha lido a história da humanidade aprendeu que a desobediência é a virtude original do homem. O progresso é uma conseqüência da desobediência e da rebelião, diz Oscar Wilde.”
E qualquer pessoa deveria ter aprendido também que a obediência cega e irrefletida seria ridícula se não fosse sinistra. A “desculpa” de quem jogou a bomba em Hiroshima foi de que estava apenas cumprindo ordens. A infame “desculpa” nazista de Nuremberg também. Isto mostra até onde o ser humano pode chegar quando sua consciência e sua disposição para a desobediência são neutralizadas.
O progresso é uma consequência da desobediência, diz Oscar Wilde. Mas existem outras consequências e a liberdade é uma delas. A libertação da Índia, do jugo inglês, teve na desobediência pacífica às leis ingleses, pregada por Gandhi, um de seus principais fatores.
E a preservação de vidas humanas pode ser mais uma saudável consequência da desobediência. Foi ao desobedecer ordens de um brigadeiro para que coordenasse atos terroristas que seriam atribuídos a esquerda que, em junho de 1968, um corajoso capitão evitou um verdadeiro genocídio nesta cidade. É óbvio que ele pagou bem caro por sua coragem e altivez, mas seu exemplo ficará para sempre na memória das pessoas de bem.
Diante do que foi dito acima, dá para discordar da afirmação de Oscar Wilde de que a desobediência é a virtude original do homem? Para mim não dá. E para vocês?

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