sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Reflexões provocadas por "A águia e a galinha"

A ida a um dicionário na busca de sentidos figurados para águia e galinha resulta no seguinte: “Galinha: Pessoa fraca, covarde ou medrosa. Águia: Pessoa de grande talento e perspicácia.” E possibilita a associação da história A águia e a galinha com a fábula O peso da servidão, publicada neste blog no mês de novembro próximo passado, e da qual transcrevo o seguinte trecho.
“Nós tornamos as nossas ovelhas estúpidas porque reprimimos brutalmente todas as tentativas de emancipação, todas as veleidades dos jovens carneiros de fazer as suas experiências fora dos caminhos batidos (...). Mas nós temos desculpa. O nosso fim não é educar nossas ovelhas nem torná-las inteligentes, mas somente treiná-las para suportar, aceitar e até desejar a lei do rebanho e da servidão - aquele que dá boa carne e grandes benefícios.”
Vocês concordam que nos dois casos (o da história e o da fábula) a pretensão é a mesma: “criar pessoas fracas, covardes ou medrosas” que se sujeitem a tudo o que lhe mandem fazer? E como criá-las? “Reprimindo brutalmente todas as tentativas de emancipação e as suas experiências fora dos caminhos batidos” (ver O peso da servidão), e convencendo-as de que são galinhas, e não águias. E uma vez consumada a servidão “o efeito é tão paralisante que os subjugados chegam a perder a consciência do seu próprio sofrimento”, conforme é dito em uma recente postagem intitulada Desobediência: a virtude original do homem. Nossa! Quantas relações entre textos deste blog! Sim, para quem aprende a enxergar inter-relações é impressionante a quantidade delas que se pode perceber entre os textos que se lê.
“É preciso que outras pessoas venham apontar o seu sofrimento e mesmo assim muitas vezes não acreditam nelas”, é uma afirmação feita em Desobediência: a virtude original do homem, em um texto que prossegue assim:Os agitadores são um bando de pessoas intrometidas que se infiltram num determinado segmento da comunidade totalmente satisfeito com a situação em que vivem e semeiam o descontentamento nele. É por isso que os agitadores são necessários. Sem eles, em nosso estado imperfeito, a civilização não avançaria.”
Em A águia e a galinha o papel de agitador cabe ao naturalista que semeando o descontentamento em uma águia totalmente satisfeita com a condição de galinha consegue, após insistentes tentativas, convencê-la de que é uma águia.
Usando uma metáfora, James Aggrey procura passar ao seu povo a ideia de que a libertação começa na consciência e no resgate da própria dignidade, feita mediante uma prática consequente. Ou seja, libertação é algo que começa na mente, passa pela organização e culmina na prática.
Sendo assim, enquanto não estivermos conscientes do que, realmente, somos jamais nos livraremos de tantos condicionamentos impostos por pessoas pretensa e supostamente superiores. Apanhadas ainda filhotes na floresta para serem criadas segundo a conveniência de seus captores (ver A águia e a galinha) ou “formatadas” por trás das portas fechadas de escolas-estábulo, mesmo que sejam luxuosas (ver O peso da servidão) as jovens águias (pessoas de grande talento e perspicácia) crescem convencidas de que são galinhas (pessoas fracas, covardes ou medrosas). E, consequentemente, ao atingir a idade adulta contentam-se com os grãos que lhes joguem aos pés para ciscar, e dificilmente abandonam tal prática sem a intervenção de um insistente naturalista que as convença de que são águias, e não galinhas.
Sim, para libertar-se de qualquer servidão é imprescindível estar consciente do que se é. “Conhecereis a verdade e ela vos libertará” disse um mestre que deixou este planeta há 1978 anos. É a falta de consciência quanto a sua verdadeira natureza que faz com que os seres que habitam este planeta mantenham-se, há tanto tempo, presos a uma vida sofrida e sem sentido. Falta de consciência que, conforme a afirmação apresentada a seguir, não atingia o teólogo, filósofo e paleontólogo francês Pierre Teilhard de Chardin.
“Não somos seres humanos vivendo uma experiência espiritual, somos seres espirituais vivendo uma experiência humana.”
Mais do que um simples jogo de palavras, vejo na afirmação acima a substituição que precisa ser feita para virarmos o jogo que estamos perdendo para a ignorância do que realmente somos.
E para terminar esta postagem tão farta em referências a interessantes textos publicados em algumas anteriores, segue uma recomendação fundamentada em tais textos. Se quisermos voar cada vez mais alto e atingir um estágio evolutivo que justifique nossa pretensão de ser a espécie inteligente do universo creio que seja necessário o seguinte:
- Esquecer a criação recebida de camponeses que vão a floresta apanhar pássaros para criá-los como galinhas e mantê-los cativos.
- Esquecer as lições recebidas em escolas-estábulo, mesmo que sejam luxuosas.
- Acreditar em naturalistas que nos dizem que somos águias e não galinhas.
- Apoiar agitadores que se infiltrem em segmentos da comunidade totalmente satisfeitos com situações contra as quais se deve rebelar.
- Refletir sobre a afirmação de Teilhard de Chardin.                            
Aproveitando a oportunidade de, mais uma vez, estarmos no período em que grande parte da humanidade comemora um determinado nascimento, que tal fazer nascer em cada um de nós um novo ser humano? Um ser que almeje tornar-se parecido com o aniversariante do próximo dia 25. Parecido com aquele que, muito antes de Teilhard de Chardin, veio a este planeta com a finalidade de espalhar a ideia de que “não somos seres humanos vivendo uma experiência espiritual, somos seres espirituais vivendo uma experiência humana.”

A todos vocês, as minhas vibrações para que tenham um feliz e proveitoso Natal.

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