A ideia de usar o que é dito no final da postagem para desenvolver o tema da próxima me colocou na difícil situação de escrever sobre uma frase da trilogia O Senhor dos Anéis que me tocou bastante: “A única coisa a fazer é decidir como usar o tempo que nos foi dado”. Diante da dificuldade, recorri às próprias palavras que a causaram e com as quais concordo plenamente. Como disse Luiza Possi: “(...) tempo é a única coisa que temos nessa vida”. Juntei as duas “únicas” coisas e o resultado é o seguinte:
“Tempo é a única coisa que temos nessa vida e a única coisa a fazer é decidir como usar o tempo que nos foi dado”.
Tempo é a única coisa que cada pessoa recebe gratuitamente enquanto vive neste planeta (acredito que até quando for para outro lugar) e (se for sã) deve decidir como usar. Pessoas sujeitas a graves problemas de saúde estão dispensadas do dever de decidir sobre qualquer coisa.
E o que faz a maioria com o tempo que recebe gratuitamente? Ou o mata ou o vende. E depois reclama de falta de tempo. Isto me lembra a história do filho que mata os pais e queixa-se por ser órfão.
Há uma forte tendência a não valorizar o que se recebe gratuitamente. Então, seguindo um antigo ditado que diz que tempo é dinheiro, a maioria se desfaz do tempo em troca de dinheiro. Vende-o em quantidade a cada dia maior. Afinal, quanto maior a quantidade vendida, maior é a quantia obtida. Vende-se o tempo e dá-se como brinde a própria saúde. Li, atribuídas equivocadamente ao Dalai Lama, pois na verdade são de Jim Brown em um texto intitulado Entrevista com Deus, as seguintes palavras:
"Os homens perdem a saúde para juntar dinheiro, depois perdem dinheiro para recuperar a saúde. Por pensarem ansiosamente no futuro, esquecem do presente de tal forma, que acabam por não viver nem o presente, nem o futuro. E vivem como se nunca fossem morrer. E morrem como se nunca tivessem vivido".
E tais palavras me lembram um depoimento de Roberto Shinyashiki:
“Quando era recém-formado em São Paulo, trabalhei em um hospital de pacientes terminais. Todos os dias morriam nove ou dez pacientes. Eu sempre procurei conversar com eles na hora da morte. A maior parte pega o médico pela camisa e diz: ‘Doutor, não me deixe morrer. Eu me sacrifiquei a vida inteira, agora eu quero aproveitá-la e ser feliz.’
Eu sentia uma dor enorme por não poder fazer nada. Ali eu aprendi que a felicidade é feita de coisas pequenas.
Ninguém na hora da morte diz se arrepender por não ter aplicado o dinheiro em imóveis ou ações, mas sim de ter esperado muito tempo ou perdido várias oportunidades para aproveitar a vida”.
Creio que aproveitar a vida passe por abandonar o frenesi com que a vivemos, temendo estar perdendo tempo. São de Erich Fromm as seguintes palavras:
“O homem moderno pensa perder algo – tempo – quando não faz as coisas depressa; entretanto não sabe o que fazer com o tempo que ganha a não ser matá-lo”.
Acredito que outra boa maneira de interpretar o tempo seja em termos de passado, presente e futuro. E olhando deste ponto de vista, repito aqui algo que li: “O passado é história, o futuro é mistério, o presente é uma dádiva, por isso se chama presente”. Mas creio que o passado tenha seu valor e uso uma frase de Kierkegaard para justificar esta opinião.
“A vida só pode ser compreendida olhando-se para trás, mas só pode ser vivida olhando-se para frente”.
E concordo com a seguinte afirmação de Chico Xavier:
"Embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo começo, qualquer um pode começar agora e fazer um novo fim".
Voltar atrás é impossível, mas é possível olhar para trás – o passado – com a finalidade de compreender o presente e nele atuar para moldar o futuro. E começar a fazer um fim diferente do que teremos se persistirmos em antigos comportamentos.
Alguns podem achar que o texto começa a ficar longo e talvez decidam usar o tempo para fazer outras coisas. Creio que quem chegou até aqui já tenha encontrado ideias suficientes para refletir sobre como está fazendo a única coisa a fazer. Mas para os que ainda dispuserem de tempo para dedicar a esta postagem, segue uma história que li - em um livro cujo nome não anotei - sobre a rapidez com que se vive atualmente e a venda de tempo. O texto é intitulado Rápido! Rápido! e o crédito aparece assim: Hans Stempel e Martin Ripkens, de: Der Lesefuchs, editado por K. Lindner, Stuttgart: Klett, 1990.
“Rápido! Rápido!
Era uma vez um rapaz para quem as coisas não aconteciam rápido o suficiente; enquanto ainda tomava a sopa, já solicitava a sobremesa; mal o sol se punha, queria ver a lua; no primeiro dia de aulas após as férias, já se alegrava com a Páscoa. Dos livros, sempre lia apenas a última página e, como falasse mais depressa que pensava, até mesmo seus pais o tinham por gago; em casa, andava tão depressa que vivia tropeçando. Naturalmente não desejava mais nada que ser logo adulto. Aconteceu que, uma noite, em sonho, um mago o visitou: ‘Faço de você um adulto e, ainda, lhe concedo três desejos se em troca me der cinquenta anos de sua vida’.
O jovem não titubeou um só instante e disse: ‘Quero ser rico, poderoso e famoso’. E assim aconteceu. Mas, quando o homem rico olhou no espelho, viu um velho. E quando o homem poderoso olhou no espelho, percebeu que era um solitário. E quando o homem famoso olhou no espelho, encontrou muitas rugas de preocupação na testa. Então, ele se assustou e gritou pela mãe. Ela veio até sua cama e pôs a mão na testa dele; então, o jovem acordou e falou lenta e claramente:‘Já preciso levantar, ou ainda tenho tempo?’”
Fica aqui a questão. Já precisamos levantar, ou ainda temos tempo para permanecermos deitados eternamente em berço esplêndido e continuarmos fazendo pouco caso da única coisa a fazer?
Nossa! Que texto difícil de escrever! Darei um tempo nessa ideia de escrever textos a partir das palavras finais do anterior.
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