domingo, 23 de setembro de 2012

Reflexões provocadas por "Animais falantes"

Vejo no texto de Fernando Pedreira (Animais falantes) mais uma demonstração da incapacidade do ser humano de lidar com a abundância. Diante de tantos meios de comunicação oferecidos pelo estupendo desenvolvimento tecnológico, o que faz ele? Atrapalha-se todo e usa tais meios em prol de fins que, em sã consciência, não deveriam lhe interessar. A quem interessa que ele fale tanto? As corporações detentoras dos meios de comunicação e aos fabricantes de equipamentos usados para participar da imensa e crescente rede de comunicação propiciada pela tecnologia. É o que demonstram as seguintes palavras extraídas do texto de Fernando Pedreira.
"Essa imensa rede cresce sem parar, e é preciso diariamente enchê-la com palavras. Não há dúvida que esse é um dos grandes dramas modernos. A televisão, o rádio, o telefone, o telex, o celular, o smartphone (os dois últimos foram acrescentados por mim ao texto) não podem calar-se, sob pena de se tornarem antieconômicos e improdutivos.
(...) espicaçados pela concorrência, os atuais meios de comunicação obrigam as pessoas a falarem, mesmo quando obviamente não têm nenhuma vontade e, a rigor, nem sequer sabem o que dizer."
Tenho algumas dúvidas quanto a não terem nenhuma vontade, mas nenhuma quanto à sequer saberem o que dizer.
"Um político, um administrador público, uma alta autoridade militar ou civil, assim como os locutores de televisão e de rádio, são em geral pessoas (perdoem-me os locutores) mais cheias de palavras que de idéias.
E o que dizer de jogadores de futebol, de “astros” e de “estrelas” dos mais variados esportes e artes, e da enxurrada de “celebridades” fabricadas que se alastra pelo planeta?
"O importante é produzir palavras, é satisfazer o apetite do pequeno aparelho e encher o tempo e o espaço, antes que algum outro aventureiro o faça. Políticos, administradores, generais, médicos, até mesmo simples populares, ou falam ou perdem a vez.
Ou falam ou perdem a vez de falar. E para não perdê-la falam demais. Uns para engabelar incautos, outros porque são os próprios incautos em ação, ou melhor, em falação.
"(...) as pessoas que falam são enormemente estimuladas e favorecidas, desde que não pensem (...)
Dizia o inglês John Ruskin que, para cada cem ou duzentas pessoas que falam, apenas uma pensa. E que, para cada mil pessoas que pensam, apenas uma sabe realmente ver o que tem diante dos olhos.
Ou seja, é extremamente reduzida a quantidade de pessoas em condições de falar algo que preste. O pior é que os que mais falam são justamente os que menos têm o que dizer. Se as palavras apresentadas a seguir foram corretamente atribuídas, Platão já sabia disso. “O sábio fala porque tem alguma coisa a dizer; o tolo, porque tem que dizer alguma coisa”. O que a tecnologia da comunicação (sic) fez foi potencializar a tolice.
"Estranho mundo o nosso, pilotado por animais falantes que nem sempre sabem o que dizem (...). Estranho mundo onde um tempo de excesso de palavras nem por isso é, necessariamente, tempo de diálogo.
E nem poderia ser, pois diálogo envolve falar e ouvir, e nesta sociedade a imensa maioria deseja apenas falar e só uma pequena minoria se dispõe a ouvir.
"(...) talvez a raiz dos males do nosso tempo resida exatamente no fato de que os homens, hoje, falam demais."
No meu entender, pode-se eliminar o talvez e afirmar com convicção: “A raiz dos males do nosso tempo reside exatamente no fato de que os homens, hoje, falam de mais”. E vivem em desconformidade com o seguinte lembrete: “Você tem duas orelhas e uma boca. Lembre-se de usá-las mais ou menos nesta proporção”. Infelizmente, apenas uma minoria sabe usá-las em tal proporção. Fala-se demais e ouve-se de menos. Eis a raiz dos males do nosso tempo. E para cortá-los pela raiz a solução é aprender a ouvir; a ouvir para aprender.

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